Apesar dos acordos, emissões de CO2 voltam a aumentar em 2018
Relatório constata que as emissões globais de dióxido de carbono devem atingir a maior subida de todos os tempos em 2018 com um aumento de mais de 2,7% face a 2017. Este é um dos principais alertas dirigidos aos líderes mundiais reunidos na cimeira do clima das Nações Unidas, na Polónia.
A cimeira das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP 24), a decorrer em Katowice (na Polónia) até 14 de Dezembro, está a servir de gatilho para inúmeros alertas sobre o mau estado em que colocámos o nosso planeta. Apesar das previsões mais optimistas dos que acreditam que ainda vamos a tempo de remediar o mal, a verdade é que os problemas que os representantes de 190 nações têm de enfrentar (e tentar resolver) são assustadores. O relatório do Orçamento do Carbono divulgado esta quarta-feira, é mais uma enorme acha para a fogueira com o aviso sobre um esperado aumento de 2,7% nas emissões de CO2 em 2018 em relação a 2017. Mas há mais.
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A cimeira das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP 24), a decorrer em Katowice (na Polónia) até 14 de Dezembro, está a servir de gatilho para inúmeros alertas sobre o mau estado em que colocámos o nosso planeta. Apesar das previsões mais optimistas dos que acreditam que ainda vamos a tempo de remediar o mal, a verdade é que os problemas que os representantes de 190 nações têm de enfrentar (e tentar resolver) são assustadores. O relatório do Orçamento do Carbono divulgado esta quarta-feira, é mais uma enorme acha para a fogueira com o aviso sobre um esperado aumento de 2,7% nas emissões de CO2 em 2018 em relação a 2017. Mas há mais.
A aposta nas energias renováveis será evidente, mas ainda está longe de conseguir compensar o que o mundo vai buscar aos combustíveis fósseis para obter a energia que precisa para funcionar. Os consumos de carvão, petróleo e gás continuam muito acima do que seria necessário para manter o planeta a salvo e o relatório do Orçamento do Carbono, divulgado simultaneamente nas revistas Nature, Earth System Science Data e Environmental Research Letters, é claro sobre as consequências: as emissões globais da queima de combustíveis fósseis devem atingir 37.100 milhões de toneladas de CO2 em 2018. Se entre 2014 a 2016 este indicador parecia estar a crescer muito pouco ou quase nada, em 2017 o aumento já foi de 1,6%. As projecções para 2018, apresentadas pelos investigadores da Universidade de East Anglia (no Reino Unido) e do Projecto Carbono Global que elaboraram o relatório Orçamento do Carbono, são desanimadoras. “As emissões precisam de atingir um pico e diminuir rapidamente para lidar com as mudanças climáticas. Com o crescimento das emissões este ano, parece que o pico ainda não está à vista”, confirma Corinne Le Quéré, professora de política e ciência de alterações climáticas da Universidade de East Anglia e uma das autoras do relatório que confirma e quantifica uma informação já avançada há cerca de uma semana por um outro estudo divulgado pelas Nações Unidas.
As emissões causadas pelo desmatamento e por outras actividades humanas em terra representam mais 5000 milhões de toneladas de CO2 este ano, elevando o total, incluindo a queima de combustíveis de fósseis, para 41.500 milhões. Desta forma, as concentrações de CO2 na atmosfera deverão aumentar em média cerca de 2,3 partes por milhão em 2018 para atingir cerca de 407 partes por milhão ao longo do ano. “Isso representa 45 % acima dos níveis pré-industriais.”
Para limitar o aquecimento global à meta do Acordo de Paris de 2015, que aponta para um máximo de 1,5 graus Celsius, as emissões de CO2 precisariam diminuir em 50% até 2030 e chegar a zero por volta de 2050. Por este andar, avisa Corinne Le Quéré, “estamos a caminho de três graus Celsius de aquecimento global”.
É fácil concluir que é preciso fazer mais e mais rapidamente. E aqui (quase) todos estão de acordo, se colocarmos de lado os célebres cépticos que ameaçam ficar de braços cruzados, como Donald Trump nos EUA e Jair Bolsonaro no Brasil.
Feitas as excepções, os autores do relatório reconhecem que o mundo se está a esforçar. “As tendências na energia estão a mudar e ainda há tempo para enfrentar as alterações climáticas se todos os sectores da economia fizerem o esforço para reduzir as emissões de carbono”, referem. Christiana Figueres, mentora da acção internacional Mission 2020, escreve um comentário na revista Nature e agenda uma data: “As emissões globais de CO2 têm de começar a cair a partir de 2020 se quisermos atingir as metas de temperatura do Acordo de Paris, e isso está ao nosso alcance. Já alcançamos coisas que pareciam inimagináveis há apenas uma década.”
