Energia: ilusões e realidade
As energias renováveis não são panaceia milagrosa para todas as necessidades atuais e futuras.
O Prof. Joanaz de Mello (JM) veio defender “mais factos e menos mitos” a respeito da política energética. Disse esperar “que a comissão de inquérito consiga fazer luz sobre alguns negócios escuros no sector energético”. Contudo, salvo melhor opinião, o artigo de JM acarta, ele próprio, obscuridade e distorção ou, pelo menos, erro analítico.
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O Prof. Joanaz de Mello (JM) veio defender “mais factos e menos mitos” a respeito da política energética. Disse esperar “que a comissão de inquérito consiga fazer luz sobre alguns negócios escuros no sector energético”. Contudo, salvo melhor opinião, o artigo de JM acarta, ele próprio, obscuridade e distorção ou, pelo menos, erro analítico.
Quando formula a pergunta “A culpa da electricidade cara é das energias renováveis?”, e, na passada, responde “Não”, não está a ser rigoroso.
Tentando justificar a fatura elétrica suportada pelos portugueses, diz, às tantas, a propósito dos CIEG’s (Custos de Interesse Económico Geral), que “os apoios às energias eólica e solar representam 10% da factura”. Que “é só um bocadinho”, portanto!
Ora, isto é minimizar o real impacte na fatura de eletricidade da subsidiação feita aos investidores/exploradores, em particular na eólica e na solar fotovoltaica. E essa afirmação não adere aos valores registados em documentos oficiais (p.ex. da ERSE).
Na realidade, o atual peso das produções em regime especial (PRE), nas quais as fontes de energia renovável (FER) são preponderantes, traduzem-se em 1270 milhões de euros (ME), ou seja, cerca de 61% dos CIEG! O valor destes custos que incide nas tarifas elétricas é de 84 euros/MWh, do qual 57,9 euros/MWh são devidos às PRE (69%)! E quem paga esta subsidiação que provoca subida das tarifas são, sobretudo, os níveis BTN (Baixa Tensão Normal), ou seja, as famílias.
Esclarecer que, sim, é verdade, não são apenas as FIT – Feed-in-tarifs propiciadas às renováveis que motivam a inflação dos preços e a brutal dívida tarifária (chegou a 5000 ME em 2015). Outras alcavalas, como certos aspetos obscuros relacionados com os CAE/CMEC, têm vindo a onerar os preços da eletricidade.
E quando fala no “alto” índice de cobertura, omite que grande parte da sobrecapacidade instalada é devida à natureza imprevisível/volátil da energia fotovoltaica e eólica, que determina a incontornável necessidade de redundância (também através de hidroelétricas com bombagem e centrais de ciclo combinado a gás natural). Aliás, os investimentos em novas centrais são estimulados e alavancados por um market enablement que serve os interesses de um lobby político-empresarial, só supostamente ao serviço da sustentabilidade e da descarbonização da sociedade e da economia.
Não é crível que as carências e desequilíbrios energéticos se ultrapassem no fundamental através de “prosumers” e “redes inteligentes”. Claro, a inteligência faz sempre falta. Mas não aquela que, “eletrizando” a opinião pública, a confunde!
Quando JM mete no mesmo saco “prospeção de petróleo, programa nacional de barragens, cogeração fóssil, termoelétricas a biomassa” e, ainda, o “baixar artificialmente os preços de energia e infraestruturas”, classificando tudo como coisas más para a eficiência energética, está a confundir a nuvem por Juno.
As energias renováveis não são, per se, culpadas dos nebulosos ou equívocos desvarios de alguns decisores políticos e de correspondentes oportunismos rentistas. Elas têm um significativo potencial comprovado na prática, em alguns casos, desde há muitas décadas. São relevantes desde que bem mescladas com outras fontes num portfólio desenhado com base nos interesses comuns e determinado por planeamento energético desenvolvido no referencial público democrático.
Mas não são panaceia milagrosa para todas as necessidades atuais e futuras de energia final da maioria dos países. Afirmá-lo é mistificação “politicamente correta” veiculada pelo tridente “confusionismo verde” + “ilusionismo pseudocientífico” + ”neoliberalismo rentista”, muito na moda na Europa.
A finalizar, concordar com a necessidade de combater o desperdício e aumentar a eficiência energética. Mas as necessidades reais de aumento das produções e consumos mantêm-se (estamos abaixo das médias europeias). E, sobretudo, não deve pensar-se atingir ganhos de eficiência só através do sinal-preço.
Há que investir na eficiência. Mas quando o que está a dar é construir edifícios habitacionais e diminuir o deficit público, será que se consegue um investimento inteligente?
Em caso de dúvidas ver artigo “Preços e Tarifas da Eletricidade, Elementos acerca da Política Energética”, publicado em março de 2018 na http://www.academia.edu.
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico