Ministério Público tenta impedir juiz de eliminar emails na Operação Marquês

Ivo Rosa alega que correio electrónico apreendido na empresa de Lalanda e Castro diz respeito a pessoas que nunca foram suspeitas. Procuradores acusam-no de tentar condicionar as próximas fases do processo.

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Enric Vives-Rubio

O Ministério Público está a tentar impedir o juiz Ivo Rosa de destruir mensagens de correio electrónico apreendidas ao antigo patrão do ex-primeiro-ministro José Sócrates, Lalanda e Castro, e a pessoas que trabalhavam com ele na farmacêutica Octapharma.

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O Ministério Público está a tentar impedir o juiz Ivo Rosa de destruir mensagens de correio electrónico apreendidas ao antigo patrão do ex-primeiro-ministro José Sócrates, Lalanda e Castro, e a pessoas que trabalhavam com ele na farmacêutica Octapharma.

O magistrado diz que o Ministério Público não fundamentou o interesse destes emails como meio de prova. De resto, apesar de ter chegado a ser arguido na Operação Marquês, Lalanda e Castro viu arquivadas pelos procuradores as suspeitas que impendiam sobre ele neste processo: não chegou a ser acusado. Porém, o Ministério Público argumenta que se Ivo Rosa destruir este correio electrónico, como anunciou que irá fazer, estará não só a violar a lei como a condicionar fases posteriores do processo – ou seja, o julgamento de primeira instância e o desfecho dos recursos que se lhe seguirem.

A Octapharma foi alvo de buscas duas vezes, em 2014 e em 2016. Da segunda vez as autoridades apreenderam – com autorização judicial – o correio electrónico de quatro pessoas: de três funcionários e do próprio patrão. Como a troca de correspondência deste último versava apenas os últimos dois meses, o então suspeito da Operação Marquês veio mais tarde a entregar voluntariamente ao Ministério Público o que faltava, embora com condições: desde que, depois de expurgados os dados sujeitos a segredo profissional e comercial, este material só pudesse ser usado neste processo, e não noutros. Segundo o seu advogado, as autoridades aceitaram estas condições.

Mais tarde o ex-patrão de Sócrates pediu ao Ministério Público que destruísse os emails que havia entregado – pedido que viu recusado. Com o início da fase instrutória, os procuradores deixaram de mandar no processo, que passou a ser dirigido pelo juiz Ivo Rosa, a quem Lalanda e Castro repetiu o pedido. Mas a decisão do magistrado vai mais longe: anuncia que vai também mandar eliminar, no final da fase de instrução da Operação Marquês, o correio electrónico apreendido antes aos três funcionários e ao patrão. Uma decisão contra a qual os procuradores manifestam “a mais viva discordância”.

"Não são suspeitas"

Nas instruções que dá aos funcionários do Tribunal Central de Instrução Criminal, Ivo Rosa justifica esta opção: “Dado que o correio electrónico em causa não foi indicado como meio de prova [pelo Ministério Público]” e se refere a “pessoas que não são nem nunca foram consideradas suspeitas” no processo, deve ser “colocado em envelope lacrado”, para mais tarde ser “eliminado”.

Para os procuradores, a decisão “não tem qualquer suporte legal”. A concretizar-se, “a fase de instrução transforma-se numa forma de condicionar a produção de prova em posteriores fases do processo”. Ou seja, no julgamento de primeira instância e nos recursos que se lhe seguirão. O despacho de Ivo Rosa foi alvo de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, com o Ministério Público a defender que a destruição só deve ter lugar quando tudo terminar, ou seja, depois do trânsito em julgado.

Há pelo menos uma certidão extraída da Operação Marquês que originou uma investigação em que aparece também como implicado o ex-patrão de Sócrates. Os procuradores queriam usar estes emails nesse inquérito, mas o mesmo juiz alegou que isso violaria os direitos, liberdades e garantias de Lalanda e Castro e dos seus funcionários.

Esta segunda-feira, no arranque da instrução da Operação Marquês, foi ouvida a filha de Armando Vara. É acusada de dois crimes de branqueamento de capitais por, alegadamente, ter ajudado o pai a lavar dinheiro. Na tese da acusação, quando era administrador da Caixa Geral de Depósitos Armando Vara envolveu o banco num negócio ruinoso, relacionado com a compra e expansão do resort de Vale do Lobo, tendo em troca recebido luvas através de uma sociedade offshore que lhe pertencia a si e à filha. Um milhão seria para ele, outro para José Sócrates. Bárbara Vara assegurou não ter estranhado que o pai possuísse dois milhões de euros em contas bancárias na Suíça  – apesar de até 2009 desconhecer este facto. Pensou que vinham de negócios do progenitor, alegou. E não terá relacionado isto com o facto de ele ser administrador da Caixa Geral de Depósitos.

Já Armando Vara devia ser ouvido esta terça-feira no Tribunal Central de Instrução Criminal, mas como se encontra a cumprir pena na cadeia de Évora e está a decorrer uma greve de guardas prisionais o seu interrogatório foi adiado para 5 de Fevereiro.