2019: por que temos de ir além “disto”
O problema é que o futuro acaba por chegar, quer queiramos, quer não. Toda a acção política se configura como um projecto e, portanto, debruçada sobre o futuro. Dizer que em política “só há presente” é, assim, no fundo e à superfície, um tremendo disparate e um perigo incalculável.
Comecemos por um truísmo: 2019, o futuro, ainda não é. Então, o que podemos dizer sobre ele? Não temos, como António Vieira, uma chave dos profetas, e portanto, não podemos contar uma História do Futuro. Ou melhor, para que o futuro seja real tem de ser desejado. Desejado por quem? Por nós. Por nós, enquanto indivíduos e enquanto povo.
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Comecemos por um truísmo: 2019, o futuro, ainda não é. Então, o que podemos dizer sobre ele? Não temos, como António Vieira, uma chave dos profetas, e portanto, não podemos contar uma História do Futuro. Ou melhor, para que o futuro seja real tem de ser desejado. Desejado por quem? Por nós. Por nós, enquanto indivíduos e enquanto povo.
A política é uma forma indispensável de organizar o desejo colectivo de futuro de um povo. Infelizmente, a política portuguesa, dominada pelo PS e pela extrema-esquerda, esvaziou o País desse desejo de futuro. A obsessão de gerir o presente para restabelecer um poder político hegemónico sobre a sociedade portuguesa forçou os Portugueses a despedirem-se do futuro. Que os nossos “progressistas” queiram o país em guerra com o seu próprio futuro é mais do que uma simples ironia, convenhamos.
O problema é que o futuro acaba por chegar, quer queiramos, quer não. Toda a acção política se configura como um projecto e, portanto, debruçada sobre o futuro. Dizer que em política “só há presente” é, assim, no fundo e à superfície, um tremendo disparate e um perigo incalculável.
Sobre o que 2019 nos reserva apenas podemos dizer o que 2018 insinua sobre ele. Deste ponto de vista, depois da conjuntura económica internacional mais favorável dos últimos 50 anos, já temos os mercados de valores mobiliários e de mercadorias a derreter. Isso anuncia provavelmente uma viragem no ciclo económico. António Costa tudo fez para não preparar o País para isso - para quê, pensou ele enquanto se arrepiava com a ideia de “reformas estruturais”, se o governo foi salvo em 2016 dos seus próprios erros precisamente por essa aceleração da economia mundial? 2018 fez perceber que Portugal aproveitou muito pouco do desempenho da economia global. 2019 tornará esse veredicto imperdoável.
Afinal de contas, não houve convergência com a Europa, quando as coisas são bem medidas pelo EUROSTAT. Pelo contrário, divergimos, e todos os anos desde 2016 fomos descendo mais um lugar no fundo da tabela do rendimento dos países europeus. Entre os países abaixo da média europeia, todos se portaram melhor que nós excepto a desesperada Grécia.
Estou certo que Costa chamará a isto um grande sucesso. Na realidade, foi uma oportunidade histórica irrepetível imperdoavelmente desperdiçada. De resto, a economia portuguesa já desacelerou consideravelmente este ano, e continuará a abrandar para os valores da habitual estagnação socialista. Se juntarmos a isto a interrupção de 5 anos de excedentes externos, teremos a travagem na redução da nossa gigantesca dívida externa. Além disso, a poupança atingirá níveis catastróficos incompatíveis com um futuro de crescimento e com a autonomia das famílias. Doravante será muito difícil continuar a disfarçar as nossas imensas vulnerabilidades, apesar de o BCE nos manter ligados à máquina. Num panorama de carga fiscal máxima (e que agora favorece mais os ricos e penaliza mais os pobres) para serviços públicos mínimos, o défice zero em 2019 é o mínimo exigível.
Ora, como o governo não desejou o futuro, empobreceu o presente. E empobreceu-o literalmente. Maquilhar os problemas acaba por agravá-los. O stock de capital sob responsabilidade pública deteriorou-se aceleradamente com o esmagamento do investimento público que, ao tornar-se na variável de ajustamento de uma estratégia orçamental hipócrita e opaca, só com doses avassaladoras de desfaçatez poderá voltar a ser “ponto de honra” de um programa politico de esquerda.
A deterioração dos serviços públicos não será invertida, apesar da chegada das eleições. No sector da saúde, cuja ruptura está à vista de todos, a situação agravar-se-á com a factura ideológica da geringonça de remoção do papão privado. O futuro devia ser o contrário: o compromisso com o utente na prestação de cuidados de saúde com o utente, e não com bolorentos objectivos ideológicos. Precisamos de ultrapassar a visão velha do “SNS vs os outros agentes” para passar a ter uma visão integrada de um Sistema Nacional de Saúde, com públicos, privados e sociais a prestar serviço público. Mais acesso com qualidade; menos ideologia. O contrário da Geringonça, portanto. A afronta ideológica em curso não trata dos doentes; satisfaz egos, mas degrada a vida dos Portugueses.
2018 também promete para 2019 o aumento das tensões internas na Europa, que serão obviamente agravadas se a situação económica se deteriorar rapidamente. Mesmo sem essa deterioração, sabemos que os EUA querem que tomemos mais conta da nossa defesa e estão em retirada da sua acção externa pelo globo que caracterizou os últimos anos desde o final da Guerra Fria. A China acelera os seus planos de penetração geo-económica e assume-se diante de uma parte considerável da Humanidade com um regime alternativo ao dos EUA (e ao nosso) no caminho para a modernização. A Rússia continuará a lidar com a sua decadência interna projectando poder externo não necessariamente cooperante com a Europa e perturbando as suas fronteiras. As torrentes migratórias sobre a Europa voltarão a ocorrer mais tarde ou mais cedo dada a magnitude dos desequilíbrios demográficos em causa. E, por mais que entre nós queiram atirar poeira para os nossos olhos, a questão da imigração tornou-se o problema político fundamental em algumas sociedades europeias, que não é redutível à propaganda da “xenofobia”, “intolerância”, ou “racismo”. Pelo contrário, deixar o problema refém desta propaganda levará a que ele fique precisamente nas mãos dos racistas e xenófobos.
Entre nós, teremos da esquerda geringonça um chorrilho de promessas a disparar em todas as direcções combinado com o agitar do espantalho do “populismo” e da “extrema-direita” para manter bem submissos quaisquer focos de dissonância face à hegemonia política e cultural habitual. A autoridade do Estado estará ainda mais delapidada, dificultando as tarefas insubstituíveis de resolução de conflitos e protecção dos cidadãos, e impedindo a articulação do interesse comum dos Portugueses.
Finalmente, a tão antecipada reconfiguração do sistema de partidos terá início em 2019, começando o seu trabalho pela direita, ao contrário do que sucedeu na Europa. Esperemos que o processo não desagregue o pólo imprescindível de alternativa ao socialismo e que só o PSD pode liderar. Muitos dizem que 2019 será um ano de triunfos eleitorais para a esquerda. Ignoro se será mesmo assim. Mas sei que, se o pior se confirmar, 2019 terá de ser o início da refundação de todo o espaço não-socialista. O País não poderá ser adiado por muito mais tempo. Como alguém escreveu: “Passadas ecoam na memória / Pela passagem que não seguimos / Para a porta que nunca abrimos”.