Como se detecta um nariz de Pinóquio através da termografia
Modelo de termografia para detectar mentiras foi aprimorado por cientistas em Espanha. Verificou-se que é 10% mais rigoroso do que o polígrafo.
Todos conhecemos as (des)aventuras de Pinóquio, o boneco de madeira que quando mente vê o seu nariz crescer. A história originalmente escrita pelo italiano Carlo Collodi não é assim tão disparatada. Através da utilização da termografia, têm vindo a observar-se que, quando uma pessoa mente, o seu nariz – embora não cresça – muda de temperatura. Uma equipa de investigadores de Espanha voltou a testar o designado “efeito Pinóquio” em laboratório e concluiu que a mentira faz com que a temperatura do nariz desça entre 0,6 e 1,2 graus Celsius.
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Todos conhecemos as (des)aventuras de Pinóquio, o boneco de madeira que quando mente vê o seu nariz crescer. A história originalmente escrita pelo italiano Carlo Collodi não é assim tão disparatada. Através da utilização da termografia, têm vindo a observar-se que, quando uma pessoa mente, o seu nariz – embora não cresça – muda de temperatura. Uma equipa de investigadores de Espanha voltou a testar o designado “efeito Pinóquio” em laboratório e concluiu que a mentira faz com que a temperatura do nariz desça entre 0,6 e 1,2 graus Celsius.
A termografia é uma técnica que se baseia na temperatura corporal e foi criada durante a Segunda Guerra Mundial para detectar o inimigo. Costuma aplicar-se na indústria, na construção de edifícios ou na medicina. Ao longo do tempo, a termografia também tem sido aplicada na psicologia.
Por volta de 2002, começou a aplicar-se na detecção de mentiras, diz-nos Emilio Gómez Milán, da Universidade de Granada (Espanha) e um dos autores de um estudo sobre o tema na revista Journal of Investigative Psychology and Offender Profiling. “Contudo, [o filósofo e psicólogo] William James nos seus Princípios da Psicologia mencionou experiências mentais sobre a termografia em 1890”, acrescenta.
Actualmente, além da equipa de Emilio Gómez Milán, há grupos de cientistas na Itália e nos Estados Unidos que procuram detectar mentiras através da termografia, mas com teorias diferentes e centradas em regiões da pele distintas.
Relativamente à equipa espanhola, ficámos a conhecer os resultados dos seus estudos em termografia em 2012. Alejandro Moliné apresentava então uma tese de doutoramento, supervisionada por Emilio Gómez Milán, que referia que quando fazíamos um grande esforço mental, a temperatura do nariz descia. Mas quando temos um ataque de ansiedade, a temperatura da nossa cara tendia a aumentar. Portanto, a temperatura da ponta do nariz e da zona do músculo orbital sobe ou a desce consoante o nosso estado de espírito.
E quando mentimos, o que acontece exactamente? “Quando planeamos uma mentira, frequentemente a temperatura da cara aumenta. Mas durante a execução da mentira, a extremidade do nariz fica com uma temperatura mais baixa e a testa com uma temperatura mais elevada.”
Agora, a equipa desenvolveu o mesmo modelo com algumas melhorias a nível da precisão. Para se usar este sistema (ainda em laboratório), é necessária uma câmara térmica de alta resolução e um programa informático. Desta forma, os cientistas vão detectar as mudanças da temperatura da pele através de radiação infravermelha (que não é visível).
Durante a investigação, foram feitas quatro experiências com 60 estudantes de psicologia sobre os marcadores térmicos do medo, da ansiedade ou da mentira.
Centremo-nos nesta última experiência. Numa das tarefas, o grupo experimental tinha de fazer uma chamada telefónica de três ou quatro minutos para uma pessoa próxima e de contar uma mentira. Por exemplo, os participantes disseram que tinham visto uma celebridade ou que viram um acidente de carro.
Já os participantes do grupo de controlo fizeram um telefonema em que descreviam a outra pessoa aquilo que estavam a ver no ecrã de um computador, ou seja, não mentiram. Por exemplo, contaram que estavam a ver um acidente rodoviário.
“Em ambos os casos, as circunstâncias fizeram os participantes sentir-se ansiosos, mas o grupo experimental vivenciou o chamado ‘efeito de Pinóquio’ no nariz e o efeito do esforço mental na testa, o que permitiu monitorizar a mentira”, explica Emilio Gómez Milán num comunicado da Universidade de Granada.
Aeroportos e campos de refugiados
Durante as experiências, observou-se o que acontecia com a temperatura do nariz e da testa enquanto os indivíduos estavam a mentir. “Quando mentimos, a temperatura da extremidade do nariz desce entre 0,6 e 1,2 graus Celsius, enquanto a da testa sobe entre 0,6 e 1,5 graus. Quanto maior for a diferença na temperatura entre as regiões faciais, maior será a probabilidade de a pessoa estar a mentir”, indica o investigador.
Emilio Gómez Milán explica que isto acontece porque – quando alguém mente – fica-se mais ansioso e a temperatura do nariz altera-se. Além disso, como tem de se planear a mentira, a atenção concentra-se na zona da testa e a temperatura aumenta. “Como tem de se pensar a mentira, a temperatura da testa aumenta. Mas, ao mesmo tempo, sentimo-nos ansiosos, o que provoca a descida da temperatura do nariz”, frisa.
“Comparada com o polígrafo, a termografia tem uma precisão maior, menos falsos alarmes e é menos invasiva”, diz o cientista sobre as vantagens deste sistema. “Ao mesmo tempo, podemos ter em conta mais componentes: excitação elevada, esforço mental e a teoria da mente. O polígrafo apenas tem em conta a excitação elevada.” No comunicado, a equipa aponta que este sistema tem uma precisão de mais de 80% (mais 10% do que o polígrafo).
No futuro, a equipa gostaria de ver este sistema aplicado em entrevistas da polícia, nos aeroportos ou em campos de refugiados. “O ideal seria combinar ambos os métodos – a entrevista estratégica [feitas pela polícia] e a termografia –, levando o nosso sistema para esquadras da polícia, aeroportos e campos de refugiados. Desta forma, poderia ser possível detectar se um criminoso está a mentir ou saber as verdadeiras intenções das pessoas que atravessam a fronteira entre dois países”, refere Emilio Gómez Milán, acrescentando que, até lá, há um longo caminho de investigação pela frente.