O virar de página do virar de página da austeridade
Acabou o virar de página da austeridade que criou a sensação irreal de que o tempo da troika tinha sido um capricho de Passos Coelho
O Primeiro-ministro acentuou na sua mensagem de Natal o novo tom que dá cor à etapa final da sua governação. Não seria sensato esperar que um optimista convicto como António Costa olhasse para o que se passa na Europa, ou avaliasse a presente vaga de lutas laborais e caísse num discurso desolado e duvidoso. Não seria lógico acreditar que não sublinhasse as suas palavras com aquele registo de campanha eleitoral que, como bem sublinhou o Presidente da República, já se instalou no debate público. Mas há um novo ponto de equilíbrio na mensagem do Governo. O virar de página da austeridade que criou a sensação irreal de que o tempo da troika tinha sido um capricho de Passos Coelho e dos seus acólitos acabou. O país já “virou a página dos seus tempos mais difíceis”, diz Costa, mas não pode continuar a viver com a ideia de que se tornou num paraíso.
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O Primeiro-ministro acentuou na sua mensagem de Natal o novo tom que dá cor à etapa final da sua governação. Não seria sensato esperar que um optimista convicto como António Costa olhasse para o que se passa na Europa, ou avaliasse a presente vaga de lutas laborais e caísse num discurso desolado e duvidoso. Não seria lógico acreditar que não sublinhasse as suas palavras com aquele registo de campanha eleitoral que, como bem sublinhou o Presidente da República, já se instalou no debate público. Mas há um novo ponto de equilíbrio na mensagem do Governo. O virar de página da austeridade que criou a sensação irreal de que o tempo da troika tinha sido um capricho de Passos Coelho e dos seus acólitos acabou. O país já “virou a página dos seus tempos mais difíceis”, diz Costa, mas não pode continuar a viver com a ideia de que se tornou num paraíso.
O Governo sofre por estes dias uma pressão social que raramente experimentou – a não ser na sequência de tragédias. Está a ser vítima do logro que criou para si próprio. A ideia de um país desobrigado da austeridade não bate certo com a contenção nas progressões dos professores ou nos aumentos salariais inexistentes para a maioria dos funcionários públicos. Era por isso urgente fazer um recuo estratégico. E dizer que o Governo não se “ilude” com os números, que temos ainda que “continuar a melhorar”. A mensagem para os sindicatos é óbvia – qualquer cedência do Governo seria um retrocesso.
Quatro orçamentos e 1950 milhões de euros depois em despesas com salários, António Costa tem agora a dura tarefa de dizer que o seu programa de assistência aos rendimentos da função pública terá de ser congelado. Entre perder parte da função pública e desperdiçar o eleitorado moderado que lhe pode garantir uma maioria, a escolha está feita. Não implica o uso da palavra proibida (austeridade), mas obriga a um novo exercício de equilíbrio que exclui a propaganda do princípio do mandato. Tivesse havido um pouco mais de realismo nesse momento e hoje seria mais fácil aos funcionários públicos acreditar que o perigo do retrocesso está ao virar da esquina. Na situação actual, sem um surto de prosperidade que só pode nascer na economia privada, a forma de vida original do Governo está esgotada. Há que virar a página ao virar da página da austeridade.