Mais de metade dos casos de VIH/sida são diagnosticados tardiamente
Cerca de 40% dos novos casos de transmissão heterossexual são relativos a pessoas com 50 ou mais anos. Em 2017 foram diagnosticados e notificados 1068 infecções por VIH/sida em Portugal.
Três décadas e meio após o início da epidemia, um dos principais problemas no combate à infecção VIH/sida é a detecção tardia: mais de metade dos novos casos notificados no ano passado em Portugal foram diagnosticados numa fase tardia, lamenta a coordenadora do Programa Nacional para a Infecção VIH e Sida, Isabel Aldir. O relatório conjunto deste programa da Direcção-Geral da Saúde (DGS) e do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (Insa), que esta terça-feira é divulgado, permite perceber que esta proporção não tem oscilado de forma significativa nos últimos anos.
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Três décadas e meio após o início da epidemia, um dos principais problemas no combate à infecção VIH/sida é a detecção tardia: mais de metade dos novos casos notificados no ano passado em Portugal foram diagnosticados numa fase tardia, lamenta a coordenadora do Programa Nacional para a Infecção VIH e Sida, Isabel Aldir. O relatório conjunto deste programa da Direcção-Geral da Saúde (DGS) e do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (Insa), que esta terça-feira é divulgado, permite perceber que esta proporção não tem oscilado de forma significativa nos últimos anos.
Contribuindo para a manutenção das cadeias de transmissão, o diagnóstico tardio da infecção “tem imenso impacto, não só na qualidade de vida da pessoa, mas mesmo em termos de saúde pública”, sublinha Isabel Aldir. O que os dados do novo relatório provam também é que este fenómeno tem uma dimensão ainda maior entre as pessoas mais velhas: nos indivíduos com 50 ou mais anos, o diagnóstico ocorreu tardiamente em cerca de dois terços dos casos (67,8%) no ano passado.
O facto de Portugal estar entre os países da União Europeia com mais casos de diagnósticos tardios para a infecção por VIH entre os adultos mais velhos foi justamente um dos alertas efectuados pelo Centro Europeu para a Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC, na sigla em inglês) e o Gabinete Regional para a Europa da Organização Mundial de Saúde no ano passado.
Como é que se previne este problema? Promovendo os testes de VIH, não desperdiçando oportunidades para propor o despiste às pessoas, responde Isabel Aldir. “Haverá estratégias para uma determinada população, haverá estratégias para outros grupos de pessoas. O que é importante é haver diferentes respostas para que as pessoas se sintam confortáveis na realização do teste”, diz, acrescentando que, “ao normalizarmos o teste” também “estamos a contribuir para que o estigma associado à doença se esbata”.
No global, o relatório conjunto da DGS e do Insa volta a actualizar os dados de novos casos de VIH/sida notificados e diagnosticados em 2017 – que são 1068, contra 1313, em 2016, de acordo com os últimos números. Verifica-se, assim, de novo um aumento de novos casos face à informação veiculada em Junho passado, quando foi divulgado o relatório anual do programa da DGS. “É o habitual. As notificações vão-se sucedendo ao longo do ano e avisamos, aliás, sempre que os dados são provisórios”, justifica Isabel Aldir.
O certo é que, apesar da tendência para o decréscimo no número de novos casos observada desde há quase duas décadas em Portugal, as nossas taxas continuam a ser das mais elevadas da União Europeia. Em trinta e cinco anos, foram identificados quase 58 mil casos em Portugal.
Já o perfil dos novos infectados não tem variado muito de ano para ano: a maioria são homens (72%) e heterossexuais. No entanto, ainda que a maior parte dos novos casos identificados em 2017 sejam indivíduos na faixa etária dos 20 aos 30 anos, há uma percentagem considerável de pessoas com idade igual ou superior a 50 anos. Em 2017, representaram já 28% das novas infecções, revela o documento. O interessante é que, no conjunto dos heterossexuais, cerca de 40% dos novos casos são de indivíduos com 50 ou mais anos.
“Não é algo de novo, vem confirmar aquilo que tem sido a evolução nos últimos anos. A maioria dos novos casos acontece na faixa etária dos 20-30, mas depois há uma percentagem considerável de casos em idade superior a 50 anos. E, quando olhamos especificamente para a categoria de transmissão heterossexual, essa percentagem ainda é maior”, explica Isabel Aldir.
Mas se a maioria dos casos diagnosticados nos anos mais recentes ocorre em homens por transmissão sexual, principalmente heterossexual, quando se observam "exclusivamente os casos em homens, verifica-se um aumento do número de casos em homens que fazem sexo com homens," que actualmente constituem já "a maioria dos novos diagnósticos no sexo masculino”. E aqui a infecção propaga-se bem mais cedo. "Estes casos destacam-se pela idade jovem, tendo constituído 79,8% dos novos casos com diagnóstico nos últimos cinco anos em homens entre os 15 e os 29 anos", refere o relatório.
O aumento do número de casos entre homens que fazem sexo com homens tem sido observado em muitos países europeus, frisam os autores do documento, lembrando a informação sobre esta matéria divulgada pelo ECDC. Para contrariar esta tendência, destacam a importância do uso da profilaxia pré-exposição (PrEP) que passou recentemente a estar disponível em consultas específicas de diversos hospitais do país.
Mínimo histórico em utilizadores de drogas
Olhando para os números, descortina-se, por outro lado, uma óptima notícia: em 2017 atingiu-se um “mínimo histórico” de casos de infecção em utilizadores de drogas injectáveis (18, no total). “A epidemia concentra-se agora fundamentalmente na população heterossexual e na dos homens que fazem sexo com homens”, sintetiza a coordenadora do programa da DGS, recordando os anos em que havia muitas centenas de consumidores de drogas por via injectável infectados. A redução foi "acelerada"
O resultado “mais marcante das intervenções nacionais será a redução acelerada do número de novos casos de infecção por VIH e sida "nos utilizadores de drogas injectáveis, observada a partir de 2000", destacam os autores do relatório. Isso aconteceu, explicam, graças a uma estratégia que incluiu programas de redução de riscos e minimização de danos, nomeadamente de troca de seringas e a descriminalização do consumo de drogas.