Mas, afinal, por que é que as emissões continuam a aumentar? Os investigadores falam num “sólido crescimento no consumo de carvão” que, em breve, poderá ultrapassar o pico registado em 2013. O consumo de petróleo também continua “a crescer fortemente na maioria das regiões”, com aumento das emissões libertadas pelo tráfego terrestre e aéreo, incluindo os EUA e a Europa. Por fim, o consumo de gás “cresceu de forma quase inabalável nos últimos anos”. “Por enquanto, a crescente demanda global por energia está a superar a descarbonização. Precisamos de forte apoio político e económico para a rápida implantação de tecnologias de baixo carbono para reduzir as emissões nos sectores de energia e transporte, de edifícios e da indústria”, afirma Corinne Le Quéré.
O tal “forte apoio político e económico” pode estar nesta cimeira do clima das Nações Unidas? Talvez. A COP 24 tem como um dos principais objectivos a elaboração de um “manual” com as regras comuns que devem ser usadas nos vários países para registar, monitorizar e validar o esforço de redução das emissões de CO2, bem como outro tipo de medidas que contribuam para minimizar os efeitos das alterações climáticas. O financiamento – já se sabe, por exemplo, que o Banco Mundial vai disponibilizar 200 mil milhões de dólares (176 mil milhões de euros) para cinco anos – terá de ser dirigido para acções de substituição da economia com vista à descarbonização, mas também para ajudar os países mais pobres e responder aos estragos devastadores provocados por fenómenos extremos (tempestades, incêndios florestais e inundações) cada vez mais comuns.
Espera-se obviamente (mais) um compromisso à escala mundial na Polónia. Mas, os anfitriões já deram um sinal contraditório com a organização do encontro numa cidade construída à volta da actividade mineira do carvão e que tem como principais patrocinadores duas companhias deste sector. Resta esperar que seja um insólito sinal de vontade de mudança.
E as boas notícias?
Para já, a remar contra a maré, há 19 países que conseguiram reduzir as emissões de CO2 na última década mantendo o crescimento da sua economia. O relatório do Orçamento do Carbono não inclui dados sobre Portugal que, em 2017 em relação ao ano anterior, segundo o Eurostat, registou o quinto maior aumento de emissões de CO2 provenientes do consumo de energia com 7,3%, sendo a média da União Europeia (UE) de 1,8%.
Entre outras possíveis escapatórias, a esperança está depositada na aceleração das energias renováveis. “Os custos das tecnologias de energia renovável caíram 80% em uma década e hoje mais da metade de toda a nova capacidade de geração de energia é renovável”, constatam os autores do relatório, que elogiam também os esforços de “descarbonização da economia”.
No próximo dia 12 de Dezembro (quarta-feira) o Acordo de Paris, aprovado na COP 21, faz três anos e é difícil encontrar motivos para celebrar. Em Janeiro deste ano ficámos a saber, por exemplo, que os últimos três anos (2017, 2016 e 2015) foram os mais quentes desde que começaram os registos de temperaturas, em 1880.
A edição desta semana da revista Nature é apenas um dos muitos exemplos de “alertas vermelhos” que se acendem nestes dias, enquanto os representantes de 190 nações se reúnem na Polónia para analisar o progresso do Acordo de Paris e definir acções para o futuro. Além do relatório do Orçamento do Carbono e de um estudo que revela que o gelo da Gronelândia está a derreter a um ritmo acelerado, há dois comentários com duas diferentes perspectivas. Se um se foca nos avanços conseguidos nas energias renováveis, o outro faz soar o alarme sobre os modelos optimistas. Os dois têm, no entanto, algo em comum: as mudanças causadas pelo aquecimento global estão aí (nas tempestades, incêndios florestais e furacões cada vez mais frequentes e violentos) e a construção de um mundo de carbono zero pode não acontecer suficientemente rápido.
David Attenborough foi um dos convidados a falar no início dos trabalhos da cimeira das Nações Unidas, na segunda-feira, e a mensagem espalhou-se. “Neste momento, estamos a enfrentar um desastre causado pelo homem à escala global. É a nossa maior ameaça em milhares de anos. A mudança climática” disse o famoso naturalista, concluindo: “As pessoas do mundo falaram. A mensagem delas é clara. O tempo está a esgotar-se. Elas querem que vocês, os decisores, ajam agora.”