Prémio Pessoa 2018 para cientista Miguel Bastos Araújo
Vencedor foi anunciado esta sexta-feira, em Sintra. É a 32.ª edição do prémio com o valor de 60 mil euros.
O investigador Miguel Bastos Araújo, especialista em biogeografia, é o vencedor do Prémio Pessoa 2018. Tem 49 anos, nasceu na Bélgica, e é um dos maiores especialistas mundiais em alterações climáticas e biodiversidade. “A atribuição do Prémio Pessoa 2018 a Miguel Bastos Araújo constitui um sinal claro de que o conhecimento, a ciência com consciência e as políticas públicas nela inspiradas são indispensáveis para alimentar a esperança num futuro sustentável”, justificou o júri.
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O investigador Miguel Bastos Araújo, especialista em biogeografia, é o vencedor do Prémio Pessoa 2018. Tem 49 anos, nasceu na Bélgica, e é um dos maiores especialistas mundiais em alterações climáticas e biodiversidade. “A atribuição do Prémio Pessoa 2018 a Miguel Bastos Araújo constitui um sinal claro de que o conhecimento, a ciência com consciência e as políticas públicas nela inspiradas são indispensáveis para alimentar a esperança num futuro sustentável”, justificou o júri.
No site oficial do investigador, Miguel Bastos Araújo agradeceu a distinção e escreveu: “Estou extremamente honrado por esse reconhecimento. Interpreto-o não apenas como um prémio pelo meu trabalho, ou mesmo pelo trabalho dos meus colaboradores mais directos, mas também como um reconhecimento da importância de conservar e estudar a biodiversidade em tempos de mudanças planetárias sem precedentes.”
“O Prémio Pessoa pretende representar uma nova atitude, um novo gesto, no reconhecimento contemporâneo das intervenções culturais e científicas produzidas por portugueses”, refere uma nota de imprensa da organização. Francisco Pinto Balsemão anunciou o vencedor do prémio justificando que o trabalho do geógrafo “tem contribuído para reforçar as bases científicas da política de ambiente, em particular desenvolvendo mecanismos de gestão e de redução da incerteza, no sentido de permitir uma melhor protecção da biodiversidade no quadro de mudanças profundas introduzido pelas alterações climáticas em curso”.
Em representação do júri que escolheu o cientista, Pinto Balsemão sublinhou ainda que, “além da autoria de uma vasta bibliografia científica de mais de 200 títulos, que se encontram entre as publicações mais citadas na literatura académica das áreas mencionadas, Miguel Bastos Araújo tem-se distinguido também pelo contributo para a formação de novos investigadores e para o desenvolvimento de projectos científicos de grande relevo”. Foi ainda valorizado o facto de ter sido criada sob a direcção de Miguel Bastos Araújo a Cátedra de Biodiversidade Rui Nabeiro, na Universidade de Évora. “Um caso raro de mecenato científico em Portugal.”
Miguel Bastos Araújo tem visto o seu mérito científico reconhecido através de “importantes prémios internacionais”, obtidos nos últimos cinco anos. Destaca-se o Ebbe Nielsen Prize (2013), O Wolfson Research Merit Award (2014), o King James I Award (2016) e o Ernst Haeckel Prize (2019). Este último prémio é atribuído pela Federação Europeia de Ecologia.
Numa entrevista concedida ao jornal El País depois de ter sido anunciado que era o vencedor do Ernst Haeckel Prize, o investigador deixou vários avisos. Disse, por exemplo, que sempre estivemos sujeitos a alterações climáticas, mas nunca a nada que se pareça com o que estamos a viver agora. “A diferença é o agente da mudança, o homem. É a primeira vez que uma espécie altera o clima com essa intensidade.”
Sobre as previsões para o futuro o investigador – que estuda o impacto do clima na biodiversidade e constrói modelos que tentam prever o efeito da mão humana na natureza – admitiu ser “moderadamente optimista”, mas não o suficiente para acreditar que vamos cumprir o Acordo de Paris (que tem como objectivo impedir que o aumento de temperatura ultrapasse 1,5 graus Celsius).
Os modelos que Miguel Bastos Araújo ajuda a construir têm uma perspectiva de 100 anos. “Não temos ideia do que vai acontecer em três mil anos, só podemos especular. O futuro imediato já envolve grandes desafios. Não só os valores médios de temperatura vão aumentar. Também a frequência e a duração dos eventos extremos: as ondas de calor podem durar um mês à medida que nos aproximamos do final do século. Evitar que isso aconteça passa, na medida do possível, por não aumentar mais o grau de concentração de CO2 na atmosfera. Estamos em cerca de 400 partes por milhão, o recorde em 380 mil anos”, diz na mesma entrevista ao El País.
Respondendo às hesitações entre agir ou reagir (ou seja, investir na adaptação a um planeta diferente ou tentar minimizar o impacto e as mudanças na natureza), o cientista não tem dúvidas. “As contas estão feitas e a adaptação é muito cara. Muito mais cara do que mudar o modelo produtivo para uma economia menos baseada no uso de combustíveis fósseis.” Miguel Bastos Araújo acredita que “a extinção das espécies actuais começa quando o ser humano muda os ciclos geoquímicos da atmosfera e das correntes oceânicas” e que nós “estamos a mudar o funcionamento elementar do planeta”. O homem, conclui, “é uma espécie muito bem sucedida que pode acabar a morrer por causa do seu próprio sucesso”.
O júri reconheceu que a escolha do especialista em alterações climáticas e biodiversidade surge num contexto especial e que está a marcar a actualidade: “Numa altura em que, no plano político, económico e cultural, a nível global, se erguem tantas vozes e forças poderosas, criando obstáculos ao contributo das ciências para o estudo e a busca de soluções para os problemas fundamentais da sobrevivência humana, nomeadamente no que respeita à crise do ambiente e das alterações climáticas.” Aliás, mais oportuno seria difícil, uma vez que o anúncio do vencedor deste prémio surge precisamente no último dia da cimeira das Nações Unidas sobre clima e alterações climáticas, que decorre em Katowice, na Polónia.
Miguel Bastos Araújo nasceu na Bélgica e licenciou-se em 1994 em Geografia e Planeamento Regional (na Universidade Nova de Lisboa). Em 1996 obteve o mestrado em Conservação, no University College, em Londres, onde completou também o doutoramento em Geografia, em 2000. É investigador-coordenador no Museu Nacional de Ciências Naturais (parte do Conselho Superior de Investigação Científica em Madrid, Espanha), investigador-coordenador convidado na Universidade de Évora e professor catedrático convidado na Universidade de Copenhaga e no Imperial College de Londres.
O prémio, uma iniciativa do jornal Expresso com o patrocínio da Caixa Geral de Depósitos, tem o valor 60 mil euros e distingue uma personalidade portuguesa que tenha tido uma “intervenção particularmente relevante e inovadora na vida artística, literária ou científica”.
O júri da edição de 2018, a 32.ª, é composto por: Francisco Pinto Balsemão (presidente); Emídio Rui Vilar (vice-presidente); Ana Pinho; António Barreto; Clara Ferreira Alves; Diogo Lucena; Eduardo Souto de Moura; José Luís Porfírio; Maria Manuel Mota; Maria de Sousa; Pedro Norton; Rui Magalhães Baião; Rui Vieira Nery; Viriato Soromenho-Marques. O arquitecto Manuel Aires Mateus, 54 anos, foi o vencedor em 2017.