Como autarca, Rio foi severo com a assiduidade dos trabalhadores
Durante os 12 anos em que presidiu à Câmara do Porto, o autarca do PSD fez um combate feroz às baixas fraudulentas e rompeu com o excesso de chefias internas.
Rui Rio parece ter deixado para trás a “tolerância zero” que aplicou aos trabalhadores da Câmara do Porto. Enquanto presidente do segundo município do país, eleito em 2001, foi considerado um autarca austero para com os funcionários, exigindo-lhes mais assiduidade, menos laxismo, pondo-os até, por via dos testes aleatórios semanais, a consumir menos álcool no refeitório da câmara.
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Rui Rio parece ter deixado para trás a “tolerância zero” que aplicou aos trabalhadores da Câmara do Porto. Enquanto presidente do segundo município do país, eleito em 2001, foi considerado um autarca austero para com os funcionários, exigindo-lhes mais assiduidade, menos laxismo, pondo-os até, por via dos testes aleatórios semanais, a consumir menos álcool no refeitório da câmara.
Agora, enquanto presidente do PSD, Rui Rio adopta uma postura mais condescendente. Foi assim com o seu primeiro secretário-geral, Feliciano Barreiras Duarte, que se demitiu, e é agora com José Silvano, que, enquanto deputado, registou presença em sessões parlamentares nas quais não participou. Além de manter a confiança politica em José Silvano, o líder social-democrata reduz o caso a uma “pequena questiúncula”.
Foi no segundo ano do primeiro mandato que emergiram os conflitos com os trabalhadores municipais (e também com algumas instituições da cidade). Rio queria ter uma palavra a dizer sobre o funcionamento orgânico da câmara e não abdicou disso. O seu foco era combater o “laxismo reinante” que considerava haver então na autarquia, as baixas médicas fraudulentas e a pequena corrupção sistémica.
Uma ex-funcionária da câmara recorda-se bem dos “anos de chumbo” de Rio. “Abria guerra com toda a gente e era muito rígido com os funcionários, acusando-os de serem preguiçosos, analfabetos, faltosos e alcoólicos”, recorda a ex-funcionária, afirmando que foi com ele que foi introduzido o sistema de assiduidade digital.
“Na altura, era muito escrupuloso com os funcionários, mas agora defende o secretário-geral do PSD que não aparece nos plenários da Assembleia da República, quando o seu nome conta do registo das presenças”, aponta a ex-funcionária, em declarações ao PÚBLICO.
“Rui Rio levava os processos disciplinares que eram instaurados aos trabalhadores às reuniões públicas do executivo, mostrando, desta forma, que tinha mão-de-ferro sobre os trabalhadores da câmara”, relata ainda a antiga trabalhadora municipal.
Quando chegou à presidência, Rui Rio constatou que havia uma “taxa de absentismo brutal” e, nesse sentido, pediu à Direcção de Recursos Humanos que fizesse um levantamento da situação. De acordo com os serviços, a taxa de absentismo era da ordem dos 6,8% (4,2% nos cargos de direcção), num universo de 3536 trabalhadores, um número que a nova maioria na autarquia na altura considerava elevado. “Em média, cada funcionário teria faltado 21 dias ao trabalho ao longo do ano de 2001. Contas feitas, verificou-se que dos 46 milhões de euros gastos em encargos com pessoal, cerca de 10% Câmara do Porto corresponderiam ao pagamento de horas extraordinárias.
O combate às baixas fraudulentas fazia o seu caminho com alguns destes casos a serem remetidos para a Ordem dos Médicos e para o Departamento de Investigação e Acção Penal. O passo seguinte foi na direcção de adoptar um regulamento interno que previa testes de alcoolemia para todos os funcionários. E o princípio era: quem fosse apanhado com uma taxa igual ou superior a 0,5 gramas por litro de álcool no sangue seria alvo de um processo disciplinar e, no limite, suspenso. Mas sem maioria absoluta a medida acabaria chumbada.
No mandato seguinte, o segundo, já com maioria absoluta, Rui Rio volta à carga em 2006 e faz aprovar o regulamento. Abriu uma forte contestação interna com queixas dos representantes sindicais dos trabalhadores. Porém, a medida não esteve em vigor muito tempo, porque um parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados considerou ilegal o recurso da autarquia a este tipo de testes.
Câmara do Porto e Comissão Nacional de Protecção de Dados incompatibilizam-se e enquanto corria nos tribunais um processo, o município decidiu continuar a fazer os testes de alcoolemia, contrariando todas as orientações. Anos mais tarde e depois de ter corrido muita tinta sobre o tema, o Supremo Tribunal Administrativo punha fim ao diferendo e confirmava a decisão de primeira instância, impedido a câmara de fazer testes aos funcionários municipais.
Rui Rio perdeu a batalha dos testes de alcoolemia, mas venceu em muitas outras frentes, impondo o seu modelo de governação que passou por reduzir o número de chefias intermédias, aumentar a eficácia dos serviços e combater a corrupção. Já num discurso que fez em 2001, na véspera da "revolução dos cravos", o presidente da Câmara do Porto proclamou: “A burocracia reinante não promove o respeito pelos cidadãos e constitui terreno fértil ideal para o florescimento da corrupção. Corrupção que é justamente a forma suprema de sobrepor os interesses particulares ao interesse colectivo, ou seja, boicotar o desenvolvimento”.