Um “pequeno” filme com muito de “grande”
Um documentário modesto mas inteligente sobre os refugiados da Alemanha nazi que passaram por Portugal.
O novo documentário de Nicholas Oulman, uma década depois do filme que dedicou em 2009 ao seu pai Alain Oulman (o editor livreiro e compositor preferido de Amália), chega às salas num peculiar timing, em simultâneo com o excelente Em Trânsito de Christian Petzold. São ambos filmes sobre refugiados que procuram escapar a um conflito através de cidades portuárias Marselha no caso de Petzold, Lisboa no caso de Debaixo do Céu, que acompanha os percursos de uma mão-cheia de refugiados judeus alemães na sua fuga da Alemanha nazi. E são ambos filmes sobre a angústia, a incerteza e o medo de um limbo apátrida em que já não se pertence ao mundo onde se foi criado, mas ainda não se encontrou o seu lugar noutro local Portugal (e especialmente Lisboa), em Debaixo do Céu, torna-se então numa espécie de “estância de férias”, de promessa de um novo mundo pacífico e acolhedor. A ironia é inescapável refugiados judeus da Alemanha nazi, adolescentes deslumbrados com um país prisioneiro de um regime fascista onde sentiam a vida que lhes tinha sido negada na sua terra. Mas é uma ironia que aponta igualmente como a Lisboa em tempo de guerra — que, por exemplo, João Canijo desenhou em parte na sua Fantasia Lusitana — é um terreno fértil de histórias que continua em grande parte por explorar.
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O novo documentário de Nicholas Oulman, uma década depois do filme que dedicou em 2009 ao seu pai Alain Oulman (o editor livreiro e compositor preferido de Amália), chega às salas num peculiar timing, em simultâneo com o excelente Em Trânsito de Christian Petzold. São ambos filmes sobre refugiados que procuram escapar a um conflito através de cidades portuárias Marselha no caso de Petzold, Lisboa no caso de Debaixo do Céu, que acompanha os percursos de uma mão-cheia de refugiados judeus alemães na sua fuga da Alemanha nazi. E são ambos filmes sobre a angústia, a incerteza e o medo de um limbo apátrida em que já não se pertence ao mundo onde se foi criado, mas ainda não se encontrou o seu lugar noutro local Portugal (e especialmente Lisboa), em Debaixo do Céu, torna-se então numa espécie de “estância de férias”, de promessa de um novo mundo pacífico e acolhedor. A ironia é inescapável refugiados judeus da Alemanha nazi, adolescentes deslumbrados com um país prisioneiro de um regime fascista onde sentiam a vida que lhes tinha sido negada na sua terra. Mas é uma ironia que aponta igualmente como a Lisboa em tempo de guerra — que, por exemplo, João Canijo desenhou em parte na sua Fantasia Lusitana — é um terreno fértil de histórias que continua em grande parte por explorar.
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VIDEO_CENTRAL
Debaixo do Céu está a meio caminho entre o trabalho de Canijo nesse documentário de 2010 e o que Susana de Sousa Dias fez com os arquivos do regime em “48” e Luz Obscura. Em comum com o primeiro, o recurso exclusivo a imagens de época e o respectivo (e alucinante) trabalho de pesquisa de materiais; dos segundos reconhece-se a opção de manter exclusivamente em voz off os sete sobreviventes que contam as suas histórias na primeira pessoa, numa dessincronia onde as imagens e as palavras se completam e se amplificam mutuamente. Claro que tudo isto tem origem muito mais para trás, no modo como Claude Lanzmann contou o Holocausto em Shoah, mas o filme de Nicholas Oulman tem outras ambições, mais modestas mas nem por isso menos válidas: contar as histórias específicas daqueles que passaram, ou em alguns casos até ficaram, por cá, pequenas histórias pelo meio da Grande História que as arrastou no seu turbilhão. É um “pequeno” filme que tem muito de “grande” pelo meio da modéstia que manifesta.