Santana Lopes quer “uma nova atitude em Bruxelas”
Líder fundador da Aliança lembrou os pais da democracia para defender a política de "causas" e pediu exigência perante a Comissão Europeia
Pedro Santana Lopes, o líder fundador da Aliança, sustentou que é preciso Portugal ter “uma nova atitude em Bruxelas” que defenda os interesses portugueses face à Comissão Europeia ao falar, esta noite, no congresso do partido, em Évora.
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Pedro Santana Lopes, o líder fundador da Aliança, sustentou que é preciso Portugal ter “uma nova atitude em Bruxelas” que defenda os interesses portugueses face à Comissão Europeia ao falar, esta noite, no congresso do partido, em Évora.
Assumiu-se como “europeísta” até porque não há “alternativa” para o país, Santana considerou que “pior que o Brexit é manter estas distâncias, estas assimetrias, no PIB per capita” dos Estados-membros da União Europeia. Já mais à frente chegou mesmo a afirmar: "Portugal tem que dizer em Bruxelas 'estamos fartos de perder em relação ao nível de vida dos cidadãos'." E lembrando que foi demitido de primeiro-ministro em 2004 pelo então Presidente da República, Jorge Sampaio, Santana Lopes atirou:"Se o então Presidente da República, em 2004, não tivesse feito o que fez, nós estaríamos muito melhor do que estamos."
Defendendo o crescimento, Santana Lopes desafiou o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a usar a sua “popularidade” para lutar “por estas causas”, garantindo que “o crescimento económico é fundamental" porque “sem recursos não temos como financiar o nosso modelo social”.
Fazendo uma veemente defesa da necessidade de recuperar o Serviço Nacional de Saúde, o líder da Aliança lembrou os números do défice de 2018 para dizer: “Gostava muito que o saldo ficasse em 0,6% mas considero um crime de lesa-pátria o que se tem passado com o Serviço Nacional de Saúde”. O ex-primeiro-ministro insistiu ainda na necessidade de investir nas funções de soberania do Estado.
No início do seu discurso, o primeiro que faz em congressos da Aliança, fez questão de eleger quatro pais da democracia portuguesa, Sá Carneiro, Mário Soares, Lucas Pires e Álvaro Cunhal, para defender a política de “causas” e por convicção.
No recinto do Arena de Évora, decorado de forma simples, em tom de azul e apenas com um ecrã gigante no centro do palco, os congressistas bateram palmas quando ouviram Santana Lopes citar Sá Carneiro, fundador do PSD, quando disse que “o poder só vale a pena se for causa de um projecto”. Lembrando que “por coincidência” o último comício do antigo-primeiro-ministro antes de morrer aconteceu em Évora recordou “Francisco Lucas Pires, Mário Soares, Sá Carneiro, Álvaro Cunhal”, que partiram depois de lutar pelos ideais em que acreditaram”. “É aí que a política é nobre”, sustentou para depois dizer que a Aliança nasce “pelas causas, pelas ideias”.
“E o dr. Constâncio?”
Na sua intervenção, Santana Lopes referiu-se à intenção da coordenadora do BE, Catarina Martins, de questionar a idoneidade do Governador do Banco de Portugal, Carlos Costa. E lembrou que o anterior Governador do Banco de Portugal, o socialista Vítor Constâncio, foi poupado, apesar dos escândalos na banca. “Às vezes penso que a minha televisão avariou. E o dr. Constâncio, que foi supervisor do Banco de Portugal, não deu por nada, não tem de se tratar da idoneidade? Que país é este?”, questionou, lançando mais uma interrogação: “Tantos bancos que naquele período dos senhores a quem o doutor Sampaio abriu a porta, tantos bancos começaram a ir por aí abaixo e não deram por nada no Banco de Portugal?”.
Outra das questões de actualidade, a greve cirúrgica dos enfermeiros, motivou mais uma crítica ao Governo do PS. Santana Lopes assumiu ficar “chocado” ao ver que o primeiro-ministro fala com "o senhor da Fenprof" que lidera “greves de exames”, que pode “parar o país” como se fosse “uma figura nacional” e relativamente à Bastonária da Ordem dos Enfermeiros “só porque não é da cor política dele” leva-a a tribunal.
