Morrem quase tantas pessoas com cancro do pulmão, traqueia e brônquios como de ataque cardíaco
As doenças do aparelho circulatório ainda são a primeira causa de morte. Mas estão a perder peso, ao contrário do que se passa com o cancro.
O aumento das mortes provocadas por tumores malignos do pulmão, traqueia e brônquios fez com que, em Portugal, em 2017, morressem quase tantas pessoas devido a estas neoplasias (4240) como por enfarte agudo do miocárdio, vulgo ataque cardíaco (4542). A incidência e mortalidade destes tipos de cancros não podem ser dissociadas dos padrões de consumo de tabaco das últimas duas décadas.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O aumento das mortes provocadas por tumores malignos do pulmão, traqueia e brônquios fez com que, em Portugal, em 2017, morressem quase tantas pessoas devido a estas neoplasias (4240) como por enfarte agudo do miocárdio, vulgo ataque cardíaco (4542). A incidência e mortalidade destes tipos de cancros não podem ser dissociadas dos padrões de consumo de tabaco das últimas duas décadas.
O documento Causas de Morte 2017, divulgado nesta sexta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), mostra que a mortalidade por tumores malignos continuou a aumentar nos dez últimos anos, ao contrário da primeira causa básica de morte, as doenças do aparelho circulatório, que têm vindo a perder peso.
Globalmente os tumores malignos, a segunda causa de morte, foram responsáveis por uma em cada quatro mortes no país em 2017, num total de 27.503. A preocupação, no conjunto destas neoplasias, vira-se para os cancros do pulmão, traqueia e brônquios que representaram 3,8% do total do total de óbitos por todas as causas, com valores significativamente crescentes a partir dos 45 anos.
Em termos absolutos, estamos a falar da morte de 4240 pessoas (mais 3,8% do que em 2016), três vezes mais homens do que mulheres. “Há um hiato de 15 a 20 anos entre o consumo de tabaco e a mortalidade por cancro do pulmão”, diz António Araújo, director do serviço de oncologia do Centro Hospitalar do Porto e presidente da Pulmonale – Associação Portuguesa de Luta Contra o Cancro do Pulmão. Não quer dizer que todos os doentes tenham tido hábitos de consumo, mas “não há dúvida de que esta é a principal causa de cancro no pulmão”, traqueia e brônquios.
Nas últimas duas décadas não se têm registado alterações relevantes na prevalência global do consumo de tabaco pois, embora esteja a diminuir nos homens, entre as mulheres tem feito um caminho inverso desde 1987, como constatou um estudo do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, divulgado em Abril.
É, por isso, também expectável que a mortalidade entre as mulheres aumente, ressalva o médico oncologista. Foi o que aconteceu em termos absolutos: das 4085 pessoas que morreram em 2016 devido a tumores malignos do pulmão, traqueia e brônquios, 945 eram mulheres; em 2017, eram 1004 das 4240 vítimas mortais. Em termos percentuais, as mulheres representavam em 2017, tal como em 2016, cerca de 23% das vítimas deste tipo de tumores.
A mortalidade por tumores malignos do sistema respiratório tende a ser prematura em relação aos cancros malignos do cólon, recto e ânus, também destacados pelo INE, que representam 3,5% do total de mortes. Em 2017, ocorreram em média cinco anos mais cedo (aos 70,4 anos) do que os óbitos provocados por tumores colo-rectais (aos 75,4 anos).
Os médicos preocupam-se agora com as novas formas de consumo de nicotina, como os cigarros electrónicos e tabaco aquecido, repara António Araújo. “Tal como a indústria tabaqueira colocou actores e médicos a falar dos benefícios dos cigarros nos anos 30, tenta agora arranjar novas formas de consumo que apelida de ‘mais seguras’. Mas não sabemos que impactos irão ter na saúde daqui a 10 ou 20 anos.”
Mortalidade por AVC caiu em cinco anos
Ao contrário do cancro, as doenças do aparelho circulatório têm perdido terreno na mortalidade total do país (-1,3% do que em 2016). Continuam, no entanto, a ser a principal causa de morte, responsável por 32.366 óbitos (29,4% do total) há dois anos. Os AVC foram responsáveis por 11.270 destas mortes (10,2% dos óbitos no país). E a doença isquémica do coração por outras 7314 (6,6%). São ligeiras melhorias face ao 2016.
A mortalidade por AVC foi, entre as doenças do aparelho circulatório, a que mais diminuiu em cinco anos. Em 2012, morriam cerca 128 pessoas por cada 100 mil habitantes, uma taxa bruta de mortalidade que desceu para 108 pessoas por 100 mil em 2017. As vítimas são principalmente mulheres, numa relação de 77,2 óbitos masculinos por cada 100 femininos. Contudo, elas tendem a morrer relativamente mais tarde devido a esta doença, aos 83,8 anos, em média. Eles, aos 80 anos.
A mortalidade cresce, naturalmente, com a idade: quatro em cada cinco pessoas que morreram de AVC tinham 75 ou mais anos. A doença tirou-lhes cerca de 10 potenciais anos de vida, demonstra o INE.
Já a isquemia do coração é, entre as doenças do aparelho circulatório, aquela que apresenta taxas brutas de mortalidade mais elevadas entre as pessoas com menos de 65 anos. Atinge principalmente os homens, com uma relação de 135,1 óbitos masculinos por cada 100 femininos, e por volta dos 73 anos, oito anos mais cedo do que acontece nas mulheres.
Por enfarte agudo do miocárdio morreram 4542 pessoas em 2017, mais do que no ano anterior. Mais de 60% tinha mais de 75 anos.
Os dados mais recentes mostram ainda que as doenças do aparelho respiratório se mantiveram como a terceira causa de morte, responsáveis por 11,6% da mortalidade total no país em 2017 (quase menos 5% que em 2016). Nesse ano morreram em Portugal 110.187 pessoas.