Tribunal de Contas Europeu alerta para execução lenta dos fundos europeus
Auditoria ao orçamento de 2017 mostra que o montante de despesas autorizadas que estão por liquidar atingiu valor recorde de 267,3 mil milhões de euros. Em Portugal, estão por aplicar 8817 milhões de euros de fundos estruturais e de investimento.
Em 2017, o montante de despesas autorizadas pela União Europeia mas não executadas pelos Estados membros ascendeu para um valor recorde de 267,3 mil milhões de euros, mostra a auditoria anual realizada pelo Tribunal de Contas Europeu ao orçamento comunitário, divulgada esta quinta-feira. No caso de Portugal, ficaram por aplicar 8817 milhões de euros inscritos nos programas operacionais dos fundos estruturais e de investimento do quadro financeiro plurianual 2014-2020, correspondentes a cerca de 10% da despesa anual da administração pública.
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Em 2017, o montante de despesas autorizadas pela União Europeia mas não executadas pelos Estados membros ascendeu para um valor recorde de 267,3 mil milhões de euros, mostra a auditoria anual realizada pelo Tribunal de Contas Europeu ao orçamento comunitário, divulgada esta quinta-feira. No caso de Portugal, ficaram por aplicar 8817 milhões de euros inscritos nos programas operacionais dos fundos estruturais e de investimento do quadro financeiro plurianual 2014-2020, correspondentes a cerca de 10% da despesa anual da administração pública.
Como se lê no relatório referente ao exercício do ano passado, a despesa da União Europeia totalizou 137,4 mil milhões de euros, um montante que corresponde a 0,9% do Rendimento Nacional Bruto dos 28 Estados membros e representa aproximadamente 2% da despesa pública dos países da união. Os pagamentos efectuados incluíram 29,7 mil milhões de euros de pré-financiamento e 107,7 mil milhões de euros de pagamentos únicos, intermédios ou finais.
Mais de metade da despesa foi distribuída em pagamentos directos, que incluem as ajudas aos produtores no âmbito da Política Agrícola Comum, o pagamento de bolsas de estudo e investigação, e ainda os custos de administração (remunerações e pensões dos funcionários). A restante despesa tem a ver com pagamentos baseados em reembolsos. Foi precisamente nessas rubricas que os auditores do TCE se confrontaram com mais problemas na distribuição do dinheiro — embora, como se lê no relatório, a taxa de erro na execução da despesa tenha caído, em 2017, para os 2,4%, o valor mais baixo desde o arranque do actual quadro financeiro plurianual, em 2014.
A maioria dos fundos da UE baseados em reembolsos, ou seja, pagamentos feitos contra a apresentação de custos pelos beneficiários, é despendida com programas de desenvolvimento rural e regional (coesão), projectos de investigação ou formação profissional e apoio ao desenvolvimento. Além de erros materiais, foram também encontrados erros de elegibilidade, quer dos candidatos quer das despesas a suportar pelas verbas da UE.
Isso não quer dizer que existam problemas graves com o orçamento: tanto as receitas como os pagamentos efectuados em 2017 foram “legais e regulares”, frisa o TCE. “Na opinião do Tribunal, as contas consolidadas da UE relativas ao exercício encerrado em 31 de Dezembro de 2017 reflectem fielmente, em todos os aspectos materialmente relevantes, a sua situação financeira, os resultados das suas operações, os fluxos de caixa, bem como a variação da situação líquida do exercício então encerrado”, diz o relatório.
As contas publicadas pela Comissão colocam o resultado económico de 2017 nos 8,1 mil milhões de euros: a 31 de Dezembro, o passivo total representava 236,5 mil milhões de euros, comparados com os 166,2 mil milhões de euros do activo total.
Mas ainda que o orçamento espelhe de forma “verdadeira e transparente” a posição financeira da UE, o presidente do TCE, Klaus-Heiner Lehne, considera que os números escondem um desajustamento entre as expectativas das instituições europeias e dos Estados membros e a realidade. “Recomendaria, por isso, maior prudência na elaboração dos orçamentos, para que não se façam promessas e criem expectativas que depois não são concretizadas ou não produzem os resultados esperados”, disse aos jornalistas.
“O quadro financeiro plurianual tem de ser realista, e o discurso também: a UE não deve prometer mais o que pode cumprir, porque isso reduz a sua credibilidade e a confiança dos cidadãos. Quando há largas quantidades por liquidar, é porque há alguma coisa errada no sistema. É preciso corrigir essa situação”, apelou Lehne, que pensa que a UE deve fazer uma reflexão profunda e rever os processos que levam à elaboração dos quadros plurianuais. “São exercícios baseados em projecções quase sempre ultrapassadas pela realidade”, notou.
Em relação ao actual quadro financeiro plurianual, a principal preocupação do presidente do TCE tem a ver com o facto de, no quarto ano de vigência do orçamento, as autorizações de despesa permanecerem elevadas e os pagamentos seguirem reduzidos. Os auditores identificam várias razões para esta baixa taxa de execução: uma diminuição do número de pedidos submetidos pelos Estados membros, atrasos no desenvolvimento dos projectos, problemas no planeamento das acções ou dificuldades administrativas.
Para o TCE, um desafio particular continua a ser o da utilização plena dos recursos financeiros dedicados às reformas estruturais e ao investimento, que representam uma percentagem importante das despesas das administrações públicas. Segundo o relatório, “a Comissão constatou que os atrasos se deviam sobretudo ao encerramento do anterior QFP após a data prevista, à adopção tardia dos actos jurídicos e a dificuldades de adaptação às alterações substanciais introduzidas no actual QFP e respectiva execução”.
A lenta execução dos programas, nota o TCE, pode originar pressões sobre os limites máximos das dotações de pagamento, à medida que as necessidades de financiamento forem aumentando com a conclusão do prazo do quadro financeiro O risco, lê-se no relatório, é que em 2020 se verifique uma “acumulação anormal” de pagamentos em atraso e que as dotações sejam insuficientes para liquidar todos os pedidos. Porém, como lembrou Klaus-Heiner Lehne, existe uma janela de três anos para a utilização das verbas antes destas serem definitivamente dadas como perdidas. “O dinheiro não se vai perder, vai ser usado. Mas vai ser usado demasiado tarde”, lamentou.