Ordem dos Advogados critica MP no caso da inspectora Ana Saltão
Advogado de ex-marido da suspeita da morte de idosa afirmou que Judiciária só descobriu assassino depois de ter incriminado Ana Saltão, e isso pode custar-lhe um processo-crime.
O Conselho Regional de Coimbra da Ordem dos Advogados criticou esta sexta-feira o Ministério Público por avançar com uma certidão das alegações finais do advogado do ex-marido da inspectora da Polícia Judiciária Ana Saltão, para um eventual processo criminal contra este.
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O Conselho Regional de Coimbra da Ordem dos Advogados criticou esta sexta-feira o Ministério Público por avançar com uma certidão das alegações finais do advogado do ex-marido da inspectora da Polícia Judiciária Ana Saltão, para um eventual processo criminal contra este.
O ex-marido da inspectora da Polícia Judiciária (PJ) Ana Saltão foi absolvido na quarta-feira, pelo Tribunal de Coimbra, de falsidade de testemunho, crime de que era acusado no âmbito do processo de investigação contra a sua ex-mulher, que era suspeita de ter morto a sua avó em 2012. Durante a leitura de sentença do caso, na quarta-feira, o Ministério Público pediu a certidão das alegações finais do advogado do ex-marido de Ana Saltão, Rui Silva Leal, para serem enviadas para a PJ e para o Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP), para possível abertura de inquérito criminal contra o defensor.
Em causa estão declarações proferidas por Rui Silva Leal durante as alegações finais do julgamento, mais concretamente o momento em que afirmou que a brigada da PJ que investigava o caso tinha descoberto tardiamente quem tinha assassinado a avó do seu cliente - já depois de ter Ana Saltão ter sido incriminada. Esta sexta-feira, o Conselho Regional da Ordem dos Advogados afirmou que a actuação da procuradora do Ministério Público causou "perplexa surpresa".
"Estranha-se a forma eleita para a manifestação da intenção - exactamente em manifestação verbal no decurso da sessão de leitura da sentença, quando idêntico fim poderia ter sido alcançado através de um discreto, mas eficiente, requerimento escrito. Todavia, mais do que o inusitado meio, perturba a substância e a ideologia imanentes à intenção que perpassa da sobredita tomada de posição do Ministério Público", critica o Conselho Regional de Coimbra.
O advogado, "no respectivo exercício funcional, tem de ser sujeito de uma ampla liberdade de expressão e de crítica para o cabal desempenho da nobre missão que lhe cabe. E um tribunal tem de ser um lugar democrático, onde inexistam hipócritas reverências e forçados eufemismos", protesta o Conselho Regional de Coimbra da Ordem dos Advogados, presidido por Jacob Simões. O presidente deste órgão sublinha que a iniciativa do Ministério Público, que pode levar a que Rui Silva Leal seja constituído arguido por declarações que prestou nas alegações finais, "é uma atitude que, do ponto de vista institucional, merece ser censurada". Já Rui Silva Leal considerou estar perante uma "atitude persecutória nunca vista do Ministério Público".
"Não conseguiu levar a sua avante no processo da inspectora Ana Saltão [que foi absolvida] e está a ver que neste processo as coisas não estão a correr de feição. É uma atitude lamentável", comentou. Rui Silva Leal vincou que "a advocacia não pode ser amordaçada", assegurando que nunca se calará e que nunca deixará de expressar as suas convicções.
"Não tenho e nunca terei medo", sublinhou, frisando ainda que ficou provado, no processo principal em que era acusada Ana Saltão, que os inspectores "sonegaram e manipularam provas".
A inspectora da PJ tinha sido acusada de ter disparado mais de dez vezes contra a avó do ex-marido. No início deste ano, o Tribunal da Relação de Coimbra confirmou a absolvição da primeira instância e deu por terminado um processo que durou mais de seis anos.