Política em 2018: saídas de cena com regressos mais ou menos anunciados
Em 2018, vários políticos colocaram a actividade partidária em segundo plano na sua vida. Alguns, repetindo o que já haviam feito antes, outros estreando-se na travessia do deserto.
Depois de o CDS ter passado de terceira para quarta força política nas eleições de 2005, com 7,3% dos votos, Paulo Portas deixou a liderança do partido que até então liderava quase em lágrimas. "Acho que terminou o ciclo político em que presidi ao CDS/PP durante sete anos", afirmou.
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Depois de o CDS ter passado de terceira para quarta força política nas eleições de 2005, com 7,3% dos votos, Paulo Portas deixou a liderança do partido que até então liderava quase em lágrimas. "Acho que terminou o ciclo político em que presidi ao CDS/PP durante sete anos", afirmou.
"Nunca estive agarrado ao poder e não quero por um segundo que algum português possa pensar isso", acrescentou, numa declaração emotiva. Estávamos em Fevereiro de 2005. Dois anos de cinco meses depois, após uma travessia no deserto em que o partido ficou nas mãos de José Ribeiro e Castro, Portas regressou.
Este ano, Pedro Passos Coelho, Luís Montenegro, Miguel Tiago, Jorge Seguro Sanches, Adalberto Campos Fernandes ou Ricardo Robles, entre outros, saíram de cena por razões diversas e poucos assumem que o afastamento é temporário. Estará, algum deles, a preparar um regresso à Portas?
Passos tem (a sua) história por contar
O ex-primeiro-ministro retirou-se da vida política activa em Fevereiro de 2018 e tem cumprido um rigoroso silêncio que só foi quebrado para se manifestar contra a despenalização da eutanásia e a favor da recondução de Joana Marques Vidal como Procuradora-Geral da República. Pedro Passos Coelho já disse que não pretende voltar após as legislativas de 2019, apesar de muitos sociais-democratas suspirarem por si e de vários antigos dirigentes ou colaboradores próximos o apontarem como o líder capaz de reunir a direita.
Não é a primeira vez que Passos sai de cena. Depois de ter sido líder da JSD, ainda se manteve como deputado até 1999 e como vereador na Amadora até 2001, tendo-se depois afastado durante sete anos. Regressou em 2008 para ser derrotado por Manuela Ferreira Leite na candidatura à liderança do PSD.
Agora, já há quem veja as presidenciais de 2021 como um cenário para um possível regresso de Passos Coelho (caso Marcelo Rebelo de Sousa decida não se recandidatar a um segundo mandato). Nesse cenário, o ex-líder do PSD não poderá adiar por muito tempo o seu regresso à vida política activa.
Em 2019, é certo que Passos Coelho será notícia pela apresentação do seu livro sobre o período em que governou e Portugal esteve sob o programa da troika. Esse livro promete ser uma resposta ao segundo volume de memórias de Cavaco Silva, Presidente da República durante o mesmo período, em que mostrou haver discordâncias com o então primeiro-ministro sobre certas medidas de austeridade adoptadas.
Passos Coelho prometeu que terá “muito para dizer e juntar” sobre esse período de tempo. A social-democrata Teresa Leal Coelho, muito próxima do ex-líder do PSD, disse, numa recente entrevista ao Diário de Notícias, que “se um dia” Passos Coelho entender que tem condições para voltar o “partido e o país” recebem-no de “braços abertos”. Resta saber se 2019 será esse ano.
Montenegro, o regresso anunciado
O ex-líder da bancada parlamentar do PSD deixou de ser deputado em Abril deste ano, depois de ter marcado terreno para um futuro regresso à cúpula do partido em Fevereiro, no congresso de consagração de Rui Rio. Saiu do Parlamento mas não saiu de cena. Tem os seus espaços mediáticos próprios em que faz pontualmente reparos à actual direcção social-democrata e critica regularmente a política do Governo, como se fosse líder da oposição e aproveitando o facto de Rui Rio ter optado por uma estratégia menos confrontacional contra o primeiro-ministro.
Luís Montenegro não deixa, assim, de estar visível para preparar o caminho quando surgir a oportunidade de assumir a liderança do PSD. No actual contexto, os mais próximos – e até o próprio – apontam para que essa oportunidade surja após as legislativas de 2019, tendo em conta o que consideram ser o descontentamento com a direcção de Rio e as sondagens do partido.
A hipótese de Luís Montenegro voltar a ser protagonista no PSD após as europeias de Maio, após eventuais maus resultados, “é difícil” como já assumiu o próprio, já que decorre pouco tempo para o acto eleitoral seguinte, ao qual poderia apresentar-se como candidato a primeiro-ministro.
Depois de Maio ou depois de Outubro de 2019 Montenegro já deixou uma certeza: se algum dia avançar não vai pedir “licença a ninguém”.
Robles, o primeiro problema do BE
Ricardo Robles era, no Bloco de Esquerda, uma jovem promessa com muito caminho pela frente. Eleito, há menos de um ano, para a Câmara de Lisboa, já tinha dado corpo a um acordo com Fernando Medina que garantiu a entrada do Bloco para o executivo municipal quando foi apanhado num caso difícil.
No final de Julho, o então vereador bloquista pôs à venda imóvel em Alfama com valorização de 4,7 milhões - o prédio havia sido comprado em 2017 por 347 mil euros e foram gastos mais 650 mil euros em projectos, licenças e obras de requalificação antes de ser vendido por 5.7 milhões. O lucro, considerado excessivo para alguém que que vinha criticando a "especulação imobiliária", resultou na sua demissão.
O PÚBLICO desafiou Ricardo Robles a conversar sobre os seus últimos meses, e sobre um eventual regresso à política, mas o bloquista não aceitou. Tem estado fora da política activa e sem perspectivas de regresso.
Miguel Tiago, uma saída em duas rodas
No PCP, Miguel Tiago escolheu as duas rodas como facilidade de transporte entre a Margem Sul que o viu crescer e o hemiciclo de São Bento. Em Setembro, na hora do adeus à bancada comunista, foi aos comandos de uma Super Ténéré que avançou ao PÚBLICO o seu futuro imediato, além de passar a integrar a comissão de actividades económicas do Comité Central.
Geólogo, muito ligado à serra da Arrábida, gostava de trabalhar em Setúbal, porventura no centro de explicações da mãe, dando matemática, físico-química, geologia e biologia. Afirmou que o Parlamento não representa o país, confessou não ter amigos entre os deputados, mas admira alguns percursos de vida dos quais se sentou ao lado.
Proclamou ser marxista-leninista e anunciou o Facebook do PCP cujos conteúdos, alertou, são os passíveis de serem tornados públicos. E foi em alta cilindrada que reivindicou a felicidade de ter estado sempre de acordo com o que teve de defender no Parlamento. Pode um comunista destacado dizer adeus a um futuro político? É um teste que faremos nos próximos tempos.
Vários governantes com experiência parlamentar também deixaram a política activa este ano, como Jorge Seguro Sanches (substituído por João Galamba na secretaria de Estado da Energia) ou Adalberto Campos Fernandes (que deixou a pasta da Saúde), sendo ainda difícil perceber o futuro que o partido lhes reserva.
* com Nuno Ribeiro e Sónia Sapage