Descoberta uma nova família de fungos na Sé Velha de Coimbra

Num projecto que avalia a deterioração causada por fungos e bactérias, cientistas da Universidade de Coimbra identificaram uma nova família de fungos, a Aeminiaceae.

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Durante a recolha de amostras de calcário deteriorado numa peça de arte na Sé Velha de Coimbra – que é Património Mundial da UNESCO –, descobriu-se uma nova família de fungos, a Aeminiaceae. Apresentados na última edição da revista científica MycoKeys, estes fungos podem contribuir para uma descaracterização das obras de arte. Contudo, a equipa refere que não há motivo de preocupação imediata porque muitos monumentos classificados pelas Nações Unidas estão sujeitos à biodegradação por microorganismos.

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Durante a recolha de amostras de calcário deteriorado numa peça de arte na Sé Velha de Coimbra – que é Património Mundial da UNESCO –, descobriu-se uma nova família de fungos, a Aeminiaceae. Apresentados na última edição da revista científica MycoKeys, estes fungos podem contribuir para uma descaracterização das obras de arte. Contudo, a equipa refere que não há motivo de preocupação imediata porque muitos monumentos classificados pelas Nações Unidas estão sujeitos à biodegradação por microorganismos.

“A Sé Velha de Coimbra é a única catedral românica portuguesa dos tempos da Reconquista a ter sobrevivido relativamente intacta até agora”, indicam os autores no artigo científico. Localizada a meia encosta na cidade de Coimbra, esta catedral foi construída em calcário amarelo entre o século XII e o XIII sob a orientação do Mestre Roberto (que também orientou a obra da Sé de Lisboa).

Em 2013, a UNESCO reconheceu o conjunto histórico-cultural da Universidade de Coimbra, da Alta de Coimbra e da rua de Sofia (zona onde está a Sé Velha de Coimbra) como Património Mundial da Humanidade. “Dentro desta área, muitos monumentos mostram claros sinais de biodeterioração, incluindo a proliferação de fungos microcoloniais negros”, lê-se no artigo.

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Recolha de amostras na Capela de Santa Maria na Sé Velha de Coimbra Miguel Mesquita

Conhecidos por terem uma resistência única a condições ambientais adversas – como temperaturas extremas e secas severas –, estes fungos têm um crescimento lento e sobrevivem em desertos quentes e frios, sítios contaminados por hidrocarbonetos e em rochas.

“Devido às suas fortes cores escuras, os fungos microcoloniais negros alteram a aparência da obra de arte ou do monumento causando uma degradação estética da obra”, acrescenta ao PÚBLICO João Trovão, estudante de doutoramento do Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra e um dos autores do artigo. “Pelas suas características biológicas, são capazes de causar degradações físicas, levando ao aparecimento de fissuras através do seu crescimento para o interior da rocha. São também capazes de realizar alterações bioquímicas nos constituintes minerais originais da rocha.”

Agora, a equipa de João Trovão encontrou na Sé Velha de Coimbra uma nova família de fungos microcoloniais negros. Tudo aconteceu durante o projecto científico Mycostone – em curso desde o final de 2016 –, que tem como objectivo avaliar a deterioração causada por fungos, algas, bactérias e arquea em calcários na zona da Universidade de Coimbra, Alta e Sofia.

Quando se recolheram amostras de calcário deteriorado numa peça de arte da Capela de Santa Maria (no interior desta Sé), a equipa verificou que havia alguns sinais de colonização por fungos microcoloniais negros. “Por esta razão, foi realizada uma tentativa de isolamento dos organismos e, posteriormente, uma análise extensiva das suas características morfológicas, fisiológicas, ecológicas e moleculares para a sua identificação”, explica João Trovão.

Percebeu-se então que estes fungos pertenciam a uma nova família para a ciência (a Aeminiaceae), a um novo género (o Aeminium, o antigo nome em latim da cidade de Coimbra) e ainda a uma nova espécie (Aeminium ludgeri). O nome desta espécie é uma homenagem ao micólogo da Universidade de Coimbra, Ludgero Avelar, que pertencia ao grupo de investigação responsável por este estudo. “Dadas as suas enormes características humanas, mas também pelos enormes laços de amizade que criou e pela admiração que todos tinham por ele, o nome da espécie foi dado em sua homenagem”, assinala João Trovão.

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Colónia da espécie Aeminium ludgeri, que pertence à família agora descoberta João Trovão

De onde veio?

O investigador refere que estes novos fungos foram encontrados “em quantidades substanciais na peça de arte”, mas justifica: “Neste caso, a localização e as microcondições abióticas, ambientais e geológicas desta peça de arte favorecem o seu crescimento.” Segundo João Trovão, uma consequência negativa deste fungo pode ser uma descaracterização das obras de arte e do seu valor. Além do Aeminium ludgeri, também foram identificados outros fungos no solo, na água e no ar, que, no entanto, serão inofensivos para o calcário.

Mas como terá chegado o Aeminium ludgeri à Sé Velha de Coimbra? Uma das hipóteses é que este fungo esteja associado às rochas usadas na sua construção. “Os calcários usados na construção da Sé Velha de Coimbra provêm de áreas únicas de Portugal (nomeadamente de Ançã e de Portunhos, perto de Coimbra)”, frisa-se no artigo. João Trovão aponta ainda que também não se pode descartar uma chegada através do ar ou da água.

Além de os cientistas considerarem crucial conhecer melhor este organismo, João Trovão indica o que deve ser feito para que a situação na Sé Velha de Coimbra não se agrave: “No futuro, devem considerar-se intervenções de restauração apropriadas tendo por base exames cuidadosos dos dados ambientais, abióticos, arquitectónicos, ecológicos e geológicos, juntamente com uma intervenção de limpeza específica (se for necessário e recomendável).”

Sobre se estes fungos podem pôr em causa a classificação da UNESCO, o investigador responde que não. “Muitos dos monumentos considerados Património Mundial da UNESCO estão sujeitos a biodeterioração por microorganismos.” Afinal, como frisa, esta situação também acontece porque estes fungos procuram nichos ecológicos para crescer e sobreviver, tal como na natureza. E conclui: “Dado que muitos destes monumentos históricos possuem um valor incalculável, a realização deste tipo de estudos é fulcral para o estabelecimento de estratégias de restauro eficazes para a preservação do património da UNESCO para o futuro.”