Aguiar-Branco e o PSD: “Não me revejo na estratégia que o partido tem seguido”
O ex-ministro social-democrata considera que “o interesse nacional” reclama a “afirmação de uma alternativa”, que diz não existir, ao Governo de Costa e que, por isso, se “justifica o desafio que Luís Montenegro lançou”.
As palavras do ex-ministro da Justiça e da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, não deixam margem para dúvidas quanto à avaliação que faz da liderança de Rui Rio no PSD: “Não me revejo na estratégia que o partido tem seguido até agora.” Por isso, o social-democrata vê com bons olhos o avanço de Luís Montenegro para chegar à liderança: “acho que esta situação justifica o desafio que Luís Montenegro lançou”. E anuncia que renuncia ao mandato de deputado.
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As palavras do ex-ministro da Justiça e da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, não deixam margem para dúvidas quanto à avaliação que faz da liderança de Rui Rio no PSD: “Não me revejo na estratégia que o partido tem seguido até agora.” Por isso, o social-democrata vê com bons olhos o avanço de Luís Montenegro para chegar à liderança: “acho que esta situação justifica o desafio que Luís Montenegro lançou”. E anuncia que renuncia ao mandato de deputado.
“É importante para o país que haja a afirmação clara e inequívoca de uma alternativa ao PS e ao actual Governo, e a minha divergência de estratégia política é porque hoje verifico que essa alternativa não é visível nem é reconhecida pelos portugueses. O PSD não pode ter como objectivo central os acordos de regime com o PS, como parece ser, isto não faz sentido”, começa por dizer o ex-governante na entrevista que dá ao Expresso nesta quarta-feira.
No mesmo sentido, acrescenta ainda: “Como pessoa atenta ao que se passa no país, acho que é o interesse nacional que reclama que haja uma alternativa clara e inequívoca a esta governação, e que o presidente do PSD seja uma alternativa clara e inequívoca a António Costa. Por tudo isto não me revejo na estratégia que o partido tem seguido até agora.”
Na entrevista, o social-democrata, que disputou as autárquicas de 2005 ao lado de Rio, tendo sido eleito presidente da Assembleia Municipal do Porto quando o actual líder do PSD era presidente da câmara, explica também que renuncia ao mandato de deputado e por que razão o faz: “Já há várias semanas que eu tinha tomado uma decisão de fundo para a renúncia ao meu cargo de deputado. Há uma tendência geral, desde há algum tempo, para afastar pessoas que não sejam profissionais da política, que não dependam de política e tenham uma vida profissional activa”, lamenta, falando numa “tendência para a funcionalização, mesmo em cargos que resultam de actos eleitorais, como é o cargo de deputado”.
Depois das críticas a Rui Rio, vem o apoio ao desafio lançado por Luís Montenegro, que assume querer candidatar-se à liderança do PSD e defende a marcação de eleições directas: “Achando eu que é o interesse nacional que reclama essa afirmação de uma alternativa, acho que esta situação justifica o desafio que Luís Montenegro lançou. Repare que sempre que o PSD foi vitorioso em eleições foi quando se afirmou de forma inequívoca como alternativa ao PS”, começa por dizer, recordando outros momentos da história do partido. “Foi assim com Sá Carneiro, quando constituiu a primeira Aliança Democrática, foi assim com Cavaco Silva quando se mostrou contrário ao Bloco Central e foi assim também com as maiorias que aconteceram com Durão Barroso e Passos Coelho. Esse reconhecimento de uma alternativa não existe neste momento e é isso que permite compreender o desafio que foi feito por Luís Montenegro”, afirma.
Aguiar Branco considera, assim, fazer “sentido o desafio” e não vê “problema de timing para se abrir um processo nesse sentido”. Para o antigo ministro, “o mais importante é a afirmação do PSD como alternativa, essa é a prioridade para que no acto eleitoral os portugueses possam ter escolhas claras”: “E como tem sido dito, a história do PSD mostra que nunca estas questões de timing, de estar mais ou menos próximo de eleições, impediram que o PSD se afirmasse como alternativa. Bem pelo contrário. Até acredito que estes momentos de clarificação e de discussão fortalecem o partido. Não foram poucas as vezes em que isso aconteceu no passado.”
