Como é que um português vive o “Brexit”?

Se não houver acordo, quem por aqui anda terá muitas razões para sair à rua. Os imigrantes é que não têm culpa. Aliás, os imigrantes nem sequer puderam votar.

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Toby Melville/Reuters

Poder viver os Jogos Olímpicos de 2012 em Londres foi um privilégio. Não, um orgulho. Os dois, um orgulho e um privilégio. Estar, de facto, no centro do mundo, infinito, multicultural, ver gente, ainda mais gente, de todo o lado, de todo o mundo, ajudar, falar, indicar, conhecer e dar-me a conhecer, fazer amigos, ir ao Estádio Olímpico pela escola, dizer olá e adeus a uma festa universal foi em tudo contrastante com o que veio a acontecer em 2013.

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Poder viver os Jogos Olímpicos de 2012 em Londres foi um privilégio. Não, um orgulho. Os dois, um orgulho e um privilégio. Estar, de facto, no centro do mundo, infinito, multicultural, ver gente, ainda mais gente, de todo o lado, de todo o mundo, ajudar, falar, indicar, conhecer e dar-me a conhecer, fazer amigos, ir ao Estádio Olímpico pela escola, dizer olá e adeus a uma festa universal foi em tudo contrastante com o que veio a acontecer em 2013.

Finda a euforia, era urgente arrumar a casa. Assim sendo, Theresa May, então ministra da Administração Interna, vulgo Home Office, enviou para as ruas uma série de carrinhas cobertas de cartazes convidando os imigrantes ilegais a entrarem em contacto com o Home Office, o qual se prontificava a “ajudar” os ditos a regressar ao país de origem.

Poucos meses depois, estávamos a meter os papéis para a aquisição da cidadania britânica. O ambiente mudara. Radicalmente. Sentia-se no ar. Já não éramos bem-vindos.

Entretanto veio o Nigel Farage e o pub ao fim da nossa rua vestiu-se de amarelo e roxo, as cores do UKIP. Os olhares, estranhos, estranhavam o casal de portugueses, baixinhos, de cabelo negro e olhos negros, lá no meio, os mesmos portugueses que, por uma questão de bom senso, ficaram sem lá voltar.

Aquando do teste de cidadania britânica, um casal, os dois muito loiros, muito altos, do Zimbabwe (já estavam a adivinhar, não estavam?) perguntava por que razão pretendíamos a cidadania fazendo parte da União Europeia, achando piada ao nosso medo do referendo. E medo é a palavra, e medo é a resposta à pergunta inicial, lá em cima, vejam bem, no topo da página.

Como é que um português vive o "Brexit"? Vive inseguro, preocupado, consigo, connosco, com outros portugueses e cidadãos dos quatro cantos do mundo, de pouco valendo ter a cidadania e o passaporte se o emprego é o verdadeiro passaporte para aqui podermos continuar. 

Sem emprego, não temos nada. Sem emprego, voltamos à estaca zero, a mesma estaca que nos levou a sair de Portugal. Sem emprego, os ingleses nem precisam do "Brexit". E o medo, este medo, já está presente há muito, desde 2013, quando as carrinhas da Theresa May saíram à rua para nos convidar a voltar para casa.

Mas esta é a nossa casa e não, não queremos um "Brexit". Se daqui sairmos, não será para Portugal mas para outro país, e já não temos nem a idade nem a energia para começar do zero. Esta é, portanto, uma luta pela nossa sobrevivência.

Os britânicos que tanto prezávamos em 2012 são os mesmos britânicos agora do lado de lá da barricada e a História já nos ensinou sobre conflitos em situações semelhantes.

Ainda ninguém saiu à rua, mas as mensagens de protesto e revolta estão nos jornais todos os dias. Os mesmos jornais que levaram o Reino Unido a votar para sair da União Europeia. 

Se não houver acordo, quem por aqui anda terá muitas razões para sair à rua. Os imigrantes é que não têm culpa. Aliás, os imigrantes nem sequer puderam votar.