Começa hoje uma nova era para a moda nacional
Arranca esta quinta-feira a 51.ª edição da ModaLisboa, seguida na próxima semana pelo Portugal Fashion. O protocolo recentemente assinado pelas duas organizações sinaliza uma nova fase de colaboração no sector da moda.
Decorria o mês de Setembro — que leva os profissionais da indústria da moda de Nova Iorque para Londres, depois para Milão e finalmente Paris —, quando a ModaLisboa e o Portugal Fashion anunciavam, para surpresa de muitos, a assinatura de um protocolo de cooperação, depois de décadas de costas voltadas. Findado o calendário internacional, os olhos viram-se agora para a moda nacional: a ModaLisboa começa esta quinta-feira e prolonga-se até domingo; no fim-de-semana seguinte é a vez do Portugal Fashion, que volta a ocupar a Alfândega do Porto.
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Decorria o mês de Setembro — que leva os profissionais da indústria da moda de Nova Iorque para Londres, depois para Milão e finalmente Paris —, quando a ModaLisboa e o Portugal Fashion anunciavam, para surpresa de muitos, a assinatura de um protocolo de cooperação, depois de décadas de costas voltadas. Findado o calendário internacional, os olhos viram-se agora para a moda nacional: a ModaLisboa começa esta quinta-feira e prolonga-se até domingo; no fim-de-semana seguinte é a vez do Portugal Fashion, que volta a ocupar a Alfândega do Porto.
Nesta primeira edição pós-protocolo saltam à vista algumas mudanças: o Portugal Fashion deixou de apresentar desfiles em Lisboa — como começou a fazer em 2012 —; alguns criadores da ModaLisboa foram integrados nas acções internacionais do Portugal Fashion, bem como na Brand Up; e a criadora Alexandra Moura, que há alguns anos optou por só apresentar o seu trabalho no Portugal Fashion volta a integrar o calendário da ModaLisboa.
“O protocolo começa por resolver um conflito inexplicável, de muitos anos”, explica Eduarda Abbondanza, presidente da ModaLisboa. “Para começar a colaborar é preciso ter confiança uns nos outros. O que fizemos foi verificar se essa confiança era possível. E foi possível”, acrescenta.
O documento acordado entre as duas organizações é menos um conjunto de medidas fixas e mais uma porta aberta para a criação de uma estratégia para a moda nacional. Ou seja, é um ponto de partida: “Temos muito trabalho pela frente”, garante Abbondanza. Até porque quando foi assinado, avizinhavam-se os dois certames. Nos próximos meses haverá mais tempo para as duas partes se sentarem à mesa.
Adelino Costa Matos, que assumiu a presidência da Associação Nacional de Jovens Empresários (ANJE) há cerca de ano e meio, explica que a “vontade de olhar para um bem comum” motivou a aproximação. “Desde que entrámos [na direcção], achámos que faria sentido existir esta aproximação, mais numa óptica de unificação da moda nacional”, garante.
O objectivo agora é que uma estratégia nacional substitua a divisão quase Norte/Sul que tem predominado até agora. A presidente da ModaLisboa lembra que Portugal tem um conhecimento acumulado no que toca a “arts and crafts”, que “outros países mais desenvolvidos, mais industrializados já não têm”. É importante, por isso, unir esforços, "não só na moda, mas em todos os sectores".
Não está nos planos das duas organizações fundirem-se num único evento. “Temos é de nos especializar no know-how de cada uma”, defende Abbondanza. Ora, se a ModaLisboa — cuja organização é na sua maioria constituída por designers — sempre se focou na criação de marca (inclusive na própria identidade da ModaLisboa) e no aspecto de moda e na formação de novos talentos, o Portugal Fashion nasceu ligado à indústria têxtil do Norte e inserido numa associação de empreendedorismo.
Adelino de Costa Matos acredita que “com naturalidade vão sobressair as qualidades de cada um”. “É aí que vamos trabalhar”, comenta. “Sem pensar no nosso próprio umbigo”, acrescenta.
O acordo aborda directamente a questão da canibalização de recursos que se verificava. Veja-se, por exemplo, o número de criadores que começaram na ModaLisboa e transitaram para o Portugal Fashion, onde tinham a possibilidade de expor no estrangeiro, graças ao acesso a fundos comunitários. Costa Matos afirma que o investimento no estrangeiro vai passar a ser feito “de uma forma transversal”. Por outras palavras, “se acharmos que para ir a um determinado local é um estilista da ModaLisboa que faz mais sentido, é o da ModaLisboa que irá”. O objectivo é claro: “Não existir qualquer tipo de concorrência entre as entidades, entre estilistas e entre marcas.”
Há anos que a organização da ModaLisboa — que não tem acesso aos mesmos recursos por ter sede em Lisboa e é financiada com apoios da autarquia e de patrocinadores — se queixa das disparidades. Sendo que nos últimos meses conseguiu de certa forma dar a volta à questão, organizando por exemplo um showcase em Paris, sob a alçada da ModaPortugal, uma parceria com organizações como o CENIT, ANIVEC/APIV, APICCAPS e AORP.
“Tem de se definir quais são as regras da internacionalização”, defende Eduarda Abbondanza. “Para já, tem de ser mais claro e público para toda a área dos criadores quem vai desenvolver as suas marcas internacionalmente. Isto tem de corresponder a um plano estratégico de cada uma das marcas. E tem de corresponder também a um plano de crescimento.”
Um sinal para a moda nacional
A não descurar, está ainda o valor simbólico do protocolo e a mensagem que transmite para todos os que trabalham à volta destas duas organizações. Essa mensagem, resume Abbondanza, é: “Vamos lá trabalhar em rede.” No caso, "o que fizemos foi tentar encontrar um léxico comum”, comenta.
Até porque se olharmos para um dos principais casos de sucesso na área da moda nacional — a da indústria do calçado — vemos como o trabalho em rede e a união foi um elemento chave. Coincidência ou não, a Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e seus Sucedâneos (APICCAPS), caminha há anos de mão dada tanto com o Portugal Fashion como com a ModaLisboa.
O presidente da ANJE espera também que a cooperação entre a ModaLisboa e o Portugal Fashion possa servir de exemplo — “para que outras entidades possam sentir o mesmo desejo para contribuir para a moda nacional”. “Não é unicamente por assinarmos um acordo de intenções que depois se traduz na prática em colaborações. Tem de existir uma vontade e a capacidade de colocar na prática essa vontade”, reforça.