Poluição no rio Este, em Braga, já motivou mais de 80 denúncias desde 2014

O rio correu esbranquiçado por duas vezes nesta semana, mas o problema estende-se no tempo. Câmara diz que é difícil detectar a origem das descargas.

Fotogaleria

Há pouco mais de duas semanas, a água do rio Este, ao invés de transparente, corria branca na zona entre a Avenida da Liberdade e a Rua 31 de Janeiro em Braga. A situação foi denunciada ao Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (Sepna) da GNR, logo pelas 9h00 do dia 9 de Janeiro, mas voltou a repetir-se na passada segunda-feira, na mesma zona.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Há pouco mais de duas semanas, a água do rio Este, ao invés de transparente, corria branca na zona entre a Avenida da Liberdade e a Rua 31 de Janeiro em Braga. A situação foi denunciada ao Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (Sepna) da GNR, logo pelas 9h00 do dia 9 de Janeiro, mas voltou a repetir-se na passada segunda-feira, na mesma zona.

A poluição no afluente do rio Ave é, no entanto, um problema com passado. Contactada pelo PÚBLICO, a GNR confirmou o registo de 81 denúncias relativas a descargas poluentes, desde o início de 2014 — em média, o rio surge com uma aparência anómala a cada 23 dias. Na sequência das queixas recebidas, a força de segurança aplicou nove contra-ordenações e abriu dois processos-crime, relativos às infracções cometidas por duas pessoas e sete entidades. As descargas, informou ainda a GNR, tiveram origem em “águas degradadas” de pedreiras, explorações agro-pecuárias e actividades industriais.

As acções de fiscalização não decorreram apenas em Braga, onde o rio nasce (Vale d’Este), mas também em Famalicão e em Barcelos, concelhos percorridos pelo Este, antes do seu encontro com o Ave em Vila do Conde, a cerca de quatro quilómetros do mar. Braga alberga, contudo, a zona urbana mais afectada pela poluição, concentrando as queixas dos cidadãos e dos políticos.

A descarga de 9 de Janeiro motivou uma pergunta do Bloco de Esquerda ao Ministério do Ambiente, no dia seguinte. O deputado eleito pelo distrito, Pedro Soares, quer saber junto do Governo se já foram identificados os focos de poluição, se já estão em curso acções para responsabilizar os autores das descargas e que medidas vão ser tomadas para se evitarem casos futuros. O movimento político Braga para Todos também tem denunciado as últimas descargas e criticado a inactividade da câmara, sobretudo no que respeita à vigilância. “O rio está muitas vezes sujo, abandonado e com pouca visibilidade. Talvez fosse necessário implementar postos de vigilância e ter a polícia a circular com mais frequência junto do rio”, considera a responsável do Braga para Todos, Elda Fernandes.

Foto

O vereador municipal com o pelouro do ambiente garante, no entanto, ao PÚBLICO, que o efeito dos “grandes poluidores” sobre o rio foi reduzido substancialmente desde 2013, quando a maioria PSD-CDS/PP-PPM, liderada por Ricardo Rio, assumiu o poder. A autarquia, diz Altino Bessa, eliminou as descargas permanentes de alguns edifícios e levou ao Ministério Público uma descarga com origem numa loja de bricolage Aki. A descarga ocorreu em Abril de 2014, quando cerca de 300 litros de tinta se espalharam pelo chão, após a queda de uma palete. Um funcionário depositou essa tinta no rio, que ficou branco.

Casas podem ser o problema

Se as descargas permanentes foram praticamente eliminadas, porque continua o rio a aparecer alterado com regularidade? Muitas das cozinhas nas habitações da cidade ainda dirigem a água não para a rede de águas residuais, mas para a rede de águas pluviais e consequentemente para o rio, sugere Altino Bessa. O vereador apela, por isso, aos cidadãos para fazerem um esforço de auto-fiscalização. “Há 20 anos, a água das cozinhas não tinha de estar ligada às águas residuais, mas não vamos entrar em milhares de casas para verificar essa situação”, afirma.

O problema também se perpetua pela curta duração dos efeitos das descargas, que dificulta a localização da origem, justifica o vereador. “Já me aconteceu ter visto uma descarga e alertado o Sepna”, conta. “Passados 15 minutos, quando o Sepna chegou ao local, já não era possível ver a origem da descarga, ao fazer o levantamento das tampas.”

Dada a “complexidade da rede de ligações”, com milhares de sarjetas que têm o rio como destino, Altino Bessa aconselha os cidadãos a terem cuidado com o que atiram para o chão ou com tarefas como a mudança do óleo de uma viatura, a partir de casa. 

Apesar de os autores de muitos dos casos que afectam o Este não terem sido encontrados, há várias razões que podem explicar as mudanças na aparência do rio, diz a bióloga Cláudia Pascoal, da Universidade do Minho. Uma delas tem que ver com a extracção de areias realizada não muito longe da cidade. “Como há pouca vegetação nas margens do troço que atravessa a cidade, o pó das areias é arrastado e o rio fica esbranquiçado”, diz.

Mas, em Novembro de 2018, o rio correu castanho, ao invés de branco. A chuva e a falta de vegetação nas margens ditaram a mudança da cor, afirma a especialista em ecologia aquática. “Quando começa a chover, há uma lavagem dos terrenos adjacentes ao rio. O tom acastanhado deve-se aos materiais arrastados a partir das margens.”

Apesar de reconhecer que o Este pode ser ocasionalmente alvo de descargas poluentes, Cláudia Pascoal lembra que tanto a qualidade da água do rio, como o controlo das situações de cheia, devido às intervenções de restauro fluvial realizadas em 2011 e 2014, têm vindo a melhorar, com “consequências directas na qualidade de vida dos cidadãos”.