Moradores tentam travar em tribunal empreendimento no Pinheiro Manso

Em causa está a construção de dois prédios de quatro pisos, no interior de um logradouro, nas traseiras de várias casas com dois pisos.

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Um dos prédios está a ser erguido junto aos muros das casas da rua Melo Leote Paulo Pimenta

Vários moradores da Rua Melo Leote e da Rua do Pinheiro Manso apresentaram uma queixa no Ministério Público contra o licenciamento, pela Câmara do Porto, de dois prédios com quatro pisos no interior de um logradouro que confina com as casas onde vivem. Ao contrário do município, os queixosos consideram que o Plano Director Municipal está a ser violado neste empreendimento licenciado em 2017, com base num pedido de informação prévia de 2013.

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Vários moradores da Rua Melo Leote e da Rua do Pinheiro Manso apresentaram uma queixa no Ministério Público contra o licenciamento, pela Câmara do Porto, de dois prédios com quatro pisos no interior de um logradouro que confina com as casas onde vivem. Ao contrário do município, os queixosos consideram que o Plano Director Municipal está a ser violado neste empreendimento licenciado em 2017, com base num pedido de informação prévia de 2013.

Os vizinhos deste empreendimento dizem ter sido surpreendidos no início deste ano com o início dos trabalhos, que implicaram a destruição de uma parte importante – 80%, contabilizam – do jardim pré-existente no logradouro em causa, classificado como área verde privativa a preservar, no Plano Director Municipal do Porto. E mais preocupados ficaram ainda quando perceberam que, para além da requalificação de um edifício com frente para a Rua do Pinheiro Manso – que em tempos foi sede do núcleo local do PSD – o projecto implicava a construção de dois prédios de quatro pisos no interior do logradouro, um deles a poucos metros dos muros traseiros das suas moradias.

Perante a iminência de perda de privacidade e de luz solar, a vizinhança mobilizou-se, e cerca de 30 pessoas subscreveram um abaixo-assinado contra a obra, pedindo, ao presidente da Câmara do Porto, uma audiência para abordar o assunto. Não tendo esta acontecido com a urgência que pediam – deram um prazo de oito dias – alguns dos moradores decidiram avançar com uma queixa ao Ministério Público, invocando a violação de normas do Regime Jurídico de Urbanização e Edificação e do Plano Director Municipal do Porto. E esta terça-feira, levaram o caso à reunião de câmara.

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Um dos afectados, Argel de Melo, garantiu que, para além de aguardarem que encaminhamento dará o MP à queixa apresentada, os moradores estão dispostos a avançar com formas de luta mais duras, entre elas o bloqueio do acesso à obra por parte do empreiteiro, para impedir que esta avance. Morador da Rua do Pinheiro Manso, este cidadão garantiu que os vizinhos estão disponíveis para levar a luta até ao Supremo Tribunal, e levar a cabo formas de protesto pouco vistas em Portugal, para defenderem a legalidade e os seu direitos à privacidade e à luz solar, que dizem serem postos em causa principalmente pelo prédio mais longo que está previsto para o interior do logradouro e que está alinhado com os muros dos jardins de várias casas.

Os moradores desafiaram Rui Moreira a visitar a rua, onde até já morou, para ver a obra. Elogiaram a intervenção da CDU, que já esteve no local, fez um requerimento e já obteve respostas do Departamento Municipal de Gestão Urbanística, e criticaram quer a câmara – por nada ter respondido ao abaixo-assinado e a questões colocadas aos serviços, via e-mail – quer a restante oposição. Argel de Melo afirmou que o PS ainda se mostrou interessado no assunto até perceber, notou, que o processo urbanístico passou pelas mãos do ex-vereador Correia Fernandes, eleito por aquele partido e responsável pelo pelouro do urbanismo em grande parte do mandato anterior.

A defesa do arquitecto e ex-autarca foi feita por Pedro Baganha, actual responsável pelo Pelouro. Este lembrou que, de facto, o processo decorre da aprovação de dois pedidos de informação prévia, em Dezembro de 2013 e em Março de 2015, por Correia Fernandes, que aprovou também o projecto de arquitectura, em 2016. Baganha recorreu à informação que lhe foi prestada pelos serviços para garantir que a obra cumpre o PDM, em questões como a preservação da parte considerada relevante dos antigos jardins e na impermeabilização do solo, que não chega ao limite de 40% estabelecido no regulamento.

Os moradores, pela voz de outro cidadão, Pedro Farinha, insistiram, entre outros aspectos, na questão do desrespeito pela cércea da envolvente, mas neste ponto o autarca defendeu que o conceito de “adequada relação com os edifícios existentes na envolvente”, também presente no PDM, deixa alguma margem de discricionariedade a quem aprova estes projectos. Um argumento que não convenceu os queixosos, que argumentam que o único edifício com quatro pisos, um lar de idosos na rua do Pinheiro Manso, se localiza a cerca de 70 metros do prédio em construção, cuja envolvente, notam, são as suas casas.

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Paulo Pimenta

O vereador disse também ter já pedido aos serviços de fiscalização que fossem ao local, para ver se o que está a ser construído no terreno corresponde ou não ao projecto, e disse desconhecer a informação, prestada pelos moradores, de que estaria a ser betonada uma área em cave ocupando quase o dobro dos 40% de impermeabilização permitida. O autarca mostrou também desconhecer que no local existia antes uma capela, alegadamente não referida na memória descritiva do projecto, e que, segundo os queixosos, foi demolida.

Em todo o caso, e por proposta do próprio presidente da câmara, o responsável pelo urbanismo acedeu a reunir-se com os contestatários para perceber melhor os seus argumentos e analisar o processo com mais detalhe. Baganha considerou que, face àquilo que conhece, e independentemente do direito que os moradores têm de seguir para tribunal, o promotor da obra, a sociedade Reurbe, tem uma licença legalmente emitida pelo município. Ou seja, notou, a menos que o tribunal tenha outro entendimento, neste momento qualquer alteração ao projecto previsto para aquele local dependerá sempre da “boa vontade” do dono da obra.