Angola dá sinais de desinvestimento em Portugal
Em 2017 houve um desinvestimento de 95 milhões, e Isabel dos Santos saiu do BPI. Posições da Sonangol no BCP e Galp estão sinalizadas para venda.
Depois de vários anos a crescer e a ganhar grande visibilidade, o investimento angolano em Portugal dá agora sinais de recuo. Na semana passada o presidente da Sonangol, a petrolífera estatal angolana, anunciou um plano de venda de activos que não pertencem à sua principal actividade, o que inclui participações em várias empresas e bancos. E se em Angola isso pode afectar as fatias que detém na Mota Engil Angola (20%) ou no Banco Caixa Geral Angola (25%, cabendo 51% à Caixa Geral de Depósitos), em Portugal a Sonangol está presente na Galp Energia e no BCP.
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Depois de vários anos a crescer e a ganhar grande visibilidade, o investimento angolano em Portugal dá agora sinais de recuo. Na semana passada o presidente da Sonangol, a petrolífera estatal angolana, anunciou um plano de venda de activos que não pertencem à sua principal actividade, o que inclui participações em várias empresas e bancos. E se em Angola isso pode afectar as fatias que detém na Mota Engil Angola (20%) ou no Banco Caixa Geral Angola (25%, cabendo 51% à Caixa Geral de Depósitos), em Portugal a Sonangol está presente na Galp Energia e no BCP.
Na entrevista ao Expresso, o Presidente de Angola, João Lourenço, veio mostrar que a venda está mesmo em cima da mesa: classificou a participação da Galp como “uma dispersão”, e não negou a saída do BCP, total ou parcial, onde a Sonangol entrou em 2007 e é hoje o segundo maior accionista com 19,5%. “Não estou a dizer que vamos sair amanhã. Estou a dizer apenas que a tendência é essa”, afirmou João Lourenço.
O ano passado já foi marcado por um desinvestimento, com os dados do Banco de Portugal (divulgados em Outubro por via do relatório sobre as relações com os PALOP) a mostrarem um saldo negativo de 95 milhões no fluxo de investimento directo devido a um forte recuo dos serviços (nomeadamente actividades financeiras).
Ao PÚBLICO, o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portugal Angola (CCIPA), João Traça, afirmou que esta é uma “situação compreensível”. Angola, diz, “está a fazer o que seria natural, tendo em conta o seu contexto económico actual, ou seja, está a alienar participações para investir na economia angolana para atingir o seu grande objectivo estratégico, que consiste na diversificação da sua economia”.
Onde estão os investimentos angolanos
Nos cálculos do Banco de Portugal contabiliza-se apenas os investimentos directos, excluindo-se os que envolvem países com benefícios fiscais como Holanda ou Malta. Em 2017, Isabel dos Santos vendeu a participação de 18% que detinha no BPI aos catalães do La Caixa, ganhando em troca o domínio do Banco de Fomento Angola e um encaixe de 307 milhões de euros.
A banca é, aliás, um sector onde os investidores angolanos estão bem representados. O General “Kopelipa” é um dos grandes accionistas do BIG, e estão presentes no mercado nacional o Banco Africano de Investimentos (BAI Europa, presidido por Tavares Moreira e onde a Sonangol é um forte accionista), o Atlântico (ligado a Carlos Silva), e o Banco de Negócios Internacional (dominado por Mário Palhares, está em Portugal via BNI Europa, o qual está em vias de vender parte do capital aos chineses da KWG).
A maior destas instituições financeiras, no entanto, é o Eurobic, presidido pelo antigo ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, e dominado por Isabel dos Santos. O salto deu-se quando ganhou a privatização do BPN, entrando em força no negócio a retalho.
Os interesses angolanos estão dispersos por várias áreas, desde construção e imobiliário à agro-indústria, passando pela restauração e ambiente. No caso de Álvaro Sobrinho, ex-presidente do BES Angola, este, depois de ter desinvestido na comunicação social (detinha o Sol via Newshold e chegou aos 15% do capital da Cofina, dona do Correio da Manhã) está ainda ligado ao Sporting (via Holdimo) e a empresas como a Cofaco, dona do atum Bom Petisco. E se por vezes rivalizou em notoriedade com Isabel dos Santos, nos últimos tempos o protagonismo tem sido muito maior por parte da filha do ex-presidente de Angola.
