O superclásico em três histórias
Boca Juniors e River Plate jogam neste sábado a primeira mão da final da Copa Libertadores, em mais um capítulo da maior e mais feroz rivalidade do futebol argentino.
É mais ou menos consensual que 40 por cento dos argentinos são do Boca Juniors e 30 por cento são do River Plate, sendo que, fora desta percentagem está o Papa Francisco, adepto ferrenho do San Lorenzo de Almagro, e Manu Ginobili, que será um dos poucos argentinos que não gosta de futebol. Nenhum deles estará, então, particularmente interessado no que irá acontecer neste sábado no La Bombonera, em Buenos Aires, onde Boca Juniors e River Plate se irão defrontar para a primeira mão da final da Copa Libertadores (20h, SPTV3), a primeira vez que duas equipas argentinas se defrontam na decisão da maior competição de clubes da América do Sul.
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É mais ou menos consensual que 40 por cento dos argentinos são do Boca Juniors e 30 por cento são do River Plate, sendo que, fora desta percentagem está o Papa Francisco, adepto ferrenho do San Lorenzo de Almagro, e Manu Ginobili, que será um dos poucos argentinos que não gosta de futebol. Nenhum deles estará, então, particularmente interessado no que irá acontecer neste sábado no La Bombonera, em Buenos Aires, onde Boca Juniors e River Plate se irão defrontar para a primeira mão da final da Copa Libertadores (20h, SPTV3), a primeira vez que duas equipas argentinas se defrontam na decisão da maior competição de clubes da América do Sul.
São 70 por cento dos argentinos com um investimento emocional gigante e que atravessa o país inteiro nesta rivalidade apaixonada e feroz com mais de um século de existência e que já teve 210 Superclásicos. Os números são equilibrados: 77 vitórias para o Boca, 69 para o River e 65 empates. Maradona estará, por certo, no seu lugar habitual na Bombonera para ver um jogo do qual já foi protagonista, mesmo que nenhuma das equipas esteja num grande momento. Até podiam estar ambas em campeonatos secundários, que um Boca-River movimentaria os mesmos 70 por cento da Argentina.
O barco sueco e o caixote
Com a diferença de quatro anos, River Plate (1901) e Boca Juniors (1905) nasceram no mesmo bairro do sudeste de Buenos Aires, o La Boca, perto do porto. O Boca ficou em La Boca, o River mudou-se para um bairro nobre da capital e ganhou a fama de clube dos ricos – chamam-lhe os “millonários”. Pela fidelidade às origens, o Boca ficou sempre como o clube das classes mais baixas, sendo que ambos os clubes são transversais ao país – antes de ser Presidente da Argentina, Maurício Macri foi presidente do Boca. Mas, há mais de um século, eram ambos clubes com forte influência dos europeus que iam para a Argentina, como as cores do Boca ou o nome do River.
Conta a lenda que em 1906, o Boca e o Nottingham de Almagro, duas equipas com equipamentos iguais (riscas brancas e pretas verticais) fizeram um jogo para decidir quem teria o direito de manter as cores. O Boca perdeu e decidiu mudar usando as cores do primeiro navio que aportasse em Buenos Aires. Foi um barco com bandeira sueca e assim o Boca ganhou o amarelo e o azul que mantém até hoje. Já o River, que nasceu da fusão de dois clubes, ganhou o seu nome de uma inscrição num caixote que um dos seus fundadores viu enquanto trabalhava no Porto. O caixote vinha de Inglaterra e tinha escrito “River Plate”, o nome que os ingleses davam ao Rio de la Plata.
La puerta 12
Meio século depois, é uma tragédia que continua sem culpa. A 23 de Junho de 1968, 71 adeptos do Boca Juniors morreram esmagados contra a porta 12 do Estádio Monumental nos minutos finais de um River-Boca. Nunca se percebeu por que razão é que essa porta destinada aos adeptos visitantes estava fechada quando muitos “hinchas” do Boca resolveram sair. Os adeptos que foram saindo encontram a grade de segurança da porta trancada, ficaram sem hipóteses de sair ou voltar a subir as escadas, porque a avalanche de pessoas em direcção à porta continuava. O pânico instalou-se e a tragédia aconteceu: 71 mortos e 113 feridos, com muitas crianças entre as vítimas. Culparam-se as autoridades, culpou-se o River, mas nunca se conseguiu esclarecer por que razão a porta 12 estava fechada naquele dia.
A estreia do “dez”
Aos 21 anos, Diego Armando Maradona já era uma “estrela” na Argentina e desejado pelos dois “grandes” de Bueno Aires. Os millonários fizeram justiça ao nome e ofereceram a Diego uma proposta irrecusável, enquanto o Boca estava na falência. Mas o River não tinha dinheiro suficiente para cobrir a paixão de Diego e do pai pelo Boca. Como o clube do coração não tinha dinheiro para ele, Maradona meteu a circular que estava perto do Boca para forçar a mão do clube a “inventar” 13 milhões de dólares para o resgatar ao Argentinos Juniors. Não havia qualquer proposta, mas passou a haver e, segundo conta Maradona, o Barcelona de Espanha também contribuiu, reservando o “dez” para a época seguinte.
O Boca pagaria quatro milhões e seis jogadores por Maradona e, dois meses depois, iria defrontar o River na Bombonera. A 10 de Abril, numa noite de chuva, Miguel Brindisi fez o primeiro dos seus dois golos no jogo após uma jogada espectacular de Maradona. A verdadeira explosão de “El Pibe” aconteceu depois, numa jogada de Córdoba pelo flanco, cruzamento para Diego, domínio impossível da bola e remate, fechando o Superclásico com um 3-0 para o Boca. Dezasseis anos depois desse jogo, com toda uma vida de altos e baixos pelo meio, foi num Superclásico de 1997 no Monumental que Maradona deixou de jogar.