Quatro anos a crescer mais que a zona euro, mas menos que a Espanha

Pela primeira vez desde o século passado, Portugal pode registar quatro anos consecutivos de crescimento acima da média da zona euro. Mas consegue isto superando apenas as economias mais ricas e de maior dimensão.

Foto
Enric Vives-Rubio

Se as previsões publicadas esta quinta-feira pela Comissão Europeia se confirmarem, Portugal irá concluir em 2020 quatro anos consecutivos de crescimento acima da média da zona euro, algo que já não acontece desde o final dos anos 1990, quando uma economia portuguesa a endividar-se cada vez mais face ao exterior crescia a um ritmo muito forte a caminho da adopção da moeda única.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Se as previsões publicadas esta quinta-feira pela Comissão Europeia se confirmarem, Portugal irá concluir em 2020 quatro anos consecutivos de crescimento acima da média da zona euro, algo que já não acontece desde o final dos anos 1990, quando uma economia portuguesa a endividar-se cada vez mais face ao exterior crescia a um ritmo muito forte a caminho da adopção da moeda única.

Esta é a boa notícia para Portugal presente nas Previsões de Inverno do executivo europeu. As más são que as expectativas de crescimento para a economia portuguesa foram novamente revistas em baixa, o país não deverá conseguir evitar um novo abrandamento este ano e, apesar de crescer acima da média, Portugal apenas consegue registar variações do PIB superiores às de economias bastante mais ricas que a sua, continuando a perder terreno para aquelas com um PIB per capita mais semelhante.

Num cenário em que são mais do que evidentes os sinais de abrandamento da economia europeia, a Comissão não só reviu o crescimento de Portugal em 2018 de 2,2% para 2,1%, como passou a prever um crescimento de 1,7% este ano, em vez dos 1,8% esperados há três meses. Esta revisão ligeira colocou a projecção de Bruxelas ainda mais longe dos 2,2% que foram definidos como meta pelo Governo quando apresentou em Outubro a sua proposta de Orçamento do Estado para 2019, sendo que vários membros do Executivo já deram indicações de que está a ser preparada uma revisão em baixa das projecções no Programa de Estabilidade que o executivo irá apresentar em Abril.

Aumentar

A explicação dada pela Comissão Europeia para estas revisões é simples: uma “procura externa menos dinâmica”. O resto do Mundo e em particular o resto da Europa estão a abrandar e, por isso, Portugal não vai poder contar com o impulso das exportações com que estava a contar.

Ainda assim, Portugal está longe de ser dos países em que as expectativas de crescimento mais se afundaram. Para o total da zona euro, a Comissão Europeia passou a sua previsão de crescimento para este ano de 1,9% para 1,3%. Um corte de 0,6 pontos que se deve sobretudo ao arrefecimento previsto para a Alemanha, com a maior economia da moeda única a crescer 1,1%, quando antes se estimava 1,8%; e para a Itália, que passa de 1,2% para uns modestos 0,2% (o menor crescimento previsto para a zona euro e toda a União Europeia).

E, deste modo, embora crescendo menos do que era previsto, Portugal passou a ter um diferencial positivo face à média da zona euro mais elevado, de 0,4 pontos percentuais, que a Comissão Europeia prevê que se prolongue ainda por 2020, embora apenas em 0,1 pontos percentuais.

As novas previsões de Bruxelas traçam um cenário em que, de 2017 a 2020, a economia portuguesa cresce consecutivamente mais do que a média da zona euro. É necessário recuar até ao período entre 1996 e 1999 para encontrar novamente quatro anos consecutivos de crescimento português acima da média do euro.

O actual crescimento acima da média torna-se ainda mais importante se se levar em conta que no final dos anos 1990 Portugal crescia ao mesmo tempo que registava défice externos próximos dos 10% do PIB ao ano, enquanto agora as contas externas registam um saldo equilibrado, com o nível de endividamento público e privado em fase de moderação.

O entusiasmo em relação ao actual desempenho económico português esmorece quando se verifica, país por país, quais as taxas de crescimento previstas pela Comissão para este ano. Com os seus 1,7%, Portugal só vai crescer em 2019 mais do que cinco países da zona euro, todos eles com economias bem mais ricas que a portuguesa: Alemanha, França, Itália, Bélgica e Áustria.

O crescimento previsto para Portugal fica abaixo de 13 países da zona euros, onde estão incluídos os países com PIB per capita mais semelhantes, como a Grécia, Malta, Chipre, Eslovénia, Eslováquia ou a vizinha Espanha, que deverá crescer 2,1% em 2019. De 2017 a 2020, a Espanha continua a superar sempre Portugal na taxa de crescimento obtida.

Aumentar

Portugal supera a média de forma confortável porque entre os países que crescem menos estão precisamente as economias com um maior peso na zona euro: a Alemanha, França e Itália. São estas três grandes economias que estão a fazer sentir de forma mais clara a inversão do ciclo económico a que se assiste a nível mundial.

Na Alemanha, diz a Comissão Europeia, o arrefecimento do comércio mundial e as menores perspectivas de crescimento a nível global - a China também está a desacelerar - tornam improvável que as exportações de produtos alemães retomem o dinamismo observado no período de 2014 a 2017. Além disso, antecipam-se também constrangimentos ao nível de novos investimentos no país.

Na Itália, o pessimismo da Comissão Europeia é justificado, para além do abrandamento dos parceiros comerciais, pelas incertezas políticas externas e internas, pela menor apetência demonstrada pelas empresas italianas para investir e por, nos mercados, as taxas de juros estarem “significativamente acima” do valor a que estavam há um ano.

É neste cenário em que os gigantes da zona euro entram numa fase de menor dinâmica económica que Portugal deverá ter de viver nos próximos dois anos, com os desafios que isso representa quer ao nível orçamental, quer ao nível da criação de empregos.

Esta quinta-feira, Mário Centeno, na qualidade de presidente do Eurogrupo, procurou, através da sua conta oficial na rede social Twitter, desdramatizar a situação económica europeia. “Parem de retratar a desaceleração como uma crise”, disse, defendendo que são os “riscos políticos que estão a levar ao abrandamento do crescimento”, estando por isso nas mãos dos governos “mudar a maré”.