Conselho nacional do PSD já depôs líderes

Em momentos-chave, o conselho nacional do PSD é o palco de todos os confrontos internos. Por lá passaram as demissões de dois líderes: Balsemão e Mota Pinto.

Fotogaleria

O conselho nacional (CN) do PSD é provavelmente o órgão partidário português em que é mais imprevisível o desfecho de um confronto interno. Tanto que os debates entre tendências no seio deste órgão máximo de direcção do PSD entre congressos já levaram à subsequente demissão de dois líderes que representavam o partido em governos de coligação: o primeiro-ministro da Aliança Democrática, Francisco Pinto Balsemão; e o vice-primeiro-ministro do Bloco Central, Carlos Mota Pinto.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O conselho nacional (CN) do PSD é provavelmente o órgão partidário português em que é mais imprevisível o desfecho de um confronto interno. Tanto que os debates entre tendências no seio deste órgão máximo de direcção do PSD entre congressos já levaram à subsequente demissão de dois líderes que representavam o partido em governos de coligação: o primeiro-ministro da Aliança Democrática, Francisco Pinto Balsemão; e o vice-primeiro-ministro do Bloco Central, Carlos Mota Pinto.

A 2 e 3 de Fevereiro de 1985, reúne-se na Junta de Freguesia do Bonfim, no Porto, o CN em que Mota Pinto decide demitir-se, apesar de até ter ganho a moção de confiança à sua liderança, então apresentada por Barbosa de Melo. Em cima da mesa, nessa reunião, estava formalmente a aprovação do referendo interno a pedido do CN ou por 2500 militantes (aprovado no primeiro dia) e a convocação de um congresso para decidir o candidato às presidenciais.

Mota Pinto chega ao Bonfim desgastado pelas críticas internas da Nova Esperança, grupo que, no ano anterior, apresentara ao XI Congresso, em Braga, o documento Uma alternativa para o PSD – Uma Nova Esperança para Portugal e que era formado por Marcelo Rebelo de Sousa, José Miguel Júdice, Pedro Santana Lopes, Conceição Monteiro, Durão Barroso e Morais Sarmento.

Logo no primeiro dia, Marcelo anuncia que vai apresentar uma moção de censura à política económica e financeira do Governo. O líder da tendência social-cristã, João Salgueiro, declara apoio à moção da Nova Esperança e pede o voto secreto. Os dados estão lançados, as intervenções sucedem-se e o clima aquece. Até que o jovem então praticamente desconhecido e ligado à Nova Esperança Rui Gomes da Silva questiona o secretário-geral, Antunes da Silva, sobre a gestão financeira da direcção e pergunta pelo destino do dinheiro do partido.

A conversar com o conselheiro ao seu lado na mesa da direcção, Mota Pinto nem ouve Gomes da Silva. Até que a sua mulher, Fernanda Mota Pinto, lhe chama a atenção através de um bilhete, relata João Pedro George em Mota Pinto, Biografia. O líder dá um murro na mesa, levanta-se e grita para Leonardo Ribeiro de Almeida, presidente do CN: “Calúnias não, senhor presidente! Calúnias não!” E sai porta fora.

Acaba por voltar no dia seguinte por insistência de Barbosa de Melo que será o primeiro subscritor de uma moção de confiança assinada por mais 47 conselheiros. Discursa ao CN, pede uma maioria clara e abandona a sala em direcção à sua casa em Coimbra. Na votação secreta surgem 38 votos a favor, 36 contra e uma abstenção. A moção de censura de Marcelo nem chega a ser votada, mas a vitória de Mota Pinto era tudo menos clara e nem sequer perfazia os 47 conselheiros que tinham assinado a moção de confiança.

A 5 de Fevereiro, Mota Pinto dirige-se à sede do PSD, na Rua Buenos Aires, onde é recebido por cerca de cem autarcas do partido que o aclamam. Nada diz, sobe à sala da comissão política e formaliza a demissão que decidira no CN. Substituído provisoriamente no Governo pelo seu "vice" que lhe queria o lugar, Rui Machete, Mota Pinto virá a falecer a 7 de Maio. No Congresso da Figueira da Foz, que decorre entre 17 e 19 de Maio, Salgueiro entra como putativo presidente do PSD. Cavaco Silva sai como líder, aglutinando apoios da Nova Esperança (Santana foi o primeiro a subir ao palco para defender a sua eleição), de várias distritais e também dos mota-pintistas, através de Fernando Nogueira, o herdeiro político de Mota Pinto.

Resistir até cair

Cavaco Silva está igualmente associado a uma demissão anterior que também passou pelo CN, a do primeiro-ministro Pinto Balsemão. Formalmente, a acção de ataque ao poder do líder começa a 11 de Julho de 1981. A assembleia distrital da área metropolitana de Lisboa, presidida por Cavaco Silva, aprova uma moção contra a liderança “cinzenta e frouxa” de Balsemão, como relata Joaquim Vieira na biografia Francisco Pinto Balsemão.

No CN de 23 de Junho, preparando-se para resistir, Balsemão segura o poder partidário e Helena Roseta, presidente da comissão política de Lisboa, demite-se. Está aberto o caminho ao grupo de dirigentes de Lisboa que mais tarde, em parte, formarão a Nova Esperança.

A tensão não pára e a 8 e 9 de Agosto de 1981, no CN do Hotel Penta, em Lisboa, é votada a permanência de Balsemão à frente do partido. A vitória do então primeiro-ministro é frágil. A moção a seu favor obtém 37 votos a favor, 15 contra e duas abstenções. Logo no CN, Helena Roseta avança com o nome de Cavaco Silva para líder. O próprio rejeita então assumir o poder que construirá, passo a passo, até à Figueira da Foz. Balsemão anuncia que se demite e, no dia seguinte, entrega o mandato de primeiro-ministro ao Presidente da República, Ramalho Eanes. A 25 de Agosto, Eanes volta a indigitar Balsemão, que toma posse a 4 de Setembro.

O grupo dos críticos liderados pelo histórico Eurico de Melo, conhecido como "o vice-rei do Norte", e por Cavaco Silva, ex-ministro das Finanças de Sá Carneiro, não desarma e elege um terço do CN no IX Congresso do PSD, que se reúne no Teatro Rivoli, no Porto, a 5 e 6 de Dezembro de 1981. Balsemão remodela o Governo em Junho de 1982 e Marcelo sai de secretário de Estado da Presidência. O primeiro-ministro tenta manter os equilíbrios com Lisboa, mas o presidente da distrital que substituiu Helena Roseta, Pedro Santana Lopes, recusa integrar o Governo.

A tensão rebenta publicamente quando, a 8 de Julho, Eurico e Cavaco publicam nos jornais uma carta aberta aos militantes pedindo a demissão de Balsemão. A 17 de Julho, de novo em CN, Balsemão volta a resistir, mas fica cada vez mais fragilizado. Nas legislativas de 12 de Dezembro 1982, a Aliança Democrática (AD) desce para 42,5 %. O líder do CDS, Freitas do Amaral, anuncia a sua demissão. É o fim da AD e do poder de Balsemão. A 29 de Dezembro, o CN do PSD ratifica, sem votos contra e com cinco nulos, Vítor Crespo como sucessor do primeiro-ministro. A 23 de Janeiro, Eanes diz que não aceita novo Governo e marca eleições.