Há cada vez mais histórias de medo nos bairros do Porto
Tráfico de droga, armas, ameaças. Moradores aproveitaram reunião de câmara para relatar problemas em habitações da Domus Social. Câmara diz ter vários casos em mãos e garante estar atenta ao problema
O pesadelo começou há coisa de um mês e virou do avesso as vidas de L. e dos dois filhos. Na Pasteleira Nova, o ambiente há muito se tornou uma dor de cabeça para muitos dos moradores que procuram ter uma vida normal por ali. L. – assim identificada por medo de represálias – tem um emprego e quase não faz vida no bairro. “Saio de manhã e entro à noite”, contou ao presidente da câmara, Rui Moreira, e aos vereadores do executivo e oposição. Mas nem assim conseguiu manter-se longe de problemas. Um dia, no seguimento de um episódio aparentemente irrelevante, um dos filhos foi agredido. Era de noite e, aflitos, correram para casa em busca de refúgio. No bairro da zona ocidental ouviram-se tiros lançados para o ar. Vários moradores chamaram a polícia. Registo da ocorrência, não houve. No dia seguinte, L. fechou as persianas, trancou-se em casa com os filhos. No outro, pediu escolta policial para sair. Nunca mais pôde regressar à Pasteleira.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
O pesadelo começou há coisa de um mês e virou do avesso as vidas de L. e dos dois filhos. Na Pasteleira Nova, o ambiente há muito se tornou uma dor de cabeça para muitos dos moradores que procuram ter uma vida normal por ali. L. – assim identificada por medo de represálias – tem um emprego e quase não faz vida no bairro. “Saio de manhã e entro à noite”, contou ao presidente da câmara, Rui Moreira, e aos vereadores do executivo e oposição. Mas nem assim conseguiu manter-se longe de problemas. Um dia, no seguimento de um episódio aparentemente irrelevante, um dos filhos foi agredido. Era de noite e, aflitos, correram para casa em busca de refúgio. No bairro da zona ocidental ouviram-se tiros lançados para o ar. Vários moradores chamaram a polícia. Registo da ocorrência, não houve. No dia seguinte, L. fechou as persianas, trancou-se em casa com os filhos. No outro, pediu escolta policial para sair. Nunca mais pôde regressar à Pasteleira.
O conselho veio dos vizinhos e a mensagem terá sido entregue à própria mãe de L., também moradora do bairro, quando lhe entraram em casa para mostrar uma arma. “Foram lá dizer que era para dar um tiro ao meu filho”, relata. Rui Moreira aproveitou o caso para fazer uma achega ao novo regulamento de gestão da Domus Social, aprovado minutos antes na mesma reunião de câmara e que aceitou, por proposta do PS e da CDU, retirar uma cláusula de “condenação perpétua” de um cidadão que algum dia tivesse cometido um crime, sem no entanto fazer cair um tempo de cinco anos de ficha limpa para se poder concorrer a habitação camarária. E a ideia de toda a família ser punida no caso de um dos seus elementos cometer ilícitos. “É por situações como esta que todo o agregado é penalizado”, comentou, deixando em acta a promessa de resolver o caso de L. o mais brevemente possível.
O cenário de medo e relatos de tráfico de droga nos bairros não é novo para Rui Moreira, que admitiu ter “vários casos” semelhantes ao relatado na reunião. L. está a viver “de favor” em casa de um familiar, em colchões e sacos-cama instalados no chão da sala. “É um dos casos de urgência que peço ao vereador Fernando Paulo para resolver”, apelou o presidente, requerendo à moradora que aceite formalizar a queixa com a ajuda da autarquia. A prioridade, frisou, é no entanto “a protecção da senhora e da família”.
Enquanto consultava papelada do processo de L., o vereador da habitação informava que o seu pedido de transferência não tinha conseguido, inicialmente, luz verde. Mas iria ser novamente apreciado. À saída da reunião, a moradora deixava cair lágrimas. Dizia estar desesperada. Ter medo. A vida em suspenso. E Rui Moreira, já fora da sala de reuniões, voltava a reforçar a promessa, olhos nos olhos, de uma solução para o seu problema. “Ainda bem que vim aqui, só agora soube que havia estas reuniões”, comentava com o PÚBLICO à saída.
A emoção de A. fê-la passar a palavra ao companheiro. Também ela, moradora há 17 anos no bairro de Santa Luzia, se sente mais insegura a cada dia que passa. A presença de carros de alta cilindrada na zona é cada vez mais visível. Há gente a rondar, muitas vezes em grupos, a fazer perguntas, A espalhar ameaças. A sua casa já foi assaltada. Há dias, também uma vizinha teve os vidros da marquise partidos. A., relata o companheiro, foi bem recebida na polícia quando foi entregar a queixa. Mas ficou a saber que as autoridades tinham as mãos atadas. “Diz que só pode actuar em flagrante delito”, apontou. Na Domus Social, onde pediu para mudar de bairro, o trabalhador parecia não falar “a mesma língua”. Mas Fernando Paulo dava a garantia: a mudança já está aprovada, faltando apenas definir o destino.
“Sinto-me insegura, ando apavorada. Durmo na casa da minha mãe”, comentou a moradora. “Isto não é viver.” A insegurança, sacudiu o vereador, é responsabilidade das forças policiais. Mas o companheiro de A. não gostou da explicação e o diálogo prosseguiu: “Não lemos livros de banda desenhada. Nós, cidadãos, temos o cuidado de pegar em livros e de falar com as pessoas que entendem. A polícia disse claramente que não podia fazer nada enquanto as pessoas não forem encontradas em [flagrante] delito”, argumentou. E Fernando Paulo voltou a contestar em jeito de finalização: “Se a policia não pode [fazer nada], o pelouro da habitação não pode com toda a certeza”.