Quem decide o caso Sócrates é o algoritmo
Carlos Alexandre desacredita-se, dá razão a quem suspeita do seu empenho no caso e, o pior de tudo, desacredita a própria justiça.
O juiz Carlos Alexandre levantou suspeitas numa entrevista à RTP sobre o modo como a fase de instrução do processo Marquês foi entregue ao seu único colega do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC). Aparentemente, Carlos Alexandre suspeita que o algoritmo que determina o sorteio dos processos judiciais foi ou pode ser manipulado (o que vem dar razão à defesa de José Sócrates, que até tentou vigiar o sorteio) e que o seu colega Ivo Rosa poderá ter um entendimento diferente do caso, quiçá mais favorável aos arguidos da Operação Marquês.
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O juiz Carlos Alexandre levantou suspeitas numa entrevista à RTP sobre o modo como a fase de instrução do processo Marquês foi entregue ao seu único colega do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC). Aparentemente, Carlos Alexandre suspeita que o algoritmo que determina o sorteio dos processos judiciais foi ou pode ser manipulado (o que vem dar razão à defesa de José Sócrates, que até tentou vigiar o sorteio) e que o seu colega Ivo Rosa poderá ter um entendimento diferente do caso, quiçá mais favorável aos arguidos da Operação Marquês.
O que Carlos Alexandre quer dizer é que a aplicação da justiça em Portugal pode estar dependente de uma probabilidade. Ironicamente, Carlos Alexandre e José Sócrates têm algo em comum: os dois não confiam no sorteio dos juízes e na imparcialidade de alguns deles. A defesa do ex-primeiro-ministro lançou precisamente as mesmas suspeitas sobre a distribuição que ditou, em Setembro de 2014, que o caso fosse inicialmente entregue a Carlos Alexandre, para não falar das dúvidas sobre o próprio: “Manipulação dos procedimentos de distribuição”; “grave violação das regras legais”; e ausência de garantia de imparcialidade do juiz. Só falta que, à semelhança do que queriam os advogados de Sócrates, o juiz do TCIC se faça acompanhar de um especialista em algoritmos no próximo sorteio.
O Conselho Superior da Magistratura não poderia ter feito algo diferente daquilo que fez: abrir um inquérito na sequência da entrevista, com possíveis repercussões disciplinares. A suspeita lançada sobre a atribuição de processos ou sobre um colega revela tanto inveja ou ciúme como uma vontade de zelo, por alguém que fez os comentários que já fez sobre alguns dos arguidos e que parece evidenciar um interesse que vai para além do dever profissional.
Suspeitar que houve gestão dos processos antes do sorteio do caso da Operação Marquês, de maneira que o mesmo fosse entregue a Ivo Rosa, e que este possa arquivar o caso por outros motivos que não decorram de uma decisão jurídica, é de uma gravidade extrema. A ser verdade, isso seria o descalabro. Carlos Alexandre desacredita-se com estas declarações, dá razão a quem suspeita do seu empenho no caso e, o pior de tudo, desacredita a própria justiça. Como se a justiça dependesse de um algoritmo. De repente, até parece que estamos a falar do sorteio de árbitros para jogos de futebol.