O líder da Aliança aproveitou para justificar a posição prudente assumida na sua moção estratégica nacional sobre as presidenciais, lembrando que Marcelo Rebelo de Sousa ainda não disse se é candidato. “Quando o Presidente da República tem sido atacado, nós estamos ao lado dele”, disse, referindo que Marcelo “foi alvo de críticas muito injustas” por parte de um dirigente sindical das forças de segurança.
Reiterando que a Aliança quer ser “exigente” com o Presidente da República, Santana Lopes disse que sempre defendeu a “solidariedade com o Governo” mas que “não é preciso exagerar”. E assinalou que Marcelo Rebelo de Sousa "saltou como saltou" ao lado do Governo na greve dos enfermeiros.
Não foi apenas a “frente de esquerda” o alvo do líder da Aliança. O seu antigo adversário no PSD, Rui Rio, foi criticado pela estratégia de aproximação ao PS. Sem nunca o nomear directamente, Santana Lopes questionou se “haverá alguém deste lado de cá”, que admita dar “a possibilidade ao primeiro-ministro de continuar a governar mudando de parceiros no Parlamento”. Lembrou ainda que disputou eleições com Rui Rio no PSD, que “disse que era este o caminho” e que, naquela altura, Santana Lopes considerou que “não era adequado”.
Parte da sua intervenção de cerca de uma hora foi dedicada à conduta pública, sem esquecer os recentes casos de falsas presenças no Parlamento. “Não há pior do que alguém do que recebe mandato dos cidadãos aceitar a estrada da corrupção”, afirmou. “Não há maior vergonha”, atirou, numa frase que voltaria a repetir para se referir as falsas presenças de deputados: “Não se pode estar no Parlamento e estar a trocar cartões uns com os outros”.
Só a Presidência
Hoje, no encerramento não haverá representantes dos partidos. A Aliança não dirigiu convites, uma vez que se trata de um congresso fundador. Convidada foi, porém, a Presidência da República que se fará representar por Rita Magalhães Colaço, secretária do Conselho de Estado, e por Nuno Sampaio, assessor político de Marcelo Rebelo de Sousa.
Durante a tarde ouviram-se as intervenções dos delegados, com alguns deles a assumir que é a primeira vez que estão na vida política, apesar de viverem com Sá Carneiro “no coração”. Outros desejaram que a Aliança venha fazer “diferente” na política. Santana Lopes, que esteve sentado na primeira mesa do palco durante toda a tarde, foi ouvindo os companheiros de partido e em alguns momentos bateu palmas.
Santana Lopes chegou ao Arena já perto das 11h da manhã, depois de dar uma entrevista a um órgão de comunicação social. Chegou sem conseguir esconder a emoção, “bem-disposto” e sem nostalgia do PSD onde militou durante 40 anos. “É um momento especial mas sem pieguices”. Preferiu falar do “lado bonito da política” – “sermos capazes de lutar por aquilo em que acreditamos” – do que do lado “feio” – “a corrupção a falta de respeito pelos mandatos o esquecimento das promessas”. Entrou no recinto ao som das palmas dos delegados – dos “aliados” como muitos chamaram a si mesmos – para pouco depois ouvir de uma das suas mais próximas, Rosário Águas, elogios à “coragem” de ter fundado um partido novo. “Este partido nasceu da iniciativa destemida e da ousadia de um homem, da vontade de muitos portugueses que não se conformam, com as desigualdades, com o crescimento anémico de décadas”, disse a ex-secretária de Estado da Administração Pública no Governo liderado por Santana Lopes. Outra figura que veio do PSD, o ex-ministro Martins da Cruz colocou a fasquia alta: “A Aliança não pode falhar. Portugal está a olhar para nós”. O congresso poupou o PSD de Rui Rio. Mas durante a tarde, ainda antes da intervenção da noite do líder da Aliança, ouviu-se Carlos Pinto, ex-autarca do PSD na Covilhã dizer: “Se não for a Aliança, não são os partidos à direita do Partido Socialista que vão mudar as coisas”.
No palco, um dos painéis tinha inscrito o slogan “Das Pessoas, para as Pessoas”. E foi pelas pessoas, pelos delegados que o congresso arrancou. Um microfone andou de mão em mão na plateia para que cada um se apresentasse: “Bom dia, sou a Dina Vieira, de Torres Novas a viver em Lisboa”. Assim nasceu o 23º partido.