Isabel dos Santos e os problemas por resolver
O caso da Galp é emblemático do momento de tensão entre a empresária e os altos responsáveis do seu país e ainda está por conhecer o real impacto deste divórcio para a petrolífera portuguesa, onde o Estado português conserva uma posição de 7,48%%, através da Parpública. Depois de ter sido exonerada da presidência da Sonangol, em Novembro de 2017, a empresária e o novo líder da petrolífera estatal angolana, Carlos Saturnino, envolveram-se numa troca de acusações em torno do pagamento de dividendos da petrolífera portuguesa.
Segundo o Expresso, a Sonangol queixa-se que nunca recebeu 438 milhões de euros que a Galp terá pago à Esperaza, a título de dividendos relativos ao período entre 2012 e 2016. A Esperaza é a sociedade holandesa partilhada entre a Sonangol (60%) e a filha do ex-presidente angolano (40%) que tem 45% da Amorim Energia. Esta sociedade, igualmente registada na Holanda, tem 33,34% da Galp e é controlada pela família Amorim – através da Power, Oil & Gas Investments, da Amorim Investimentos Energéticos e da Oil Investments, com 55% do capital.
Se a Sonangol diz que não tem registo dos pagamentos de dividendos, Isabel dos Santos afirmou no Twitter que a Sonangol não só recebeu os dividendos da Galp, como “pagou os impostos referentes aos mesmos dividendos às autoridades holandesas”.
Além das polémicas em torno dos dividendos, a assunção pública de que a participação na Galp deixou de ser considerada estratégica pelo Estado angolano coloca a empresa portuguesa na berlinda, já que inevitavelmente terá de ser sujeita a uma recomposição accionista.
Menos polémica na aparência é a parceria que Isabel dos Santos estabeleceu com a Sonae, para fundir a Zon e a Optimus e criar a Nos. "É uma parceria irrepreensível. Os parceiros sempre estiveram muito alinhados", afirmou à Reuters o Chief Corporate Center Officer (CCCO) do grupo português, Luís Reis, no dia seguinte ao da exoneração de Isabel dos Santos do cargo de presidente da Sonangol (em Novembro de 2017).
No entanto, o histórico comprova que a relação não esteve isenta de momentos de sobressalto. Como quando, em Setembro de 2015, a empresária e o grupo português romperam a parceria que tinham para o mercado angolano e Isabel dos Santos resolveu trocar os hipermercados Continente por uma rede própria de hipermercados Candando, recrutando, para construi-la, dois quadros da Sonae. Ou como ainda antes, em Novembro de 2014, quando a operadora brasileira Oi dava sinais de querer vender a PT Portugal à Altice, a empresária avançou sozinha com um comunicado em nome da ZOPT (a sociedade que detém em partes iguais com a Sonae e que controla o capital da Nos) que surpreendeu tudo e todos. Nele afirmava que esta entidade “e os seus accionistas, na qualidade de investidores estratégicos e comprometidos com o mercado de telecomunicações português” manifestavam “a sua disponibilidade para integrar uma solução” que promovesse “a defesa do interesse nacional”.
Com parceiros portugueses, mas já sem o apoio do Estado angolano, Isabel dos Santos mantêm-se no capital da Efacec Power Solutions, onde entrou em 2015, associada à Empresa Nacional de Distribuição de Electricidade (ENDE), com a aquisição de uma participação de 65% (mantendo-se o restante capital nas mãos da MGI Capital, do grupo José de Mello e da Têxtil Manuel Gonçalves).
Em Agosto, a empresária confirmou uma ordem de João Lourenço ao Ministério de Energia e Águas para que a ENDE saísse do capital da Efacec e revelou que as acções da empresa que opera nas áreas da energia, ambiente e transportes seriam “vendidas no mercado internacional”. Falta saber a quem.