Republicanos fazem história na Florida, no meio de uma "onda" democrata
As recontagens de votos confirmaram Rick Scott como novo senador da Florida, tirando o lugar a Bill Nelson, do Partido Democrata. Desde 1875 que o estado não tinha dois senadores republicanos ao mesmo tempo.
Ao fim de 12 dias e de duas recontagens de votos no estado norte-americano da Florida, o candidato do Partido Republicano viu confirmada a sua vitória na corrida para o Senado. Com este resultado, os dois lugares de senadores atribuídos à Florida passam a ser ocupados por políticos republicanos, algo que não acontecia há quase 150 anos.
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Ao fim de 12 dias e de duas recontagens de votos no estado norte-americano da Florida, o candidato do Partido Republicano viu confirmada a sua vitória na corrida para o Senado. Com este resultado, os dois lugares de senadores atribuídos à Florida passam a ser ocupados por políticos republicanos, algo que não acontecia há quase 150 anos.
O novo senador é Rick Scott, de 65 anos, um multimilionário que fez fortuna no maior grupo de saúde privado dos Estados Unidos e que era governador do estado desde Janeiro de 2011.
Scott demitiu-se da presidência da Columbia/HCA em 1997, num processo que levaria o Departamento de Justiça a aplicar à empresa uma multa de 600 milhões de dólares (525 milhões de euros à cotação actual) por defraudar programas de saúde estatais como o Medicare e o Medicaid. Desde então, candidatou-se por três vezes a importantes cargos políticos pelo Partido Republicano e ganhou sempre – em 2010 e 2014 foi eleito e reeleito governador da Florida, e agora venceu a corrida ao Senado do país.
Este lugar no Senado era ocupado por Bill Nelson, de 76 anos, um veterano do Partido Democrata que foi eleito pela primeira vez em 1972, para a Câmara dos Representantes, e que sempre cultivou uma imagem de centrista.
Exemplo disso foi a mensagem de despedida do outro senador da Florida, Marco Rubio, do Partido Republicano: "Nenhuma dupla de senadores teve uma relação de trabalho tão boa como o senador Nelson e eu. Muitas vezes votámos de forma diferente, mas nunca deixámos que isso prejudicasse a nossa capacidade para trabalhar em conjunto. Ele serviu com uma decência e uma dignidade que são cada vez mais raras na política. Vou ter saudades de trabalhar com ele."
A partir de Janeiro, Scott vai juntar-se a Rubio no Senado, numa dupla de senadores do Partido Republicano eleitos pelo estado da Florida que já não acontecia desde 1875 – numa altura em que os Estados Unidos discutiam a reconstrução do país após a Guerra Civil.
"Verdade ameaçada"
Na hora da saída, Bill Nelson admitiu que "as coisas acabaram por acontecer de uma forma um pouco diferente" daquilo que esperava, mas disse que não se sente derrotado. "Tive o privilégio de servir o povo da Florida durante a maior parte da minha vida. Tem sido uma viagem gratificante e uma experiência de grande humildade. Não há ninguém mais abençoado", disse Bill Nelson numa declaração gravada em vídeo.
Mas também houve espaço para um comentário dirigido a Donald Trump, ainda que o experiente político do Partido Democrata não tenha pronunciado o nome do Presidente norte-americano.
"Temos de nos afastar de uma política que tem como objectivo não apenas derrotar, mas também destruir. Em que a verdade é ameaçada como se fosse descartável, em que as falsidades abundam e em que a imprensa livre é atacada como se fosse o inimigo do povo", disse Nelson.
Numas eleições marcadas por acusações de fraude eleitoral, protestos e processos em tribunal que trouxeram à memória o dramatismo de Novembro de 2000, quando todos os olhos se colaram à corrida para a Casa Branca entre George W. Bush e Al Gore, o senador eleito disse que chegou a hora de seguir em frente.
"Agora a campanha ficou definitivamente para trás, e é aí que tem de ficar", disse Rick Scott no discurso de vitória. Temos de fazer o que os americanos sempre fizeram: unir-se para o bem do nosso estado e do nosso país."
O processo de recontagem dos resultados foi iniciado de forma imediata, sem intervenção dos tribunais, depois de Scott ter terminado as eleições de 6 de Novembro com apenas mais 12 mil votos do que Nelson, num universo de mais oito milhões de eleitores – menos do que os 0,5% exigidos pela lei do estado para uma recontagem imediata, feita nas máquinas usadas nas secções de voto.
