Mais atividade física: dos desejos à ação
Mais de metade da população não reconhece as atividades do dia a dia, como subir escadas e caminhar, como atividades físicas benéficas para a saúde.
Numa altura em que a maioria da população começa a preparar a festa de passagem de ano, incluindo toda a espécie de rituais de balanço do ano que passou e desejos para o próximo, também a agenda da promoção da atividade física (AF) a nível populacional poderia entrar em balanço, uma vez que muitas das metas que se estabelecem, nacional e internacionalmente, continuam a ficar longe da concretização plena. A este propósito, os números falam por si, revelando que 79% da população adulta portuguesa refere nunca ou raramente praticar AF. Assim, muito há ainda a fazer na área da literacia a este nível. O barómetro nacional da AF de 2018 indica que 95,5% da nossa população adulta não conhece as recomendações da Organização Mundial de Saúde para a promoção da AF (i.e. acumular, pelo menos, 150 minutos por semana de AF aeróbia de intensidade moderada), e mais de metade da população não reconhece as atividades do dia a dia, como subir escadas e caminhar, como atividades físicas benéficas para a saúde. A outro nível, da população que teve uma consulta médica nos últimos dois anos, 62% refere ter sido questionada acerca da sua AF, e 42% indica ter sido aconselhado a aumentá-la.
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Numa altura em que a maioria da população começa a preparar a festa de passagem de ano, incluindo toda a espécie de rituais de balanço do ano que passou e desejos para o próximo, também a agenda da promoção da atividade física (AF) a nível populacional poderia entrar em balanço, uma vez que muitas das metas que se estabelecem, nacional e internacionalmente, continuam a ficar longe da concretização plena. A este propósito, os números falam por si, revelando que 79% da população adulta portuguesa refere nunca ou raramente praticar AF. Assim, muito há ainda a fazer na área da literacia a este nível. O barómetro nacional da AF de 2018 indica que 95,5% da nossa população adulta não conhece as recomendações da Organização Mundial de Saúde para a promoção da AF (i.e. acumular, pelo menos, 150 minutos por semana de AF aeróbia de intensidade moderada), e mais de metade da população não reconhece as atividades do dia a dia, como subir escadas e caminhar, como atividades físicas benéficas para a saúde. A outro nível, da população que teve uma consulta médica nos últimos dois anos, 62% refere ter sido questionada acerca da sua AF, e 42% indica ter sido aconselhado a aumentá-la.
Este último número é particularmente relevante: como justificar que menos de metade das pessoas que tiveram consulta médica referiu ter recebido aconselhamento para promoção de AF? Pode dar-se o caso de, efetivamente, ter sido feito tal aconselhamento e a pessoa não o recordar, não obstante, tal implicará uma ineficácia do mesmo, o que nos leva à segunda potencial razão, a necessidade de ferramentas e formação que facilitem e suportem tal aconselhamento, de forma eficaz e adequada ao tempo de consulta.
Depois de, no último ano, terem sido implementadas nos sistemas informáticos de apoio às consultas no Serviço Nacional de Saúde (cuidados de saúde primários e cuidados hospitalares) várias ferramentas de apoio à avaliação do nível de AF e consequente aconselhamento à sua promoção, foram também desenvolvidos manuais de apoio à sua dinamização e ações de formação, a implementar no próximo ano. Por último, como forma de dar resposta aos profissionais de saúde sem acesso aos referidos sistemas informáticos, e no sentido de disseminar e encorajar ao máximo o uso das ferramentas de suporte à promoção da AF (quer pelos profissionais, quer diretamente por toda a população interessada), foi criado um pacote de livre disseminação, disponível no microsite do Programa Nacional de Promoção da Atividade Física da Direção-Geral da Saúde. Também no mesmo local se podem encontrar infografias com as recomendações de atividade física para diferentes grupos específicos.
Retomando o mote inicial, a tradução dos desejos em ação falha muitas vezes por falta de estratégias autorregulatórias de avaliação e implementação, seja a nível macro (das políticas, instituições e projetos), seja a nível micro (da alteração comportamental individual). Ora, este conjunto de ferramentas pretende exatamente facilitar o exercício de tais competências a nível individual, não só por oferecer modelos de avaliação com base nos quais planear ações compatíveis, como propor estratégias práticas de facilitação da aplicação de técnicas de modificação comportamental, cientificamente validadas. A este propósito, a evidência sublinha os fatores otimizadores do aconselhamento breve para a ativação da mudança comportamental em AF: i) a necessidade de se partir de uma avaliação, não só do comportamento (nível de AF), mas da prontidão, preferências e barreiras do utente; ii) a importância do uso de múltiplas estratégias e ferramentas de mudança comportamental cientificamente validadas (p.ex. estabelecimento de objetivos e planos de ação, planos de gestão de barreiras, foco em motivações internas vs.pressões externas, etc.); iii) a necessidade de formação e de adequados recursos de suporte para tal aconselhamento, permitindo o aumento da qualidade do serviço prestado, a par da diminuição do tempo e esforço envolvidos.
O conjunto de ferramentas disponibilizadas pretende facilitar o aconselhamento para a promoção da AF em adultos (incluindo os idosos). Inclui instrumentos baseados em sólida evidência científica que podem ser disponibilizados ao utente, sem consumir tempo vital de consulta, uma vez que os instrumentos em causa foram desenvolvidos para serem autoexplicativos e, mesmo na ausência de aprofundado enquadramento durante a consulta, poderem ser explorados e experimentados livremente, em autonomia.
De forma muito sumária, este conjunto de ferramentas inclui um breve “guia para a atividade física”, procurando aumentar a literacia base a este nível (i.e. recomendações gerais para o aumento dos níveis de AF e redução do comportamento sedentário), servindo, ainda, a identificação individualizada dos benefícios da prática que são mais importantes para a pessoa. De forma consentânea com princípios motivacionais validados, outra das ferramentas pretende funcionar como um “auxiliar de decisão” para pessoas mais resistentes à ideia de se tornarem fisicamente mais ativas, ajudando na identificação de razões pessoalmente relevantes, mapeando também barreiras e fatores facilitadores. Com base nestes, e depois de garantir que há interesse pessoal, será importante assistir o processo de implementação prática. O uso do “plano de ação” pretende facilitar o traçar de objetivos realistas, desafiantes e mensuráveis, bem como o definir de uma estratégia de implementação, algo que a evidência científica tem mostrado como fundamental em processos de mudança comportamental. Por último, e no sentido de apoiar também todos aqueles para quem a prática regular de AF é já uma realidade, foi também desenvolvido um instrumento específico, servindo o traçar de um “plano de manutenção”, com algumas sugestões e estratégias para que o interesse pela prática possa ser mantido.
Como em tudo o resto, experimentar será o primeiro passo. Neste caso, experimentar aconselhar de forma diferente, baseada na evidência, com recurso a ferramentas desenvolvidas em linha com recomendações internacionais para o efeito. Manuais mais aprofundados e programas de formação específicos serão o próximo passo, disponíveis já no primeiro trimestre de 2019. Vamos passar os nossos desejos à ação!
Os autores seguem o novo acordo ortográfico