E volta a recordar o passado do PSD: “Lembro-me quando Marcelo Rebelo de Sousa era presidente do PSD e a escassos meses de umas eleições europeias houve um problema de substituição de liderança do partido. Durão Barroso indicou, como líder indigitado do partido, os candidatos do PSD e passados uns meses Durão Barroso foi primeiro-ministro”, afirma, acrescentando haver “uma idiossincrasia própria do PSD” e insistindo que “a história do partido mostra que estes são momentos que fortalecem a sua dinâmica”.
Renunciar a cargo de deputado
Sobre a polémica instalada em redor da forma como se deve proceder a votação da moção de confiança no conselho nacional, Aguiar-Branco defende o voto secreto, em vez do braço no ar: “Eu não domino muito as questões regimentais, mas acho que tudo aquilo que permita uma expressão inequívoca e sem qualquer espécie de suspeita é positivo. É um facto que uma votação secreta é muito mais correcta para questões desta natureza. Eu, se fosse presidente do partido, era essa que seguiria.”
Aguiar-Branco critica, ainda, a hora para que foi marcado o conselho nacional do PSD: “Só o PCP é que tinha esta lógica, todos os outros partidos, incluindo o meu, privilegiavam quem tivesse actividade profissional e não dependesse da política, mas hoje há a tendência contrária. A hora para que foi marcado o conselho nacional do PSD, numa quinta-feira às 17h, é um bom exemplo dessa funcionalização com que eu não estou de acordo.”
O ex-ministro entende que tal “não é um problema só para os deputados, é para todos os militantes que têm uma vida profissional activa”: “Esta marcação de um conselho nacional para uma quinta-feira às 17h no Porto é um bom exemplo dessa profissionalização, essa funcionalização, que tem de dar prioridade ao exercício da actividade política, e não a outra. Isto é um bom exemplo do que não devia acontecer.”
Assim, garante que já tinha uma “tomada de posição consolidada” de que terminaria o “ciclo de vida parlamentar”. Explica que vai “renunciar” ao cargo, que “até ao final deste mês” deixará de ser deputado e, “como é óbvio”, não será candidato a deputado nas próximas eleições legislativas. “Isto deixa claro também uma certa hipocrisia que tem aí grassado à volta das posições que os militantes tomam a propósito de questões de natureza política, como espero que seja entendida a minha posição”, nota, deixando também bem claro que a divergência em relação a Rui Rio não acontece por estar agarrado ao lugar de deputado.
Questionado sobre a justificação da actual direcção do PSD de que há instabilidade e ruído interno para passar a mensagem e apresentar uma alternativa, Aguiar-Branco responde com mais críticas: “Em toda a minha vida, seja profissional ou política, nunca imputei os meus êxitos ou inêxitos a terceiros. Acho sempre que reside em mim a capacidade ou incapacidade de ultrapassar os vários obstáculos. Portanto, a primeira responsabilidade de qualquer pessoa que seja um decisor ou que esteja numa situação de chefia, reside no próprio.” Conclusão, diz: “Se estamos a viver hoje a situação que estamos a viver é porque essa afirmação de uma alternativa clara e inequívoca ao PS não aconteceu.”
E o que faria Sá Carneiro perante esta crise? “Acho que Sá Carneiro seria seguramente – e a história demonstra-o – a favor de uma clarificação, de uma discussão interna que fortalecesse o partido numa situação como esta.” Aguiar-Branco elogia os talentos políticos do antigo primeiro-ministro e líder do PSD, que morreu no desastre aéreo de Camarate: “Ele nunca se escudou em questões de natureza formal, pelo contrário. E foi sempre pelo faro político, pelo sentido de oportunidade e pelo que pudesse ajudar o país. E o melhor para o país hoje é que o PSD seja reconhecido como uma alternativa inequívoca, com propostas claras que o afastem do PS, desta governação e da acção de António Costa.”