Accionistas pressionam Isabel dos Santos a sair da gestão da Unitel
Empresária quer manter-se na liderança do conselho de administração da operadora, mas Sonangol e Oi rejeitam.
O equilíbrio de forças alterou-se na Unitel, a operadora que domina o mercado de telecomunicações angolano e que há muito está no centro de uma disputa entre a PT Ventures – que antes era da antiga Portugal Telecom e hoje pertence à brasileira Oi – e a empresária Isabel dos Santos.
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O equilíbrio de forças alterou-se na Unitel, a operadora que domina o mercado de telecomunicações angolano e que há muito está no centro de uma disputa entre a PT Ventures – que antes era da antiga Portugal Telecom e hoje pertence à brasileira Oi – e a empresária Isabel dos Santos.
No final deste ano termina o mandato dos actuais órgãos sociais (Isabel dos Santos é presidente do conselho de administração e o general Leopoldino do Nascimento, próximo de José Eduardo dos Santos, é o presidente da mesa da assembleia-geral) e os quatro accionistas da Unitel (cada um com 25% do capital), divididos em dois blocos, têm diferenças irreconciliáveis sobre este tema. De um lado estão a Vidatel (de Isabel dos Santos) e a Geni (do general “Dino”) e, de outro, a Mercury (da Sonangol) e a PT Ventures (da Oi).
Nas últimas semanas, duas assembleias-gerais (AG) de accionistas da operadora liderada pela filha do ex-presidente de Angola saldaram-se com dois empates graças a este novo alinhamento entre sócios, apurou o PÚBLICO.
Se a Vidatel e a Geni querem a renovação dos mandatos da empresária e do general “Dino”, já a PT Ventures e a Mercury querem nomear outros responsáveis. Segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO, a ideia seria escolher para o lugar de presidente do conselho um independente, uma figura proeminente da sociedade angolana sem nenhuma ligação especial aos accionistas, seguindo-se a mesma lógica para o cargo de presidente da mesa da AG. A gestão executiva, que agora cabe a Antony Dolton, um homem de confiança de Isabel dos Santos, seria também atribuída a um gestor profissional que reunisse a aprovação dos sócios.
O PÚBLICO questionou directamente Isabel dos Santos sobre a sua vontade de manter-se na liderança da administração da Unitel para um novo mandato e sobre a possibilidade de serem nomeados novos órgãos sociais para a operadora de telecomunicações. "A Unitel é uma empresa privada angolana e os seus órgãos sociais têm mandatos em vigor e sem alterações previstas", respondeu fonte oficial da Unitel.
O acordo parassocial da Unitel determina que a forma de dirimir os litígios entre accionistas é o recurso à arbitragem internacional, pelo que esta opção está a ser avaliada, caso se mantenha o braço de ferro na eleição dos órgãos sociais, que a partir do próximo ano deixará a operadora numa situação irregular.
Se durante anos a PT, e depois a Oi, estiveram em desvantagem no confronto de posições com a filha do ex-presidente de Angola, a mudança de ciclo político também trouxe alterações na forma como a Sonangol, a petrolífera estatal, encara a sua presença na empresa.
Na semana passada, o líder da petrolífera, Carlos Saturnino, revelou, na conferência de apresentação do Programa de Regeneração da Sonangol, que a companhia estatal quer concentrar-se nas actividades consideradas nucleares e que, para isso, vai desfazer-se de participações nos sectores das telecomunicações, banca e prestação da serviços à indústria petrolífera. Segundo o Jornal de Angola, na lista de 52 activos não estratégicos a alienar está também a MSTelcom – Mercury Serviços de Telecomunicações, subsidiária através da qual a Sonangol tem 25% da Unitel. E citado por alguns meios de comunicação angolanos, como o Mercado e o Novo Jornal, Carlos Saturnino confirmou que a Sonangol pretende alienar a participação na Unitel até Dezembro de 2019.
Contas por acertar e acções em Paris e Amesterdão
Quem também já colocou a Unitel nos activos disponíveis para venda foi a Oi. No entanto, a empresa brasileira que está a braços com um plano de revitalização e precisa de liquidez, tem um problema bicudo para resolver com a operadora angolana antes ainda de poder pensar em desfazer-se deste activo: os brasileiros (através da PT Ventures) reclamam à Unitel cerca de 578 milhões de euros (dados do relatório e contas de 2017) em dividendos por pagar relativos aos exercícios de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014, que a operadora começou a reter ainda no tempo da antiga PT.
A Oi iniciou mesmo um processo de arbitragem internacional em Paris – cujo desfecho deverá ser conhecido até ao final do primeiro trimestre do próximo ano – contra os parceiros na Unitel, mas também tem a correr na justiça holandesa um processo que visa especificamente Isabel dos Santos. Isto porque é na Holanda que está registada a sociedade Unitel International Holdings, a sociedade detida por Isabel dos Santos e que é accionista da Nos (através do veículo ZOPT, detido em partes iguais pela Sonae, dona do PÚBLICO, e pela empresária angolana).
Foi à Unitel International Holdings que a operadora Unitel autorizou empréstimos de 360 milhões de euros, com a assinatura de Isabel dos Santos a aparecer tanto do lado de quem empresta como do lado de quem pediu emprestado. Deste dinheiro, pelo menos 300 milhões foram utilizados para controlar a antiga Zon e participar na fusão com a Optimus, que deu origem à Nos (de onde, no ano passado, Isabel dos Santos retirou 40 milhões em dividendos).
Mas a justiça holandesa não está apenas a olhar para os empréstimos da Unitel SA (a empresa angolana) à Unitel International Holdings (a empresa de Isabel dos Santos registada em Amesterdão), porque este caso surge interligado com outras transacções entre a Unitel SA e outra sociedade de Isabel dos Santos registada nas ilhas Virgens Britânicas – a Tokeyna –, que no entender da PT Ventures evidenciam, segundo o processo consultado pelo PÚBLICO, a actuação ilícita da empresária angolana e a forma como alegadamente usou a Unitel SA em benefício próprio.
No entanto, se a Oi acusa os parceiros angolanos (incluindo a Sonangol, por via da Mercury) de a estarem a prejudicar, estes também têm razão de queixa e procuram igualmente provar em sede de arbitragem internacional que a transferência pela antiga PT de uma participação minoritária na Africatel (a holding onde estavam reunidas todas as participações em activos africanos) para a Oi (em 2015) não respeitou o acordo de accionistas.
Independentemente dos processos que colocam estas empresas em lados opostos da barricada, há neste momento uma convergência de interesses entre a Oi e a Sonangol, pois segundo fontes ouvidas pelo PÚBLICO, a probabilidade de a Unitel ser bem vendida – leia-se, com mais-valias para os actuais accionistas – está directamente ligada à mudança da gestão da companhia, nomeadamente ao afastamento de Isabel dos Santos.
Por outro lado, apesar do aparente impasse entre accionistas ao nível da substituição dos órgãos sociais, a mensagem de que a Unitel vai ser vendida está dada, e com certeza não chegou só aos ouvidos de Isabel dos Santos, chegou também a potenciais interessados multinacionais em adquirir o líder angolano das telecomunicações, que em 2017 tinha 75% do mercado móvel, cerca de dez milhões de clientes, segundo dados do regulador Inacom.