Fundação Mário Soares reduzida a arquivo do ex-Presidente
Subsídios cairam para metade desde que o ex-Presidente morreu. Custos foram reduzidos, mas não foi o suficiente para travar saldo negativo que foi de 388 mil euros.
Vai ser uma semana decisiva para o futuro da Fundação Mário Soares. Há uma proposta em cima da mesa, defendida pela actual direcção, para que a Fundação guarde apenas o arquivo pessoal de Mário Soares, e de mais "dois ou três" amigos próximos, confirmou ao PÚBLICO fonte da direcção. Entre esses outros espólios a manter na Fundação está o de Francisco Ramos da Costa (fundador do PS, que foi um dos companheiros de Soares na chegada do exílio a Santa Apolónia) e o escritor Manuel Mendes, íntimo de Soares desde os tempos da resistência na universidade até à sua morte, em 1969.
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Vai ser uma semana decisiva para o futuro da Fundação Mário Soares. Há uma proposta em cima da mesa, defendida pela actual direcção, para que a Fundação guarde apenas o arquivo pessoal de Mário Soares, e de mais "dois ou três" amigos próximos, confirmou ao PÚBLICO fonte da direcção. Entre esses outros espólios a manter na Fundação está o de Francisco Ramos da Costa (fundador do PS, que foi um dos companheiros de Soares na chegada do exílio a Santa Apolónia) e o escritor Manuel Mendes, íntimo de Soares desde os tempos da resistência na universidade até à sua morte, em 1969.
A ser aceite, a proposta implica a saída da Fundação Mário Soares de todos os arquivos ali existentes - de grandes personalidades do século XX português, da República à resistência à ditadura e também das ex-colónias. O destino de alguns dos espólios pode ser a transferência imediata para a Torre do Tombo. Em outros casos, nomeadamente dos arquivos que não foram doados mas apenas depositados na Fundação Soares, será necessário falar com as famílias para saber que destino dar à documentação.
Desde a morte de Mário Soares, a Fundação deixou de ser o que era. Enquanto o ex-Presidente da República foi vivo, a instituição editava livros, organizava conferências, promovia exposições, organizava espólios e beneficiava de donativos e outros subsídios para a sua actividade.
Grande parte dos documentos que a Fundação tem à sua guarda está digitalizada e disponível para consulta online, mas nem todo o trabalho está concluído, a começar pelo próprio arquivo pessoal de Mário Soares.
Os apoios deixaram de chegar ao mesmo ritmo à sede da fundação, na Rua de São Bento, em Lisboa, mesmo em frente à Assembleia da República. Alguns colaboradores da Fundação foram mesmo dispensados, uma vez que faziam parte do gabinete de ex-Presidente da República que também funcionava na sede da fundação e que era pago com uma verba do Orçamento do Estado. Cavaco Silva, por exemplo, instalou o gabinete de ex-Presidente da República no Convento do Sacramento, em Alcântara, edifício que sofreu obras de recuperação pagas pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Subsídios caíram a pique
Em 2016, a Fundação registou um saldo negativo de mais de 280 mil euros, valor que confirmava a tendência já negativa (menos 210 mil euros em 2015 e 103 mil em 2014). No ano passado, os prejuízos atingiram os 388 mil euros. O relatório das contas de 2017, consultado pelo PÚBLICO, revela que os subsídios caíram para metade: passaram de 316 mil para 175 mil. A Fundação EDP, por exemplo, cortou o apoio de 75 mil euros para apenas 7 mil.
"O falecimento do presidente da Fundação teve consequências significativas nas actividades desenvolvidas no decorrer do ano e, ainda, importantes reflexos que afectaram a instituição no plano económico e financeiro. O conselho fiscal toma em consideração este facto na apreciação da situação patrimonial da fundação e respectivas consequências, bem como os esforços desenvolvidos pelo conselho de administração no sentido de encontrar soluções para os problemas daí decorrentes", reconhece o relatório do conselho fiscal sobre o exercício de 2017.
Em Novembro de 2017, Carlos Monjardino, que integra a direcção da Fundação, já havia admitido ao Expresso que tinha que fazer uma "gestão cautelosa", cortar "algumas gorduras", "adaptar-se às actuais condições financeiras" e "reduzir o espectro de actividades". Mas as contas pioraram.
Esta terça-feira, o ex-Presidente cabo-verdiano e presidente da Fundação Amílcar Cabral (FAC) tinha manifestado publicamente a sua preocupação com o futuro de escritos originais do "pai" da nação, que se encontram na Fundação Mário Soares, em Lisboa.
"Estou preocupado, sim, porque uma boa parte dos escritos originais de Amílcar Cabral estão depositados na Fundação Mário Soares, em Portugal, que neste momento enfrenta dificuldades de ordem financeira", declarou Pedro Pires à imprensa, na Cidade da Praia, após uma audiência com o Presidente da República de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, a quem foi pedir apoio para a preservação das memórias.
O também ex-Presidente da República de Cabo Verde afirma que o que contam não são os livros, mas sim os escritos originais de Amílcar Cabral. "Para nós é importante encontrar uma saída para essa situação, temos discutido, temos sugerido, mas vamos continuar a trabalhar nesse sentido", afirmou.
Se fosse vivo, Mário Soares faria 94 anos no dia 7 de Dezembro, dia em que serão entregues três menções honrosas do Prémio Fundação Mário Soares, na área de História de Portugal do século XX. No ano passado, neste mesmo dia foi lançado um livro de Vítor Ramalho de homenagem ao seu amigo e fundador do PS.