Ataques "sem precedentes do Governo italiano" levam Paris a chamar embaixador em Roma
Depois de meses de troca de acusações, encontro de Di Maio com coletes amarelos fez Governo francês perder a paciência.
O Governo francês convocou o seu embaixador em Roma para consultas, numa decisão tomada na sequência dos "ataques sem precedentes do Governo italiano", explicou o Ministério dos Negócios Estrangeiros francês. Governo italiano tenta apaziguar ânimos mas volta a deixar avisos a Paris.
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O Governo francês convocou o seu embaixador em Roma para consultas, numa decisão tomada na sequência dos "ataques sem precedentes do Governo italiano", explicou o Ministério dos Negócios Estrangeiros francês. Governo italiano tenta apaziguar ânimos mas volta a deixar avisos a Paris.
Nos últimos meses, a relação entre Paris e Roma tem conhecido vários picos de tensão. O Presidente francês, Emmanuel Macron, foi sempre crítico do Governo italiano, composto pela Liga, de extrema-direita, e pelo partido anti-sistema Movimento 5 Estrelas, ambos partidos eurocépticos.
No ano passado, o Governo italiano convocou o embaixador francês depois de Macron ter acusado Roma de "cinismo e irresponsabilidade" por recusar a entrada nos seus portos do navio "Aquarius", com 629 imigrantes a bordo.
As disputas relativamente à imigração continuaram com trocas de acusações. E, em Janeiro, Luigi Di Maio, vice-primeiro-ministro e ministro do Trabalho italiano, acusou França de "colonizar" África: "Se temos pessoas a sair de África, é porque alguns países europeus, e a França em particular, nunca deixaram de colonizar África".
"Se a França não tivesse as suas colónias africanas – porque é assim que elas deviam ser chamadas –, seria a 15.ª maior economia. Em vez disso, está entre as primeiras, precisamente por causa do que está a fazer em África", continuou o governante italiano.
Paris condenou veementemente estas afirmações, descrevendo-as como "hostis" e convocando na altura a embaixadora italiana para receber explicações.
Mas o conflito não se ficou por aqui. Já depois de ter expressado apoio público aos Coletes Amarelos, que contestam nas ruas Macron desde Novembro, Di Maio encontrou-se pessoalmente, esta semana, com um dos líderes do movimento, prometendo nova reunião no futuro. Paris classificou este encontro como uma "provocação inaceitável".
"França tem sido, por vários meses, alvo de ataques repetidos, sem fundamento e ultrajantes", diz agora o Ministério dos Negócios Estrangeiros francês em comunicado, afirmando que estes ataques por parte de Roma não têm precedentes desde a Segunda Guerra Mundial.
"Ter discordâncias é uma coisa, mas manipular uma relação por motivos eleitorais é outra", continua o comunicado. "Todas estas acções estão a criar uma situação séria que está a levantar questões sobre as intenções do Governo italiano relativamente a França".
A primeira reacção de Itália chegou de Matteo Salvini, ministro do Interior italiano e líder da Liga: "Estamos prontos para virar a página nas relações com a França a bem dos nossos povos", mostrando-se disponível para se encontrar com Macron para resolver este conflito. No entanto, Salvini avisou que "a França deve parar de mandar migrantes para a fronteira e de dar abrigo a criminosos italianos", cita a Reuters.
"Nós não discutimos com ninguém. Não estamos interessados em controvérsias", acrescentou Salvini.
Di Maio realçou também que os franceses são "amigos" e "aliados" de Itália, mostrando-se igualmente disponível para dialogar com o Governo francês.
Salvini refere-se aqui ao caso de Cesare Battisti, militante dos Proletários Armados pelo Comunismo, grupo armado da esquerda radical, que foi condenado a prisão perpétua em Itália nos anos 70. Mais de 20 anos depois conseguiu fugir tendo partido para França, de onde seguiu para o México, tendo-se fixado depois no Brasil. Acabou por ser detido no início de Janeiro na Bolívia e foi extraditado de volta para Itália.
Além disso, calcula-se que pelo menos 15 outros militantes deste grupo tenham procurado refúgio em França durante as últimas décadas.