FIFA sugere ao Qatar que reparta Mundial 2022 com vizinhos árabes
Gianni Infantino não recua na proposta de uma competição com 48 equipas, número que obrigaria Doha a contornar bloqueio diplomático que se prolonga há 18 meses.
A indicação foi clara e entregue de forma cordial: a FIFA quer, pela primeira vez, um Campeonato do Mundo de futebol com 48 selecções. Ora, apesar de todo o investimento do Governo do Qatar — que está a construir todos os estádios de raiz —, é logisticamente impossível àquele pequeno país receber uma competição com tamanha envergadura. A alternativa passa por partilhar o Mundial 2022 com os vizinhos, situação que se complica quando nos recordamos que os qataris são alvo de um bloqueio imposto por oito países árabes e que se arrasta desde Maio de 2017.
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A indicação foi clara e entregue de forma cordial: a FIFA quer, pela primeira vez, um Campeonato do Mundo de futebol com 48 selecções. Ora, apesar de todo o investimento do Governo do Qatar — que está a construir todos os estádios de raiz —, é logisticamente impossível àquele pequeno país receber uma competição com tamanha envergadura. A alternativa passa por partilhar o Mundial 2022 com os vizinhos, situação que se complica quando nos recordamos que os qataris são alvo de um bloqueio imposto por oito países árabes e que se arrasta desde Maio de 2017.
“Claro que a relação do Qatar com os vizinhos é um factor que dificulta a situação. Por outro lado, apesar de as relações diplomáticas serem complicadas, quando o assunto é sobre futebol, as pessoas conversam”, afirmou Gianni Infantino em entrevista ao The Guardian, assinalando os quatro anos que restam até ao pontapé de saída da competição.
Apesar de admitir que a hipótese de cumprir o desejo de uma competição alargada já em 2022 é “reduzida”, o presidente do organismo que tutela o futebol mundial não perde a esperança: “Talvez o futebol seja uma forma de construir pontes. Na atribuição do Mundial 2026, vimos isso mesmo, com a competição a ir para três países [Estados Unidos, México e Canadá] que, penso, não terem as melhores relações políticas e diplomáticas”.
Maior crise no Golfo Pérsico desde 1990
A situação de partilha do Mundial pedida por Gianni Infantino vai requerer uma ginástica diplomática impressionante, caso o Governo esteja disposto a sentar-se à mesa com os países que isolaram o Qatar nos últimos 18 meses. Desde Maio de 2017 que a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos, o Bahrein e o Egipto cortaram todos os laços com o Governo qatari e impuseram um bloqueio terrestre, marítimo e aéreo ao país, acusando-o de “apoio ao terrorismo” e de “interferência constante nos [seus] assuntos internos”. Os países redigiram uma lista com 13 exigências prontamente rejeitadas pelo Governo do Qatar. A maior crise no Golfo Pérsico desde a invasão do Kuwait, em 1990, observou uma escalada constante que se prolongou durante meses. Ano e meio após ter começado, ainda não há fim à vista para o imbróglio diplomático.
O bloqueio asfixiou a economia qatari, afectando o fornecimento de alguns bens de primeira necessidade, principalmente alimentares. O país desértico importa 90% dos alimentos, fazendo-o em grande parte pela fronteira com a Arábia Saudita e pelo porto de Yebel Ali (Emirados Árabes Unidos). O Governo qatari voltou-se então para o Irão e para a Turquia, utilizando rotas alternativas para a importação de bens.
Os bolsos fundos do emirado ajudaram, em grande parte, à sobrevivência do país, que continuou a injectar dinheiro na construção de infra-estruturas para o Mundial. A quatro anos para o pontapé de saída da prova, ainda muito pode mudar na conjuntura política e económica da região mas a mensagem da FIFA é clara: quanto maior a competição, melhor.
Qatar explora trabalhadores, acusa Amnistia Internacional
Desde que foi entregue ao Qatar a organização do primeiro Mundial no Médio Oriente que várias instituições e organizações não-governamentais escrutinam atentamente a situação dos trabalhadores envolvidos na construção dos estádios da competição. A Amnistia Internacional (AI) já apontou o dedo, por várias vezes, ao emirado, denunciando práticas eticamente reprováveis no que diz respeito às condições laborais das centenas de milhares de migrantes contratados para a edificação dos recintos desportivos.
No mais recente relatório publicado pela AI o alvo é a Mercury Mena, empresa de engenharia qatari, acusada de dever milhares de euros em salários e benefícios laborais a trabalhadores migrantes. A grande maioria destes homens são naturais da Índia, Filipinas e do Nepal, aponta a ONG.
Documentos publicados pela Pravasi Nepali Co-ordination Committee — organização nepalesa que zela pelos direitos dos migrantes — revelaram que, nos primeiros quatro anos de construção (2010-14), morreram mais de 400 trabalhadores provenientes do país da região dos Himalaias. As altas temperaturas, falta de condições de segurança e horários longos são as principais razões apontadas para o elevado número de mortes nos estádios qataris.
“O agente [de emprego] disse-me: ‘O Qatar é o país mais rico do mundo, pesquisa no Google’. Garantiu-me que ia ganhar um salário enorme mas, quando chegamos aqui, vimos que era o oposto”, confessou um dos trabalhadores, sob anonimato, ao The Guardian. Entre outras coisas, o jornal britânico revela que, apesar das condições climáticas extremas, os trabalhadores recebem, aproximadamente, 200 euros por mês, vivendo em complexos que podem chegar a albergar cinco mil pessoas.