Bangladesh vai começar a repatriar refugiados rohingya para a Birmânia

A maioria dos refugiados diz não querer voltar à Birmânia. Num cenário de pânico, muitas das famílias na lista fogem para outros campos de refugiados. As organizações internacionais consideram que se trata de uma violação dos princípios legais internacionais.

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O primeiro grupo deverá ser repatriado esta quinta-feira NYEIN CHAN NAING/EPA

As autoridades do Bangladesh anunciaram esta quarta-feira estar prontas para iniciar o processo de repatriação dos mais de 700 mil rohingyas refugiados na cidade de Cox’s Bazar, que desde de 2017 fogem à violência e limpeza étnica na Birmânia. Apesar dos pedidos da ONU e dos relatos dos rohingyas de que não querem regressar, os governos dos dois países mantêm-se firmes na decisão de repatriar a minoria muçulmana a partir desta quinta-feira.

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As autoridades do Bangladesh anunciaram esta quarta-feira estar prontas para iniciar o processo de repatriação dos mais de 700 mil rohingyas refugiados na cidade de Cox’s Bazar, que desde de 2017 fogem à violência e limpeza étnica na Birmânia. Apesar dos pedidos da ONU e dos relatos dos rohingyas de que não querem regressar, os governos dos dois países mantêm-se firmes na decisão de repatriar a minoria muçulmana a partir desta quinta-feira.

O comissário responsável pelos refugiados, repatriação e reabilitação no Bangladesh, Abul Kalam, revelou que 30 famílias de refugiados serão levadas quinta-feira até ao posto fronteiriço de Ghumdhum. Um comunicado do Governo birmanês avançou que um grupo inicial de 2251 refugiados seria o primeiro a regressar a casa, prevendo o envio de 150 pessoas por dia.

O Exército, a polícia e tropas paramilitares estão destacadas nos vários campos de refugiados. “O Exército está em todos os cantos, e as pessoas têm medo de sair à rua”, disse ao The Guardian um dos refugiados, Qadar. Outra testemunha, Jani, disse que a segurança duplicou nos últimos dois dias.

Os testemunhos dos refugiados revelam que são coagidos pelas autoridades a regressar, e que muitos ainda temem pela sua segurança. Há quem prefira a morte a voltar — já foram registadas duas tentativas de suicídio desde que o processo de repartição foi anunciado, diz o The Guardian.

“Eu disse-lhes que tinha medo de regressar à Birmânia, porque ainda é muito perigoso para todos os rohingyas, mas eles disseram que não há por onde escapar e que temos de regressar dentro de uns dias”, disse Mohammad Ismail, residente no campo de Jamtoli com a sua esposa e seis filhos.

Uma das maiores preocupações é a falta de segurança e o regresso para parte incerta. De acordo com o comunicado do Governo birmanês, os rohingyas ficarão em “campos de repatriação” durante dois dias, onde lhes serão dadas refeições e roupa, antes de serem transferidos para “campos de transição”. A partir daí, o futuro é incerto, pois não é especificado quanto tempo têm de permanecer nestes “campos”, nem para onde irão depois — as aldeias rohingyas foram dizimadas.

Ainda assim, a agência AFP apurou que se a segurança fosse garantida, cerca de 400 famílias estariam dispostas a regressar: “Temos as malas preparadas. Iriamos hoje, se nos fosse dada segurança”, disse o refugiado Jyotsna Bala Paul à AFP.

O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (UNHCR) apelou em comunicado a que os rohingyas possam visitar a sua terra natal "de forma segura e digna” antes de serem repatriados definitivamente, já que consideram que “as condições do estado de Rakhine não são propícias ao regresso voluntário, seguro, digno e sustentável dos refugiados”.

A especialista das Nações Unidas para os Direitos Humanos na Birmânia, Yanghee Lee, disse em comunicado que não encontrou “quaisquer provas” de que o Governo birmanês tenha tomado medidas para criar um “ambiente onde os rohingyas possam regressar” e viver com os seus direitos fundamentais garantidos.

A alta-comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, apelou em comunicado para que o processo de repatriação seja cancelado. Considera que coloca a vida e liberdade dos rohingyas “em sério risco” e representa uma “violação da lei internacional” que protege os refugiados de serem repatriados quando a sua integridade física e liberdade está em risco.

Bachelet pediu ainda que o Governo do Bangladesh se assegure de que as repatriações são “voluntárias, seguras, dignas e transparentes”, salientando que a ONU continua a receber relatos de “assassinatos, desaparecimentos e detenções arbitrárias” em Rakhine.

O vice-Presidente norte-americano, Mike Pence, condenou esta quarta-feira o tratamento dado aos rohingyas e a detenção dos dois jornalistas da Reuters durante a cimeira do sudeste asiático, em Singapura. A líder da Birmânia, Aung San Suu Kyi, que foi privada do título de Embaixadora da Consciência da Amnistia Internacional por já não ser “um símbolo de esperança, coragem e defesa eterna dos direitos humanos” devido à crise dos rohingyas, respondeu que percebe o seu país “melhor do que qualquer outro”.