Faltas de medicamentos nas farmácias atingem valor recorde
Em 2018, 64,1 milhões de embalagens de medicamentos não puderam ser dispensadas nas farmácias no momento da compra. Infarmed desdramatiza fenómeno e adianta que vai alterar forma de notificação das faltas de medicamentos.
As faltas de medicamentos reportadas pelas farmácias atingiram um valor recorde no ano passado. Em 2018, as notificações à associação do sector aumentaram 32,8% face ao ano anterior. Ao todo, foram 64,1 milhões de embalagens de medicamentos que não puderam ser dispensadas no momento em que as pessoas as tentaram adquirir. É o número mais elevado desde que o fenómeno começou a ser monitorizado, em 2014.
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As faltas de medicamentos reportadas pelas farmácias atingiram um valor recorde no ano passado. Em 2018, as notificações à associação do sector aumentaram 32,8% face ao ano anterior. Ao todo, foram 64,1 milhões de embalagens de medicamentos que não puderam ser dispensadas no momento em que as pessoas as tentaram adquirir. É o número mais elevado desde que o fenómeno começou a ser monitorizado, em 2014.
Os dados constam do último relatório do observatório que foi criado há seis anos pelo Centro de Estudos e Avaliação em Saúde (Cefar) da ANF para monitorizar este problema. O sistema instalado permite registar as encomendas a que os distribuidores não conseguem dar resposta de imediato.
Nalguns casos excepcionais, as falhas podem pôr em risco a saúde dos doentes, quando estes se vêem obrigados a interromper a toma da medicação, se houver ruptura do abastecimento do mercado. Na maior parte das situações, porém, o que acontece é que os doentes são obrigados a voltar às farmácias algumas horas depois para receber os medicamentos que as farmácias não tinham em stock. E, por vezes, nem sequer são informados de que haveria alternativas para substituir aquele fármaco específico, diz uma fonte da Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed), que desdramatiza este fenómeno.
O Infarmed adiantou, entretanto, ao PÚBLICO que está a preparar uma alteração da forma como as notificações das faltas de fármacos são efectuadas. O regulador revela que está a elaborar um documento “em que pretende actualizar as formas de notificação de faltas por todos os intervenientes do circuito legal do medicamento”.
Num memorando sobre este problema, e em que recorda que nos últimos anos foram tomadas medidas "que visam prevenir e combater a indisponibilidade de medicamentos em Portugal e mitigar as rupturas de stock”, adianta os números relativos às dificuldades de acesso a medicamentos por várias razões e que resultaram em notificações ao Infarmed em Dezembro passado. Houve 68 “reportes relativos a medicamentos com ruptura” declarada numa plataforma criada para o efeito, 150 notificações “relativas a medicamentos em situação de não ruptura” e 60 queixas de utentes, especifica.
Mas os dados que constam do relatório da ANF, que esta quarta-feira foi noticiado pelo Correio da Manhã, dão uma dimensão completamente diferente do problema. O documento a que o PÚBLICO teve entretanto acesso revela que as faltas reportadas (e não há aqui destrinça entre rupturas de abastecimento e meras falhas temporárias) passaram de um total de 56,5 milhões de embalagens, em 2014, subiram ligeiramente em 2015 e baixaram nos dois anos seguintes, atingindo 48,3 milhões de embalagens em 2017. Mas em 2018 dispararam: foram mais 15,8 milhões de embalagens do que no ano anterior.
Sem se referir às múltiplas causas que estão na origem deste fenómeno, o relatório inclui a lista de medicamentos que mais vezes faltaram em 2018, em número de embalagens.
No topo da lista surgem o Sinemet, um medicamento para a doença de Parkinson, que esteve em ruptura de abastecimento em 2018; o Tarjenta (para a diabetes tipo 2); e a aspirina GR (para tromboses e enfartes), além do Spiriva (doença pulmonar obstrutiva crónica) e o Adalat (hipertensão).
Farmácias do interior mais afectadas
“As falhas dos medicamentos são um problema de saúde por dificuldades globais do sector. A maioria das farmácias tem prejuízo para dispensar os medicamentos essenciais, comparticipados pelo Estado”, comentou o secretário-geral da ANF, Nuno Flora, em nota à imprensa.
Acrescenta que “as dificuldades são maiores nas farmácias mais pequenas do interior, que servem as populações mais idosas, isoladas e desfavorecidas (e não podem vender outros produtos — cosméticos, para bebé, etc — para compensar o prejuízo que têm nos medicamentos)”.
Em Dezembroo, ainda de acordo com o relatório da ANF, Vila Real, Bragança, Braga e Castelo Branco foram os distritos mais afectados pelas faltas de fármacos e cerca de dois terços das farmácias do país reportaram então, pelo menos uma vez, dificuldades para aviar de imediato os remédios.
No rol dos medicamentos em falta, há alguns que constam da lista dos considerados essenciais pela Organização Mundial de Saúde. Mas em casos mais complexos, como o do Sinemet, em que houve uma ruptura de abastecimento no ano passado, o Infarmed fez pressão para que se encontrassem alternativas para abastecer o mercado.
Já em 2018, confrontado com os números das falhas reportadas no ano anterior pela ANF, a entidade reguladora do medicamento lembrou em comunicado que recebeu apenas 1640 notificações de faltas de fármacos nesse ano. E sublinhou que as mais representativas resultaram de inspecções feitas nas farmácias.
No memorando agora divulgado, o Infarmed lembra que são vários os conceitos associados à perturbação no normal abastecimento de medicamentos no mercado (rupturas, falhas, suspensão, cessação de comercialização dos medicamentos, etc.) e defende que é necessário proceder a “uma clarificação e sistematização dos mesmos”.
Lembra ainda que “as falhas de medicamentos podem existir por motivos multifactoriais”, como “situações comerciais, gestão minimalista de stocks por parte das farmácias” ou “rupturas transitórias de fornecimento dos medicamentos”, por exemplo, na sequência de problemas de fabrico ou de distribuição ou atrasos na entrega.