Só que a diferença manteve-se depois dessa primeira recontagem, o que activou uma segunda recontagem imediata, desta vez manual. E foi este processo que ficou concluído no domingo – no final, Rick Scott venceu com mais dez mil votos do que Bill Nelson.
Todos ganharam?
Com esta vitória, o Partido Republicano aumenta a sua maioria no Senado de 51 para 52 lugares, contra 47 do Partido Democrata.
Em aberto fica apenas um lugar, no Mississippi, que só será preenchido no dia 27 de Novembro, depois de nenhum dos candidatos ter terminado as eleições de 6 de Novembro com mais de 50% dos votos.
Em causa está uma eleição especial, para substituir o ex-senador Ted Cochran, do Partido Republicano, que anunciou a renúncia ao cargo em Março passado por questões de saúde. A candidata do Partido Republicano, Cindy Hyde-Smith, vai à frente nas sondagens na corrida contra o candidato do Partido Democrata, Mike Espy.
Se Hyde-Smith derrotar Espy, a próxima sessão do Senado, que começa em Janeiro de 2019, vai ter 53 senadores do Partido Republicano e 47 do Partido Democrata – um resultado que o Presidente Donald Trump considera ser um enorme sucesso, já que alarga a anterior maioria republicana de 51-49.
Mas esta história de sucesso é temperada por outros factores.
Em primeiro lugar, o Partido Democrata tirou a maioria ao Partido Republicano na câmara baixa do Congresso, a Câmara dos Representantes, permitindo-lhe matar à nascença a esmagadora maioria das propostas de lei apoiadas pelo Presidente Trump, à excepção das importantes nomeações para o Supremo Tribunal e tribunais federais, que são da competência exclusiva do Senado.
É na Câmara dos Representantes, por exemplo, que se discute e aprova a abertura de investigações ao Presidente norte-americano, e que se propõem processos de destituição.
Em segundo lugar, o mapa eleitoral deste ano era muito favorável aos candidatos do Partido Republicano ao Senado. De dois em dois anos, apenas um terço dos 100 lugares no Senado estão em jogo, para que os 50 estados não tenham os seus dois representantes em campanha permanente – este ano em particular, dos 35 lugares em discussão, o Partido Democrata tinha de defender 26 e o Partido Republicano apenas nove.
Para além disso, desses 26 lugares do Partido Democrata que estavam em jogo, dez eram em estados onde Donald Trump foi o candidato mais votado nas presidenciais de 2016; do outro lado, o Partido Republicano defendia apenas um lugar onde Hillary Clinton foi a mais votada há dois anos.
"Onda" democrata
No final, o Partido Republicano ganhou quatro lugares nos 26 que o Partido Democrata defendia (Florida, Indiana, Missouri e Dacota do Norte). E o Partido Democrata tirou pelo menos dois lugares dos nove defendidos pelo Partido Republicano (Nevada e Arizona, faltando saber o resultado no Mississippi).
Nestas condições, e apesar de a maioria do Partido Republicano no Senado ter aumentado, quase todos os candidatos do Partido Democrata tiveram resultados muito superiores ao que é habitual em cada estado para o seu partido – incluindo nos dez em que Donald Trump foi mais votado do que Hillary Clinton em 2016, segundo uma análise do site FiveThirtyEight.
"Alguns republicanos dizem que em 2018 não houve uma 'onda' dos democratas porque eles alargaram a sua maioria no Senado. Isso é errado", diz Harry Enten, especialista da CNN em resultados eleitorais. "Olhando para o exigente mapa, os democratas tiveram um resultado em linha com o que se espera quando há uma 'onda'", vencendo em cerca de 69% das corridas para o Senado, salienta Enten.
A ideia de que o Partido Republicano teve uma grande vitória nas eleições do dia 6 de Novembro ao alargar a sua maioria no Senado resulta também do facto de cada estado ter direito a dois senadores, independentemente da sua população.
É por causa desta regra que tanto a Califórnia (com quase 40 milhões de habitantes) como o Wyoming (com menos de 600 mil) elegem dois senadores cada – apesar de os candidatos do Partido Democrata terem recebido, ao todo, mais 16 milhões de votos do que os candidatos do Partido Republicano.