OMS alerta para falta de planos de saúde para migrantes e refugiados na Europa

A Organização Mundial de Saúde divulgou primeiro relatório produzido pela Região Europeia sobre a saúde dos refugiados e migrantes. Alerta para a importância da vacinação, sobretudo das crianças, e da necessidade dos profissionais de saúde conhecerem os riscos desta população.

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Rui Gaudêncio

Pelo menos oito países da Região Europeia da Organização Mundial de Saúde não têm planos para refugiados e migrantes nos seus sistemas de saúde, apesar de esta população ultrapassar os 90 milhões de pessoas na região.

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Pelo menos oito países da Região Europeia da Organização Mundial de Saúde não têm planos para refugiados e migrantes nos seus sistemas de saúde, apesar de esta população ultrapassar os 90 milhões de pessoas na região.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) divulgou nesta segunda-feira o seu primeiro relatório produzido pela Região Europeia, que agrega 53 estados, sobre a saúde dos refugiados e migrantes. Nele, sublinha-se a falta de dados específicos e de planos de saúde para uma população que representa 10% do total destes países.

O relatório baseia-se em dados de estudos recentes publicados em inglês e russo. Foram consultados mais de 13 mil documentos.

Embora não identifique os países sem planos para estas populações, a OMS sublinha que a existência de franjas da população com menor acesso a cuidados de saúde pode ter repercussões negativas na saúde pública. Diagnósticos atempados, não só salvam vidas, como reduzem os custos com tratamentos em fases posteriores. Além disso o Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais definiu, em 1966, que o direito à saúde é um direito humano básico, independentemente da situação de migração.

Necessidade de vacinação

Embora o contexto de cada país de origem, a duração da migração e as condições socioeconómicas tenham muito a dizer nesta equação, a literatura consultada pela OMS mostra que, de forma geral, as estimativas de mortalidade tendem a ser mais baixas nos refugiados e migrantes do que na população europeia para todas as causas de mortalidade, neoplasias, condições mentais e comportamentais, lesões, distúrbios endócrinos e condições digestivas, mas mais altas para doenças infecciosas, do sangue, dos órgãos produtores de sangue e cardiovasculares, assim como causas externas.

As infecções (bacterianas, virais e parasitárias) não surgem nesta lista como uma surpresa, uma vez que os sistemas de saúde precários de muitos dos países de origem e a convivência com saneamento deficiente e água contaminada antes ou durante a viagem aumenta potencialmente o risco de contrair este tipo de doenças. Como algumas são evitáveis com vacinação, a OMS considera fundamental que estes migrantes “recebam protecção” – para a tuberculose, HIV, hepatites, por exemplo – e que os profissionais de saúde na linha de frente entendam os riscos desta população.

As crianças são o grupo de maior risco, porque o processo de migração pode interromper o seu plano de vacinação. Uma cobertura vacinal insuficiente pode levar a surtos de doenças. “A linguagem, as barreiras informativas, culturais e económicas, além de factores como o direito legal de permanecer numa determinada região, podem influenciar a vulnerabilidade dos refugiados e migrantes a doenças evitáveis por vacinação”, nota a OMS. No entanto, apenas alguns países europeus têm um programa nacional de vacinação que considera refugiados e migrantes. Portugal é um deles. 

As doenças não contagiosas são, no entanto, as que mais contribuem para o total de doenças na Região Europeia da OMS.

A falta de informação sobre estas doenças na população migrante impossibilita chegar a conclusões muito específicas, mas alguns dados apontam para uma prevalência menor de muitas doenças não contagiosas quando as pessoas chegam ao país de destino, que depois tende a nivelar. Isto acontece sobretudo com a obesidade e aumenta com o tempo de estada no país de destino.

Doenças como diabetes, cardiovasculares ou cancro têm igualmente informação incompleta e apenas se constata que a diabetes parece ser mais comum entre esta população móvel e surgir numa idade mais precoce. As doenças cardiovasculares dependem da etnia e contexto socioeconómico e o cancro é, normalmente, diagnosticado numa fase mais avançada.

No que concerne a saúde mental, parece haver mais prevalência de stress pós-traumático, depressão e ansiedade na população refugiada e migrante do que na dos países que a acolhem, diz a OMS. E na saúde maternal, o risco de problemas e até de mortalidade é maior na população móvel.

Relativamente à saúde sexual, os dados mostram conclusões contraditórias, mas a mutilação sexual feminina está a tornar-se um tópico cada vez mais importante para os profissionais de saúde, já que têm sido encontrados mais casos, tanto de mulheres excisadas nos seus países de origem como já na Região Europeia.

Saúde universal

A OMS sublinha ainda que a maioria dos serviços de apoio se dirigem unicamente a vítimas femininas de violência sexual, habitualmente em clínicas de saúde reprodutiva e maternal, mas tanto adultos como crianças são, muitas vezes, vítimas de violência sexual grave durante a viagem ou na chegada à Europa.

Por isso, recomenda aos países que tornem os serviços de saúde universais para acolherem também refugiados e migrantes mesmo indocumentados e que, a par do apoio médico, seja feito um apoio social, já que muitas destas pessoas desconhecem os sistemas de saúde do país onde estão.

Por outro lado, pede que a avaliação feita nas fronteiras não inclua apenas doenças contagiosas, e que essa avaliação seja acompanhada de um tratamento e acompanhamento com atenção às diferenças étnicas e à confidencialidade.