Enfermeiros: presidente do Sindepor em greve de fome "até cair morto, se for necessário"
A decisão de entrar em greve de fome foi tomada depois de um parecer do conselho consultivo da PGR ter considerado o protesto dos enfermeiros “ilícito” e de o ministério ter determinado que as administrações dos hospitais devem começar a marcar faltas injustificadas aos grevistas.
Passavam cerca de 30 minutos das 12h quando o presidente do Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindepor), Carlos Ramalho, chegou ao Jardim Afonso de Albuquerque, frente ao Palácio de Belém, nesta quarta-feira, para dar início a uma greve de fome.
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Passavam cerca de 30 minutos das 12h quando o presidente do Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (Sindepor), Carlos Ramalho, chegou ao Jardim Afonso de Albuquerque, frente ao Palácio de Belém, nesta quarta-feira, para dar início a uma greve de fome.
Garante o sindicalista que por lá ficará “até cair morto, se for necessário”. “Vai ser o Governo que tem que decidir se quer ver os enfermeiros e, neste caso, eu que os represento, a morrer de fome ou se quer negociar”, explica o líder do Sindepor que anunciou este protesto numa conferência de imprensa, na terça-feira.
Em causa estão as negociações entre o Governo e os enfermeiros, que reivindicam uma revisão da grelha salarial com a carreira a começar nos 1600 euros (actualmente ronda os 1200 euros), a antecipação da idade da reforma para os 57 anos de idade e 35 anos de serviço e a contagem de pontos para a progressão na carreira. “Num Estado de direito deve haver negociações entre os sindicatos, que são os representantes legítimos dos trabalhadores, e a tutela”, diz o sindicalista aos jornalistas.
O próprio local, frente ao Palácio de Belém, não foi escolhido ao acaso. “O sítio para nós é fundamental, sendo aqui a residência oficial do senhor Presidente da República, alguém que nós consideramos e respeitamos muito, o mais alto magistrado da nação”, afirma Carlos Ramalho, que espera que Marcelo Rebelo de Sousa, uma “pessoa justa”, “possa, de alguma forma, ajudar os enfermeiros e obrigar o Governo a negociar”.
O presidente do Sindepor acusa ainda o Governo de tentar travar a luta dos enfermeiros “de formas ilegítimas” e de manipular a opinião pública com “muitas mentiras e falsidades” sobre a "greve cirúrgica" dos enfermeiros, sublinhando que o Estado “nunca esteve disponível para negociar” e apenas avançou com promessas que depois não cumpriu.
“A grande verdade da mentira”
“Não adianta nada o Governo dizer que assume que a profissão de enfermagem vai ter uma carreira com três categorias quando, de facto, nenhuma delas tem uma valorização, nem em termos salariais nem em termos de conteúdo funcional. Esta é a grande verdade da mentira”, nota o líder do Sindepor. “Aquilo que aconteceu até aqui (…) foi uma tentativa de impor uma mão cheia de nada aos enfermeiros, que não se vão contentar com isso porque esperaram demasiados anos para serem reconhecidos”, garante.
“Os enfermeiros, neste momento, estão todos no mesmo patamar, é indiferente terem um ou 15 ou 30 anos de serviço”, sublinha Carlos Ramalho, apelando a uma valorização e “dignificação” da classe profissional.
Apesar de admitir que a greve de fome é “uma situação radical”, afirma que esta foi uma decisão individual e que o objectivo é dar o exemplo a todos os enfermeiros.
“Quando assumimos este sindicato, nós anunciámos aos enfermeiros que íamos mudar. O nosso lema é ‘mudar é preciso’ e nós sempre dissemos que íamos ter uma postura diferente e que iríamos defender os interesses da classe profissional até às últimas consequências”, assegura.
Esta é ainda uma forma de reagir a um ataque sem precedentes “que tem sido feito na comunicação social e noutros órgãos pelo Governo contra uma profissão digna que só pretende justiça e negociações”, diz Carlos Ramalho.
“Nós estamos a ser atacados, injuriados, ameaçados, coagidos para trabalhar e para prescindir de um direito fundamental como é o direito à greve. E eu acho que isso é inaceitável. Hoje são os enfermeiros, amanhã serão outros. Estão em causa direitos fundamentais que são os princípios da nossa democracia e que estão [consagrados] na nossa Constituição”, conclui.
Aos associados, o Sindepor distribuiu uma minuta para que os enfermeiros possam apresentar-se ao trabalho, alegando um sentimento de coacção por parte do Governo. Quanto a isto, o presidente do sindicato garante que “os enfermeiros são cidadãos cumpridores, muito respeitadores das leis e regras democráticas” e que esta foi uma forma de protesto. “Os enfermeiros são o suporte do Serviço Nacional de Saúde e isso significa que vão respeitar aquilo que forem as ordens superiores, por muito injustas que sejam”, acrescenta.
Carlos Ramalho garante que, ao contrário do que se possa pensar, “os enfermeiros não querem tudo", mas "querem alguma coisa”. E explica que aquilo que a classe profissional pretende é manter o diálogo. Caso o Governo retome as negociações, o presidente do sindicato irá suspender a greve de fome.
Agora, cabe aos enfermeiros “decidir de que lado querem estar”, com o líder do Sindepor a esperar “solidariedade” por parte da classe profissional.
Solidariedade com o presidente do Sindepor
Ao início da tarde desta quarta-feira, a bastonária dos enfermeiros dirigiu-se ao local para manifestar solidariedade para com o presidente do Sindepor e alertou para o risco de radicalização da luta dos enfermeiros. “Para nós aqui não está o presidente do sindicato, está o enfermeiro Carlos Ramalho, membro da ordem e, portanto, merece a nossa solidariedade”, afirmou Ana Rita Cavaco citada pela agência Lusa.
A bastonária avançou ainda que um outro enfermeiro do Norte se vai juntar a esta greve de fome. “Tememos que outras coisas se sigam e não faz sentido nenhum este braço-de-ferro e estamos disponíveis para ajudar a mediar o conflito”, declarou a bastonária, acrescentando que as reivindicações dos enfermeiros são justas e que o Governo tem a obrigação de negociar.
A decisão de entrar em greve de fome foi tomada depois do parecer do conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR) ter considerado a greve “ilícita”, ao final da noite de segunda-feira, e depois de o Ministério da Saúde ter determinado que as administrações dos hospitais devem começar a marcar faltas injustificadas aos enfermeiros em greve, a partir desta quarta-feira.
A segunda greve cirúrgica dos enfermeiros, em curso desde 31 de Janeiro, já afectou dez centros hospitalares. Foi convocada pelo Sindepor e pela Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros (ASPE), porém, a presidente da ASPE, Lúcia Leite, já tinha anunciado uma “suspensão imediata” do protesto nesta terça-feira.