Refugiados: A vida em Portugal? “Muito difícil”

Três famílias de refugiados de Miranda do Corvo têm o problema temporariamente resolvido, mas continuam a enfrentar dificuldades de integração.

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O caso das três famílias sírias de Miranda do Corvo levantou interrogações sobre o processo de integração dos refugiados em Portugal, tendo já levado a várias reacções de responsáveis políticos. Às próprias famílias, a situação levantou interrogações sobre o futuro próximo.

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O caso das três famílias sírias de Miranda do Corvo levantou interrogações sobre o processo de integração dos refugiados em Portugal, tendo já levado a várias reacções de responsáveis políticos. Às próprias famílias, a situação levantou interrogações sobre o futuro próximo.

Por agora, o corte de luz e água está resolvido. Os dois serviços, que tinham sido cessados há menos de uma semana foram retomados ao final de quarta-feira e um acordo para o alojamento entre as três famílias e a Fundação Assistência para o Desenvolvimento e Formação Profissional (ADFP), a instituição que os acolheu no âmbito do programa de integração de 18 meses, foi alcançado. A tradutora Asma Ben Salem confirma por telefone que uma família de quatro pessoas e outra de cinco vão permanecer no edifício da ADFP até encontrarem outra solução. A outra família de quatro pessoas vai viver para outro apartamento na zona.

Na manhã de quarta-feira, ao terceiro dia sem água nem luz, uma das mulheres abria porta ao PÚBLICO e fazia um resumo da situação num português hesitante: o corte deveu-se à falta de pagamento de renda que, desde o final do programa de apoio, a ADFP pede. São 340 euros por cada T3. “É muito caro. A Segurança Social paga a todas as famílias 500 euros. Com comer, luz, água, é muito difícil”, explica.

Depois, há o processo de encontrar outra habitação. “Queremos sair, mas as casas são muito caras”, afirma, para acrescentar que há situações em que dizem que, se não for português, não arrendam. Para além da barreira linguística, há algum receio das consequências da exposição nestas famílias sírias. Pedem por isso que os nomes e as caras não sejam publicados. “Cheguei a Portugal para ter uma vida melhor”, não para isto, desabafa um jovem de 21 anos, acrescentando que já houve quem lhes tivesse dito directamente que não gosta de árabes. “Não sei o que vamos fazer depois se não pudermos arranjar uma casa”, desabafa.

As três famílias viviam em Damasco, que deixaram há seis anos. Voltar não é opção e as casas foram destruídas. Seguiram-se quatro anos no Egipto, com jornadas de trabalho de 17 a 18 horas, conta um deles, e detenções arbitrárias de sírios mais jovens pelas autoridades do Cairo. Quando a possibilidade de vir para a Europa chegou via Organização Internacional das Migrações, o destino não lhes foi dado a escolher.

No entanto, agora, dada a situação, um dos mais velhos já equaciona voltar ao Egipto, onde pelo menos tem a língua em comum. “Lá pode trabalhar, aqui não”, diz ao lado da esposa o homem de 67 anos, que se vai explicando com a tradução do neto de 21. Quando veio, pensou “que a vida ia melhorar”. Ao dizer isto, fazem uma pausa, emocionam-se e cobrem a cara com as mãos. O casal de idosos vive num apartamento que a ADFP arrendava até ao final de Outubro no âmbito do programa. Ao não pagarem da renda deste mês, o senhorio cortou também a água e a luz.

As dificuldades de integração reflectem-se no dia-a-dia, diz o jovem, que fala de exemplos que vão desde dificuldades em compreender o que está a ser leccionado nas escolas ao problema em a avó se fazer entender quando foi atendida no Centro Hospitalar da Universidade de Coimbra (CHUC). O gabinete de comunicação do CHUC explica que nunca lhe foi “reportada nenhuma questão que não tenha ficado resolvida” na comunicação entre doentes estrangeiros e médicos, admitindo que possa ter acontecido. O PÚBLICO tentou contactar a direcção do Agrupamento de escolas de Miranda do Corvo, sem sucesso.

Fundação contradiz

Durante o ano e meio de programa, os refugiados tiveram direito a casa apetrechada e com água, luz e gás sem custos, explica a coordenadora do programa de acolhimento de refugiados da ADFP, Paula Santos. Além disso recebem também um apoio monetário que, no caso de uma família de cinco pessoas, se fixa em “aproximadamente 1000 euros por mês”. São igualmente inseridos no programa Português para Todos do Instituto do Emprego e Formação Profissional, assim que recebem a documentação portuguesa.

Jaime Ramos, que preside à ADFP, tem uma versão diferente da contada pelas três famílias. “No final do processo [de 18 meses], é suposto que organizem projectos de vida”, enfatiza. “Estas famílias optaram, ao contrário das outras, por nunca aceitarem propostas de trabalho”, acrescentando também que as famílias “não queriam assumir nenhuma despesa” e que recebem entre 650 a 800 euros da Segurança Social. Todavia, Jaime Ramos diz que, “por este conjunto, não podemos estigmatizar os outros”. Desde 2015 que a instituição já acolheu 88 refugiados, recebendo para isso apoio do Estado e da Comissão Europeia. O médico e político que há 31 anos fundou a ADFP sublinha também que os apartamentos onde as famílias estão instaladas são novos. Ainda assim, com marcas evidentes de humidade nos tectos e paredes, mostra ao PÚBLICO uma das refugiadas, pouco antes de oferecer café sírio.