Sírio obtém asilo no Canadá após oito meses a viver em aeroporto
Hassan Al Kontar esteve num limbo numa ala do aeroporto de Kuala Lumpur. Depois de lhe ter sido concedido asilo, aterrou hoje em Vancouver.
Durante dias, semanas, meses, Hassan Al Kontar viveu numa ala das chegadas no aeroporto de Kuala Lumpur, quando lhe foi recusado o embarque num voo para o Equador, e quando vários países lhe recusaram entrada. O seu passaporte sírio expirara e a única hipótese parecia ser regressar à Síria.
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Durante dias, semanas, meses, Hassan Al Kontar viveu numa ala das chegadas no aeroporto de Kuala Lumpur, quando lhe foi recusado o embarque num voo para o Equador, e quando vários países lhe recusaram entrada. O seu passaporte sírio expirara e a única hipótese parecia ser regressar à Síria.
Querendo tudo menos voltar para o país em guerra, Kontar, 37 anos, acabou por ficar num limbo, enquanto tentava que algum país o acolhesse.
Kontar trabalhava no Dubai quando começou a guerra na Síria. O seu passaporte expirou e a embaixada síria nos Emirados Árabes Unidos recusou-se a renová-lo, diz o diário britânico The Guardian. Ficou ilegal no Dubai; perdeu o emprego, ficou sem casa. Entretanto, recebeu uma ordem para voltar à Síria e combater, o que Kontar não queria fazer.
Ainda recebeu um documento temporário, com que tentou uma série de hipóteses, como o Camboja ou a Malásia. Acabou por procurar embarcar para o Equador em Kuala Lumpur, não conseguiu, ficou sem alternativas.
No aeroporto, foi fazendo vídeos contando os seus dias e foi ficando cada vez mais desesperado. As refeições eram-lhe trazidas por pessoal das companhias aéreas. Tomava banho numa casa de banho para deficientes. Dormia debaixo das escadas, tentando escapar ao constante ruído dos anúncios e à luz que nunca se apagava.
Ao quarto mês, um dos seus vídeos foi mais visto do que os anteriores. “Estou a começar a desistir. Consigo sentir aproximar-se o meu ponto de ruptura”, dizia. Solidão, tédio, medo, Kontar ia descrevendo a passagem dos dias, semanas, meses. Sempre disse que não era o único e que havia muitos sírios em situações parecidas, lutando para terem acolhimento seguro.
A sua situação chamou a atenção de organizações de defesa de refugiados e direitos humanos. A Human Rights Watch lembrava que, por pertencer à minoria druza, Hassan Al Kontar corria ainda mais perigo, caso fosse obrigado a voltar à Síria.
Uma das organizações que mais se empenharam no caso de Kontar era canadiana e foi aí que o seu caso finalmente teve uma hipótese: esta segunda-feira conseguiu embarcar num voo com destino a Taiwan, e daí seguir para Vancouver. Foi de um outro aeroporto internacional, desta vez o de Taiwan, que Kontar fez o mais recente vídeo que aparece na sua conta de Twitter, em que deu a novidade aos seus seguidores. “Peço desculpa por parecer saído da Idade Média”, diz. “Também peço desculpa por ter estado incontactável nos últimos dois meses.”
O que importa, continuou, “não é o passado mas sim hoje e amanhã”. E esse vai ser no seu destino final: Vancouver, Canadá. “Muito obrigado a todos”, disse.
"Ele foi um dos que tiveram sorte"
Kontar foi a dada altura detido pelas autoridades da Malásia e tudo parecia indicar que seria mandado para a Síria.
Uma das pessoas que fizeram campanha de crowdfunding para patrocinar a ida de Kontar no âmbito do esquema dos chamados “refugiados patrocinados de forma privada”, Laurie Cooper, agradeceu às autoridades do Canadá por terem conseguido evitar esse desfecho.
“Estou muito grata aos responsáveis canadianos que, quando Hassan esteve verdadeiramente em perigo, trabalharam muito, muito para acelerar o processo”, disse.
“A situação dele é representativa das dificuldades que todos os refugiados encontram em todo o mundo”, comentou Cooper, citada pela emissora britânica BBC. “É cada vez mais difícil encontrarem um sítio seguro para viver. Ele foi um dos que tiveram sorte.”
Esta terça-feira, Kontar aterrou em Vancouver, onde foi recebido por Cooper. Os media canadianos mostraram o abraço dos dois, e as primeiras declarações do sírio. “Para já preciso de um duche quente e de sair do aeroporto, estou farto de aeroportos”, disse aos jornalistas.
À sua espera lá fora, chuva torrencial, conta a estação de televisão canadiana CBC, que seguiu a chegada do refugiado sírio. Dali, Kontar irá viver com Cooper até encontrar uma casa, e espera-o já um emprego a tempo inteiro num hotel, o Whistler. “Vou ficar bem”, disse, antes de sair para a rua.
Desde 2015, o Canadá recebeu mais de 14 mil sírios patrocinados de forma privada e, em 2016, as autoridades canadianas foram elogiadas pelo Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) por terem participado na recolocação no país de pelo menos 46.700 refugiados.