Cinco anos de ocupação
A Crimeia costumava ser uma pacífica região solarenga. Ninguém imaginara que, um dia, aquele resort costeiro se encontrasse sob ocupação, tornando-se numa base militar atrás de arame farpado. Mas tal aconteceu.
Há uns anos atrás, respondendo à sua própria pergunta “Onde terminam as fronteiras da Rússia?”, Putin disse, em tom jocoso, que “As fronteiras da Rússia não terminam em ponto nenhum”. É claro que os impérios não gostam nada de ter as suas fronteiras delimitadas, e sempre as desejam expandir.
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Há uns anos atrás, respondendo à sua própria pergunta “Onde terminam as fronteiras da Rússia?”, Putin disse, em tom jocoso, que “As fronteiras da Rússia não terminam em ponto nenhum”. É claro que os impérios não gostam nada de ter as suas fronteiras delimitadas, e sempre as desejam expandir.
Recorrendo à violação flagrante dos princípios e normas do Direito Internacional, a Rússia decidiu expandir o seu território por conta do território ucraniano.
Ora bem. A Crimeia, península ucraniana, tem uma história rica e cativante e é o lar de muitas minorias e de populações indígenas, como os tártaros da Crimeia. Como é sabido, a história da península pode ser traçada ao longo de 3000 anos, enquanto a sua associação ao império russo e soviético remonta a apenas dois séculos e meio, durante os quais os tártaros da Crimeia sofreram vários genocídios e, em 1944, muitos foram deportados para regiões a milhares de quilómetros para leste, só podendo voltar a casa quando a Ucrânia conquistou a sua independência.
É, portanto, um facto objectivo e documentado que os russos não são uma população originária da Crimeia, mas, em 2014, inventaram e lançaram o mito da “Crimeia sempre foi russa”, um mito político que engloba um sistema de falsos conceitos históricos destinados a validar o direito exclusivo da Rússia para se apoderar da Crimeia, com o objetivo de justificar a ocupação russa aos olhos do mundo. A Crimeia costumava ser uma pacífica região solarenga. Ninguém imaginara que, um dia, aquele resort costeiro se encontrasse sob ocupação, tornando-se numa base militar atrás de arame farpado. Mas tal aconteceu.
O mês de fevereiro de 2014 tornou-se um ponto de viragem para a história europeia moderna: a Rússia levou a cabo uma intervenção militar no território soberano da Ucrânia e ocupou parte dele. Soldados russos de uniforme sem insígnia bloquearam unidades militares ucranianas nas suas próprias bases. Ao mesmo tempo, os oficiais russos falsificaram os resultados do referendo na Crimeia, alegando que os residentes tinham concordado em juntar-se à Rússia. Hoje, todos sabemos que o chamado referendo foi conduzido sob a mira das armas russas. O próprio Presidente russo assumiu publicamente este facto. Foi assim que a Rússia iniciou uma guerra híbrida não declarada, usando táticas militares e de informação não convencionais, com o objectivo de mudar as fronteiras legais da Ucrânia.
A comunidade internacional não podia aceitar tal audácia russa, condenando, portanto, a ocupação ilegal da Crimeia numa série de deliberações de organizações internacionais, incluindo a ONU, o Conselho da Europa e a OSCE. Contudo, tal não preveniu a Rússia de ir ainda mais longe.
Depois da ocupação e da tentativa de anexação da península da Crimeia e da invasão subsequente em Donbas, em 2014, a Rússia abriu uma nova frente, agora no mar, destinada à ocupação do Mar de Azov e do Estreito de Kerch, efetuando a militarização acelerada da região, o que já teve consequências no equilíbrio da segurança da mesma.
A situação dos direitos humanos na Crimeia, após a ocupação russa, tem-se degradado. A atmosfera de medo, intimidação, pressão física e psicológica forçou cerca de 35-40 mil cidadãos ucranianos (incluindo cerca de 25 mil tártaros da Crimeia) a deixar a Crimeia ocupada e a instalar-se noutras regiões da Ucrânia. As autoridades russas usam tais métodos para eliminar qualquer dissidência ou oposição pública à ocupação da Crimeia.
O Kremlin continua a manter nas suas prisões os reféns ucranianos. Entre eles, nomeadamente, estão agora os 24 marinheiros ucranianos que foram feitos prisioneiros de guerra, o laureado do Prémio Sakharov, Oleg Sentsov, bem como tártaros da Crimeia, que neste momento estão a passar por um segundo genocídio e uma segunda deportação.
A guerra russa contra a Ucrânia já quase entrou no seu sexto ano. Porém, apesar de todos os acontecimentos dos últimos cinco anos, em particular os acima descritos, continua a haver pessoas pelo mundo, jornalistas, políticos, etc., a acreditar nos mitos russos, apoiando as ações do Kremlin e negando a verdadeira natureza dos referidos acontecimentos. E é por isso que a luta ucraniana contra os mitos políticos russos é uma condição essencial para a própria existência do nosso país. Se nós não chamarmos as coisas pelos seus nomes, o Kremlin irá ainda mais longe, e isto preocupará não apenas a Ucrânia. Se a Ucrânia não resistir, isto apenas irá fomentar os apetites imperiais russos por outras partes do mundo, incluindo a Europa.
A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico