Há menos 30% de bolsas de estudo atribuídas do que há um ano
Análise dos processos nos Serviços de Acção Social das instituições de ensino está atrasada. Quase 27 mil alunos já sabem que têm direito, mas há 60 mil à espera de resposta.
A quatro semanas do final do primeiro semestre de aulas, 60 mil alunos do ensino superior ainda aguardam uma resposta para saberem se, no ano lectivo em curso, terão direito a bolsa de estudo. O processo de atribuição dos apoios sociais, destinados a quem tem rendimentos mais baixos, está mais lento devido a um problema informático, que foi entretanto ultrapassado, mas que atrasou a análise das candidaturas. O número de bolsas atribuídas está 30% abaixo do registado em igual período do ano passado.
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A quatro semanas do final do primeiro semestre de aulas, 60 mil alunos do ensino superior ainda aguardam uma resposta para saberem se, no ano lectivo em curso, terão direito a bolsa de estudo. O processo de atribuição dos apoios sociais, destinados a quem tem rendimentos mais baixos, está mais lento devido a um problema informático, que foi entretanto ultrapassado, mas que atrasou a análise das candidaturas. O número de bolsas atribuídas está 30% abaixo do registado em igual período do ano passado.
Assim, apenas 26.994 alunos têm a garantia de que vão receber bolsa de Acção Social. E destes cerca de 22 mil receberam os primeiros pagamentos até ao final do mês passado. Feitas as contas, há menos 11.105 bolsas aprovadas do que no período homólogo de 2017.
Antes do início do ano lectivo, houve uma alteração ao regulamento de atribuição dos apoios, que implicou alterações na plataforma informática usada pelos Serviços de Acção Social (SAS) das universidades e institutos politécnicos. “Houve um problema que fez com que tivéssemos tido mais dificuldade em começar a ver os processos”, explica a administradora dos SAS da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), Elsa Justino. Esta é uma das instituições públicas — juntamente com o Politécnico de Beja e a Universidade da Madeira — onde o processo de análise de candidaturas está mais adiantado. Na universidade de Vila Real, 65% dos casos já têm decisão final.
O cenário é diferente em 25 instituições de ensino superior públicas, em que menos de metade dos estudantes têm uma resposta. No final de Setembro, a maioria das universidades e institutos politécnicos ainda não tinha começado a analisar as candidaturas dos estudantes.
Há um ano, a atribuição de bolsas estava a ser mais rápida do que o habitual. Era o resultado das alterações às regras que tinham, por exemplo, tornado automática a renovação das bolsas para os alunos que mantivessem as mesmas condições familiares e económicas do ano lectivo anterior. Por outro lado, a comunicação entre os Serviços de Acção Social e organismos públicos como a Segurança Social e as Finanças tornou-se mais rápida. Os estudantes têm agora de fazer prova da sua situação regularizada junto destas entidades e o cálculo da bolsa é realizado tendo em conta os rendimentos registados pela Autoridade Tributária.
Mas, se há um ano, essa facilidade de comunicação acelerou o processo, este ano esse sistema é um dos responsáveis pelos atrasos que se verificam.
“Situações complicadas”
Durante várias semanas, a interoperabilidade entre os sistemas informáticos das Finanças e Segurança Social e os dos Serviços de Acção Social não funcionou, o que deixou milhares de processos pendentes à espera da informação tributária para poderem ser completados.
Questionado pelo PÚBLICO, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) diz que se está “no período normal de análise de processos”. Mas são os próprios dados disponibilizados publicamente pela Direcção-Geral do Ensino Superior (DGES) que mostram que há 18.300 candidaturas cuja análise está parada por falta de dados (informação académica dos alunos ou dados tributários relativos ao agregado familiar, por exemplo), o que significa que são mais 2000 do que na mesma altura do ano lectivo 2017/18.
Outras 40.304 estão ainda em fase de processo dentro dos Serviços de Acção Social das universidades e politécnicos, o que corresponde a um aumento de 11.511 face a 2017. Se a estas juntarmos situações como pedidos de reapreciação das decisões ou os processos em fase de audiência de interessados, há mais de 60 mil candidaturas ainda à espera de serem analisadas — ou seja, quase dois terços dos candidatos a bolsa estão ainda à espera a quatro semanas do final do primeiro semestre lectivo.
A comparação feita pelo PÚBLICO baseia-se nos dados disponibilizados pela DGES a 12 de Novembro deste ano, uma vez que é a única data para a qual existiam dados comparáveis relativos ao ano lectivo passado (recolhidos a 14 de Novembro de 2017). Até esse momento, os Serviços de Acção Social das instituições de ensino superior receberam 94.777 candidaturas de estudantes, mais 363 do que no ano anterior.
Os problemas informáticos que afectaram a plataforma usada pelos Serviços de Acção Social já foram, entretanto, ultrapassados. Elsa Justino espera que, pelo menos na UTAD, se consiga antecipar alguns prazos de análise. A administradora dos Serviços de Acção Social da universidade de Vila Real acredita que “até ao final do mês” seja possível “chegar a um ritmo de análise mais próximo daquele que seria ideal nesta fase”.
Mas nas universidades em que os processos estão mais atrasados milhares de estudantes podem só receber uma resposta definitiva à sua candidatura a uma bolsa em Fevereiro do próximo ano, estima João Pedro Videira, presidente da Federação Académica do Porto (FAP), a maior estrutura estudantil do país, integrando os alunos da Universidade do Porto e do Instituto Politécnico do Porto.
“Há estudantes que, enquanto esperam por resposta à candidatura a bolsa, não têm condições para ir às aulas”, alerta João Pedro Videira. O dirigente estudantil lembra que quem se candidata a receber bolsa de estudo são precisamente os alunos com maiores dificuldades socioeconómicas e que estão, por isso, “mais vulneráveis”, enquanto não recebem apoio do Estado.
Sublinha ainda o “risco” que correm muitos alunos que, enquanto esperam por uma resposta, vão fazendo gastos necessários à frequência dos seus cursos, na expectativa de virem a receber este apoio do Estado. Se, quando chegar uma resposta, esta for negativa, sublinha, “podem criar-se situações complicadas”.
O valor da bolsa varia conforme os rendimentos do agregado familiar. O montante mínimo corresponde à propina praticada na instituição que o estudante frequenta (sendo o valor mínimo da propina de 75 euros mensais). No máximo, em caso de graves carências, o estudante pode receber um apoio de até 1286 mensais.