Herdeiro saudita disse à Casa Branca que Khashoggi era um “islamita perigoso”
Mohammad bin Salman descreveu o jornalista saudita Jamal Khashoggi como um “islamita perigoso”, num telefonema à Casa Branca. A família e amigos de Khashoggi negam as afirmações.
Mohammad bin Salman, o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, disse à Casa Branca que o jornalista desaparecido a 2 de Outubro, Jamal Khashoggi, era um “islamita perigoso”. Foi num telefonema datado de 9 de Outubro, antes do seu país ter admitido que Khashoggi tinha sido morto.
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Mohammad bin Salman, o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, disse à Casa Branca que o jornalista desaparecido a 2 de Outubro, Jamal Khashoggi, era um “islamita perigoso”. Foi num telefonema datado de 9 de Outubro, antes do seu país ter admitido que Khashoggi tinha sido morto.
O príncipe herdeiro (conhecido no mundo árabe pelas iniciais MBS) informou o cunhado do Presidente Donald Trump, Jared Kushner, e o Conselheiro de Segurança Nacional, John Bolton, de que Khashoggi era membro da Irmandade Muçulmana, – uma organização islâmica radical -, diz o jornal The Washington Post. Na chamada, MBS pediu que a aliança entre a Arábia Saudita e os EUA fosse preservada.
O telefonema foi feito quando a Arábia Saudita ainda insistia que Khashoggi tinha saído do seu consolado em Istambul com vida, uma versão que mudou diversas vezes, até que revelou que o jornalista foi morto.
Esta descrição de Khashoggi enquanto indivíduo “perigoso” entra em conflito com a versão pública do Governo saudita sobre a morte do jornalista, que qualificou de “um erro terrível” e “uma tragédia tremenda”.
“O incidente é muito doloroso para todos os sauditas, e não é justificável”, disse MBS durante um comício, na semana passada.
Uma fonte saudita negou que o telefonema citado pelo Washington Post tivesse sido feito, ainda que tenha admitido que “chamadas de rotina são feitas de vez em quando”.
No mês passado, o embaixador da Arábia Saudita nos EUA, Khalid bin Salman, descreveu o jornalista como um “amigo” que dedicou “grande parte da vida a servir o seu país”, diz o Post.
“Jamal Khashoggi não era membro da Irmandade Muçulmana. Ele próprio negou-o repetidamente nos últimos anos”, disse a família de Khashoggi, em comunicado enviado ao Post. “Não era uma pessoa perigosa de forma alguma. Dizer o contrário seria ridículo.”
No entanto, a família de Khashoggi admitiu que o jornalista concordava com alguns dos ideais da organização islâmica, e vários dos seus amigos dizem que fez parte da mesma, mas que depois parou de ir às reuniões: “Ainda que simpatizasse com alguns objectivos da Irmandade Muçulmana, ele também discordava de muitas das suas posições, especialmente no que dizia respeito à Arábia Saudita.”
Como muitos sauditas na década de 1980, Khashoggi apoiou os jihadistas afegãos contra os soviéticos. Foi então convidado por Osama Bin Laden, o líder da Al-Qaeda, para ir ao Afeganistão, na altura apoiado pelos serviços secretos americanos e pela Arábia Saudita.
“Ele estava [no Afeganistão] primeiramente enquanto jornalista, ainda que simpatizasse com os ideais dos jihadistas afegãos, como muitos dos jornalistas árabes na altura – e muitos jornalistas ocidentais”, disse ao The New York Times um investigador norueguês que entrevistou Khashoggi sobre esta época da sua vida, Thomas Hegghammer.
“Dizer que Jamal era um extremista é mentira”, declarou ao Times um editor indiano que trabalhou com o jornalista, Shahid Raza Burney.
As suas visitas recorrentes ao Afeganistão e a sua proximidade com o chefe dos serviços secretos sauditas, o príncipe Turki al-Faisal, levantaram suspeitas de que Khashoggi se tratasse de um espião do Governo.
Em 2011, perante a morte de Bin Laden, Jamal Khashoggi escreveu no Twitter que “desatou a chorar”: “Desatei a chorar, de coração partido por ti, Abu Abdullah. Eras lindo e corajoso, nesses belos dias no Afeganistão, antes de sucumbires ao ódio.”
Face ao escrutínio internacional pelas suspeitas de que a morte de Khashoggi foi premeditada, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, e o Presidente egípcio Abdel Fatah al-Sissi, também ligaram à Casa Branca para defender Mohammad bin Salman e realçar a sua importância enquanto aliado dos países do Médio Oriente.
Por sua vez, o Presidente norte-americano, Donald Trump, não descartou a possibilidade de envolvimento directo do príncipe herdeiro, depois de, num primeiro momento, ter aceitado as explicações sauditas.
O Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, exigiu mais do que uma vez explicações a Riad, classificando o caso como um “assassínio político”. O conselheiro do Presidente turco, Yasin Aktay, avançou nesta sexta-feira que o jornalista foi “desmembrado e dissolvido em ácido”, diz o jornal Hurriyet.