Fisco assume receita a mais e dá “ideia desproporcionada” do combate à fraude

Para o Tribunal de Contas, a administração tributária está a contabilizar mal o combate à evasão. Fisco contrapõe que os cálculos somam tudo o que é “relevante” para o retrato.

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A autoridade tributária, liderada por Helena Borges, alega limitações nos sistemas de informação Enric Vives-Rubio

Todos os anos, até ao fim de Junho, o Governo tem de enviar para o Parlamento um relatório sobre o combate à fraude e evasão fiscais realizado no ano anterior. Mas nem tudo o que está no papel parece ser como é.

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Todos os anos, até ao fim de Junho, o Governo tem de enviar para o Parlamento um relatório sobre o combate à fraude e evasão fiscais realizado no ano anterior. Mas nem tudo o que está no papel parece ser como é.

O Tribunal de Contas (TdC) detectou que o fisco está a incluir mais receita do que devia para calcular essa cobrança, dando uma “ideia desproporcionada dos resultados”. A falha foi revelada nesta quarta-feira no parecer à Conta Geral do Estado de 2017 e, vista à lupa, a receita conseguida com essas actividades de inspecção ficou-se pelos 238 milhões de euros. Confrontada com as falhas, a instituição liderada por Helena Borges justifica-as com limitações nos sistemas de informação.

Na versão do tribunal, a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) está a incluir “indicadores” – e, portanto, a contabilizar a respectiva receita – que extravasam os resultados desse combate, porque não se limita a contabilizar as liquidações adicionais realizadas e a somar-lhe o valor das colectas recuperadas nos vários impostos. A Lei Geral Tributária prevê que isso seja especificado no relatório, mas o fisco não o está a fazer “de forma clara” e destrinçada, mas sim a contabilizar um bolo onde estão outras fatias. E como se baseia em “indicadores inadequados”, os números são “substancialmente superiores”.

Há três situações com divergências. O fisco dizia que as correcções resultantes do combate à fraude e evasão fiscais eram de 1731,5 milhões de euros, mas, contrapõe o TdC, as “liquidações adicionais” só ascenderam a 985 milhões. A diferença, distingue o tribunal, está no facto de as liquidações do combate à fraude e evasão serem aquelas que têm origem na inspecção tributária (com “correcções técnicas e procedimentos de revisão”) e na gestão tributária (através das “liquidações oficiosas”).

Diferença maior acontece em relação à cobrança coerciva (a feita após o prazo de pagamento voluntário). A fatia foi calculada em 1072 milhões de euros, mas a parte das liquidações “emitidas no âmbito” do combate à fraude e evasão ficou-se por 122 milhões de euros. Também nos processos de contra-ordenação concluídos, o valor identificado pela AT foi de 292 milhões de euros, mas isso “não corresponde a colectas recuperadas”.

Confrontada pelo tribunal, a autoridade tributária respondeu que o sistema de informação “não permite apurar os valores das liquidações adicionais e das colectas resultantes dessas correcções”. A AT não nega haver um constrangimento: admite que os números “têm sido apurados através de um indicador que tem vindo a ser aperfeiçoado para que seja o mais realista possível”. As correcções que resultam de uma acção de inspecção não têm o “correspondente reflexo na liquidação transferida para a cobrança”. Por exemplo, no caso das empresas, existem prejuízos de anos anteriores deduzidos ao lucro tributável ou correcções feitas durante inspecções relativas a pedidos de reembolso do IVA.

Cobrança coerciva nos 19 mil milhões

O relatório em causa foi publicado em Junho deste ano pelo gabinete do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, e inclui contributos de várias entidades que participam com o fisco em operações de combate à fraude e evasão, mas a larga maioria dos números elencados tem como fonte a autoridade tributária.

Perante as divergências, o TdC recomenda que o ministro das Finanças assegure uma alteração que resolva o problema, para que “os indicadores previstos na Lei Geral Tributária” sejam indicados de forma separada.

O mesmo relatório permite ver qual era no final de 2017 o montante da dívida em cobrança coerciva: 19.446 milhões de euros, mais 755 milhões do que no ano anterior (o valor corresponde não apenas a dívidas fiscais, mas também outras a cobrar pelos serviços do fisco). Um dos problemas identificados pelo TdC é que a Conta Geral do Estado “não inclui informação” sobre a composição dessa carteira, nem permite ver como é que ela evolui ao longo do ano. A Mário Centeno, o tribunal recomenda essa alteração, passando a haver também “elementos explicativos sobre as anulações e prescrições, bem como sobre a suspensão e a classificação de dívida como incobrável”.

A análise do TdC permite ainda confirmar que a despesa fiscal de 2017 (a receita a que o Estado renuncia ou perde ao atribuir benefícios fiscais, ao prever uma tributação mais baixa em determinados casos ou ao atribuir isenções) está calculada em 10.557 milhões de euros. Um grupo de peritos está a olhar para os vários benefícios fiscais, fazendo a descrição de cada um deles, para o Governo ter um estudo que ajude a definir os incentivos a manter e os apoios a revogar.