Num ghetto de toda a gente
Jenkins filma como em Moonlight: há um contraste enorme entre a violência subjacente à narrativa e o tom adocicado, duma contemplatividade muito artificial e muito sentimentalista, da sua narração.
Se Esta Rua Falasse é o filme com que Barry Jenkins dá sequência a Moonlight. Adaptado de um romance de James Baldwin, o seu propósito é anunciado numa legenda inicial, a partir (presumivelmente) das palavras de Baldwin, onde a Beale Street do título original, uma rua de Nova Orleães, se converte simbolicamente em todas as ruas de todos os ghettos habitados por afro-americanos de todas as grandes cidades americanas. Uma “marca” para quem ali nasce, portanto, e o filme até dispensava essa explícita apresentação da moral política da história, porque a narrativa é suficientemente forte para a sugerir: Nova Iorque, anos 70, uma mulher que se obstina em provar que o marido, preso por acusação de violação, está a ser vítima de erro judicial propiciado pelo preconceito racial.
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Se Esta Rua Falasse é o filme com que Barry Jenkins dá sequência a Moonlight. Adaptado de um romance de James Baldwin, o seu propósito é anunciado numa legenda inicial, a partir (presumivelmente) das palavras de Baldwin, onde a Beale Street do título original, uma rua de Nova Orleães, se converte simbolicamente em todas as ruas de todos os ghettos habitados por afro-americanos de todas as grandes cidades americanas. Uma “marca” para quem ali nasce, portanto, e o filme até dispensava essa explícita apresentação da moral política da história, porque a narrativa é suficientemente forte para a sugerir: Nova Iorque, anos 70, uma mulher que se obstina em provar que o marido, preso por acusação de violação, está a ser vítima de erro judicial propiciado pelo preconceito racial.
Jenkins filma como em Moonlight: há um contraste enorme entre a violência subjacente à narrativa e o tom adocicado, duma contemplatividade muito artificial e muito sentimentalista, da sua narração.
Essa espécie de moleza, que parece de facto uma vontade de servir a “papa” ao espectador, conduz a um convencionalismo que é, no seu núcleo, tremendamente académico (ver a maneira de filmar os diálogos, os campos-contracampos, as cenas de conjunto: é como se tudo viesse dum formulário), e não é por acaso que o filme se mostra mais vive em certos fragmentos que se depositam mais expressamente nas palavras de Baldwin (há nelas uma violência e uma tensão que o filme não é, de todo, capaz de incorporar, de que tem que se servir como se “em citação”).
E depois, como em Moonlight, o trabalho fotográfico, com aqueles jogos cromáticos (os guardas-chuvas vermelhos recortados contra a noite, por exemplo) que são efeitozinhos visuais não desprovidos de algum carisma “poético” mas também são onde se esgota a energia, ou mesmo a própria ideia, da mise en scène de Jenkins. E portanto, finalmente, é mesmo como em Moonlight: a relevância que se dá ao objecto tem muito mais a ver com os temas que convoca do que com a maneira como o filme lida com eles.