A performance que pôs Ivanka Trump de aspirador na mão

Ivanka Vacuuming é a performance da artista conceptual Jennifer Rubell que mostra uma modelo loira parecida com Ivanka Trump a aspirar migalhas atiradas pelo público. A filha do Presidente não gostou.

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O crítico de arte do The Washington Post, Philip Kennicott, diz que a discussão já não é apenas à volta das fake news, mas de coisas mais perenes como a memória futura que ficará dos filhos de Donald Trump depois da presidência. Foi nessa nova batalha que entrou agora Ivanka Trump, a filha do Presidente dos EUA, também sua conselheira, com um tweet “estranhamente desproporcionado” sobre uma performance artística provocadora, publicado poucas horas antes do discurso sobre o Estado da União proferido na terça-feira por Donald Trump.

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O crítico de arte do The Washington Post, Philip Kennicott, diz que a discussão já não é apenas à volta das fake news, mas de coisas mais perenes como a memória futura que ficará dos filhos de Donald Trump depois da presidência. Foi nessa nova batalha que entrou agora Ivanka Trump, a filha do Presidente dos EUA, também sua conselheira, com um tweet “estranhamente desproporcionado” sobre uma performance artística provocadora, publicado poucas horas antes do discurso sobre o Estado da União proferido na terça-feira por Donald Trump.

Ivanka Vacuuming, uma performance da artista Jennifer Rubell que é realizada todos os dias até 17 de Fevereiro, mostra uma modelo loira parecida com Ivanka Trump que aspira sem parar — durante duas horas — uma carpete. A Ivanka da performance, sempre sorridente, actua num universo cor-de-rosa, da roupa ao chão.

“As mulheres podem escolher combaterem-se ou ajudarem-se. Escolho a última [atitude]”, escreveu Ivanka Trump, aparentemente irritada. A filha do Presidente fez ainda um link para um artigo sobre esta performance na Flashpoint Gallery​, um espaço que pertence ao Cultural DC, uma entidade não lucrativa responsável por promover as artes junto do riquíssimo mercado imobiliário de Washington.

Ao contrário dos jornalistas e dos historiadores, os artistas não têm necessariamente que se restringir aos factos quando falam de figuras políticas como Ivanka Trump, lembra o crítico do diário americano. E o poder da performance de Jennifer Rubell para influenciar a “reputação” da filha do presidente, um ícone do feminismo americano, “explodiu” na terça-feira de manhã com a inesperada publicação no Twitter, defende o The Washington Post. Segundo os media americanos, os irmãos de Ivanka Eric e Donald Trump Jr. também reagiram, com o primeiro a dizer que Ivanka é “uma mulher poderosa que já fez mais pelas mulheres do que provavelmente qualquer pessoa em Washington DC”

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Ivanka Trump e o marido Jared Kushner durante o discurso sobre o Estado da União EPA/SHAWN THEW

Migalhas para Ivanka

Num comunicado de imprensa sobre a obra, o Cultural DC explica que a performance é “inspirada por uma figura cuja persona pública incorpora um leque quase cómico de identidades femininas — filha, mulher, mãe, irmã, modelo, mulher trabalhadora, loira”. Ivanka Vacuuming “é simultaneamente uma celebração visual de um ícone contemporâneo feminino; o retrato da nossa própria relação com essa figura; e um questionamento da nossa cumplicidade com essa encenação”, continua.

Ao entrar na galeria, o público depara-se com um monte de migalhas num pedestal, sendo convidado a atirá-las para a carpete. Ivanka Trump limpa constantemente a porcaria feita pelo público, sem o sorriso se desfazer. A performance é acessível também via livestream, das 23h às 1h (hora de Lisboa).

Como explica Jennifer Rubell, o que o espectador é levado a fazer não é linear, lembrando que atirar migalhas a uma figura altamente sexualizada e poderosa é uma atitude aberta a múltiplas interpretações, muitas vezes contraditórias. “Isto é complicado: gostamos de atirar migalhas a Ivanka para ela aspirar. Essa é a verdade muito desagradável que está no centro deste trabalho. É divertido, dá prazer, faz sentirmo-nos poderosos e queremos repetir”, explica Rubell no comunicado. “Gostamos de ter o poder de provocar uma resposta específica. Também sabemos que ela continuará a aspirar, quer o façamos, quer não. Por isso não é bem culpa nossa, não é verdade?”

À Artnews, a artista explicou que o trabalho não é sobre a própria Ivanka, mas que permite interrogar noções de feminilidade que rodeiam a personalidade da filha do Presidente. “A obra explora questões sobre a nossa resposta a certo tipo de feminilidade, mas não é agressiva em relação a ela.” Rubell acrescentou que não estava nada à espera da reacção de Ivanka Trump.

Esta artista conceptual norte-americana, que trabalha muitas vezes com comida e com o conceito de receber, faz parte da “aristocracia” americana, tal como Ivanka: Jennifer Rubell é filha dos coleccionadores de arte contemporânea Don e Mera Rubell e sobrinha de Steve Rubell, um fundador do Studio 54, um dos lugares míticos da Nova Iorque dos anos 70 e 80.

O trabalho de Rubell é visto como uma reflexão sobre o papel de Ivanka Trump como defensora dos direitos das mulheres na administração Trump. Esses pergaminhos, que eram evocados por Ivanka num perfil antigo do Twitter, têm sido sistematicamente postos em causa, mais sistematicamente pelas mulheres democratas, que já lhe chamaram “falsa feminista” ou “hipócrita”.

No mundo social a que o casal Ivanka Trump/Jared Kushner irá regressar terminada a Presidência Trump, as artes têm um peso importante, lembra o crítico do The Washington Post, o que explica a reacção desproporcionada em relação à performance da actual conselheira da Casa Branca, habitualmente sempre tão positiva nos seus tweets, como podemos ler no “Feliz Ano Novo” escrito em chinês e inglês no mesmo dia do desabafo.

A actividade seguinte no Twitter de Ivanka já integra o discurso de Trump sobre o Estado da União, mostrando a “primeira filha” na sua persona mais conhecida – aquela que defende sem confrontos um caminho mais igualitário para as mulheres. A conselheira da Casa Branca “retweetou” uma notícia da agência Reuters, com respectivo vídeo, num dos momentos mais inesperados do discurso: mostra as mulheres democratas a aplaudirem o Presidente quando este cita os números do crescimento do emprego entre as mulheres e o recorde de representação feminina neste novo Congresso (131 mulheres, incluindo o Senado). O vídeo sublinha a mancha que as congressistas vestidas de branco introduziram, naquilo que pretendia ser uma homenagem às sufragistas e uma crítica às políticas de Trump.

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A mancha que as congressistas democratas vestidas de branco introduziram no Congresso REUTERS/Jonathan Ernst

O retweet seguinte era já da Casa Branca, com nova promessa de Trump relativamente à licença de maternidade paga, já abordada no discurso do ano passado. “Também tenho orgulho em ser o primeiro Presidente a incluir no meu orçamento um plano para uma licença familiar paga a nível nacional – para que todos os novos pais tenham a oportunidade de se ligarem à sua criança recém-nascida.”

Na tribuna, Ivanka Trump vestia de preto, longe do branco das democratas e do rosa millennial da performance.