Governo não ouviu associações sobre proposta de apoio a cuidadores informais

Proposta de lei foi aprovada em Conselho de Ministros, mas medidas só são divulgadas para a semana pelo Ministério da Segurança Social.

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Nuno Ferreira Santos

As associações que representam os cuidadores informais não foram ouvidas pelo Governo para a elaboração da proposta de lei que esta quinta-feira foi aprovada pelo Conselho de Ministros. "Não nos ouviram. Mas vou lançar um desafio ao Governo: ouçam-nos nos próximos dias", apela Sofia Figueiredo, presidente da Associação Nacional dos Cuidadores Informais. Nos últimos quatro meses, adianta, a associação pediu uma audiência ao primeiro-ministro, três ao ministro do Trabalho e Segurança Social e ainda tentou ser ouvida pelos secretários de Estado da Saúde e da Segurança Social, sempre sem sucesso.

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As associações que representam os cuidadores informais não foram ouvidas pelo Governo para a elaboração da proposta de lei que esta quinta-feira foi aprovada pelo Conselho de Ministros. "Não nos ouviram. Mas vou lançar um desafio ao Governo: ouçam-nos nos próximos dias", apela Sofia Figueiredo, presidente da Associação Nacional dos Cuidadores Informais. Nos últimos quatro meses, adianta, a associação pediu uma audiência ao primeiro-ministro, três ao ministro do Trabalho e Segurança Social e ainda tentou ser ouvida pelos secretários de Estado da Saúde e da Segurança Social, sempre sem sucesso.

Responsáveis da associação Alzheimer Portugal e da Acreditar (Associação de Pais e Amigos de Crianças com Cancro) também admitiram à RTP que foram apanhadas de surpresa com o anúncio da proposta do Governo. E Bruno Alves, presidente da Cuidadores Portugal (associação que integra a rede europeia Eurocarers), admitiu igualmente ao PÚBLICO que não foi ouvido pelo Governo para esta proposta em particular, ainda que tenha colaborado para um primeiro levantamento sobre esta matéria, há dois anos, um trabalho que chegou a estar na gaveta durante meses. Mas Bruno Alves está confiante: "Era preciso dar o primeiro passo."

Os cuidadores informais são pessoas que cuidam em casa de familiares, idosos, pessoas com demência ou doenças crónicas, ou crianças com patologias graves. Em Portugal a única estimativa conhecida até à data calcula que sejam mais de 800 mil pessoas, cerca de 200 mil das quais a tempo inteiro. São maioritariamente mulheres entre os 45 e os 70 anos, mas também há filhos que cuidam dos pais.

O primeiro-ministro, António Costa, revelou na quarta-feira que o Governo ia aprovar, em Conselho de Ministros, medidas para apoiar os cuidadores informais. A proposta de lei foi, de facto, aprovada. Mas, quando se pede ao Governo o documento ou se pergunta quais são, afinal, as medidas em concreto, a resposta é a de que estas apenas serão divulgadas na próxima semana pelo Ministério do Trabalho e Segurança Social.

"Com tanto mistério, temos receio de que as medidas aprovadas sejam apenas o projecto-piloto e o descanso do cuidador que ficaram previstos no Orçamento do Estado [OE] de 2019", diz Sofia Figueiredo. A proposta do Governo ainda vai ser submetida à Assembleia da República.

"Medidas vastas"

Coube ao secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Tiago Antunes, desvendar um pouco o véu da proposta esta quinta-feira. Disse que a proposta "está perfeitamente em linha com o que está estipulado sobre esta matéria no Orçamento do Estado para 2019" (projectos-piloto de apoio a cuidadores informais e o descanso do cuidador), mas garantiu que o diploma "não se limita a regular" estes projectos, estando previsto "um conjunto de medidas vastas de apoio a cuidadores informais".

No Parlamento está, há quase um ano, o projecto de lei do Bloco de Esquerda para a criação do Estatuto do Cuidador Informal. O Governo optou por uma proposta própria em vez de um texto conjunto, explicou José Soeiro, do BE. A votação na especialidade está agendada para o próximo dia 21.  No debate quinzenal com o primeiro-ministro, esta quarta-feira, Catarina Martins, coordenadora do BE, lembrou que o que os cuidadores reclamam é um "estatuto".

Só um estatuto, defende, pode dar resposta aos problemas fundamentais destas pessoas, nomeadamente reconhecendo-lhes uma carreira contributiva, incluindo licenças laborais, definição de direitos e deveres.

Entre as principais reivindicações dos cuidadores informais estão a redução do horário de trabalho e a flexibilidade de horários para que possam continuar a trabalhar, ou, quando isso não é possível e as pessoas têm que se despedir para ficar em casa com os familiares, que se aumente o actual subsídio à terceira pessoa ou complemento de dependência, que é de 108 euros, explica Sofia Figueiredo. Imprescindível ainda é a contabilização do tempo dedicado a cuidar para efeitos de carreira contributiva, frisa a presidente da associação, que espera que uma das medidas passe pela criação de um seguro social voluntário, mas que não tenham "que ser os cuidadores a pagar".

A aprovação do estatuto de cuidador informal tem sido também defendida pelo Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa, que assegurou que ia fazer "muita pressão" neste sentido.