Donald Trump, um império assente na fortuna do pai e em suspeitas de fraude fiscal

Após uma investigação de meses, o jornal New York Times rebate a versão de Trump sobre o seu sucesso: "Recebeu pelo menos 413 milhões de dólares do império do imobiliário do pai, grande parte através de desvios fiscais na década de 1990."

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O jornal diz que Donald Trump nunca deixou de receber dinheiro do pai Reuters/JOSHUA ROBERTS

A ideia de que Donald Trump passou de rico a multimilionário graças apenas ao seu esforço e engenho tem sido contestada por vários biógrafos não oficiais, e até o próprio Presidente dos Estados Unidos já admitiu que tem tendência para o exagero: em 1987, no livro A Arte do Negócio, já defendia que “uma pequena hipérbole nunca fez mal a ninguém”.

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A ideia de que Donald Trump passou de rico a multimilionário graças apenas ao seu esforço e engenho tem sido contestada por vários biógrafos não oficiais, e até o próprio Presidente dos Estados Unidos já admitiu que tem tendência para o exagero: em 1987, no livro A Arte do Negócio, já defendia que “uma pequena hipérbole nunca fez mal a ninguém”.

Mas o que o New York Times publicou na noite de terça-feira, ao fim de vários meses de investigação, é mais do que uma hipérbole, pequena ou grande.

Com base em mais de 100 mil páginas de declarações bancárias, auditorias fiscais e declarações de impostos, e entrevistas a antigos funcionários e conselheiros, o jornal de Nova Iorque pinta um quadro da família Trump em que pai e filho, Fred e Donald, surgem como dois empresários focados em contornar, iludir e mesmo defraudar o país em centenas de milhões de dólares em impostos ao longo de décadas.

Foi assim, diz o jornal, que Donald Trump recebeu pelo menos 413 milhões de dólares (360 milhões de euros) do seu pai desde os três anos de idade, a fundo perdido, e não apenas um milhão de dólares (865 mil euros) com a obrigação de os devolver com juros, como insiste em dizer desde os tempos em que começou a construir edifícios em Manhattan, em finais da década de 1970.

“O dinheiro está no centro da marca que o sr. Trump tem vendido ao mundo. Mas a actividade de manter escondida a verdade sobre esse dinheiro é essencial à construção desse mito”, diz o jornal norte-americano. Admitiu que também contribuiu para isso, começando com um perfil elogioso publicado em 1976: “Ao longo de décadas, ajudado e estimulado por um jornalismo menos do que agressivo, o sr. Trump garantiu que a sua história financeira fosse muito mais sensacional do que real.”

Na prática, o artigo do New York Times conta duas histórias de vida de fuga aos impostos. A de Fred Trump, um homem que fez fortuna no ramo do imobiliário com a ajuda de gigantescos subsídios do Estado à construção, nas décadas de 1930 e 1940 – primeiro com o New Deal do presidente Franklin Roosevelt e depois com a construção de instalações militares e casas para os veteranos que regressaram da II Guerra Mundial –, e a de Donald Trump, retratado como instigador e cérebro da operação que levou à transferência da fortuna dos pais para ele e para os irmãos contra o pagamento de uma quantia irrisória em impostos.

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O pai, Fred Trump, fez fortuna com projectos de habitação subsidiados pelo Estado

Segundo o jornal, Fred Trump fez tudo – dentro, fora e à volta da lei – para entregar, em vida, fortunas a cada um dos seus cinco filhos escapando às elevadas taxas de impostos obrigatórias nestes casos de doação em vida. E foi sobre esse dinheiro, que nunca parou de cair nas contas de Donald Trump até hoje, que o actual Presidente norte-americano assentou a ideia de que é um empresário genial, capaz de se erguer sem grandes ajudas do pai e de se reerguer perante as adversidades armado apenas com o seu olho para o negócio.

Feitas as contas, os pais de Donald Trump terão deixado um conjunto de propriedades avaliado em 900 milhões de dólares (780 milhões de euros) em 2004, quando Donald Trump e os irmãos decidiram vender esse património. Uma década antes, numa declaração de impostos, Fred Trump declarara que as mesmas propriedades valiam apenas 41,4 milhões de dólares (35 milhões de euros).

Após a publicação do artigo do New York Times, o presidente da câmara da cidade, Bill de Blasio, deu instruções ao seu Departamento Financeiro para “investigar imediatamente violações do pagamento de impostos e construção de imobiliário” e para “trabalhar em conjunto com o estado de Nova Iorque para descobrir se foram pagos os impostos devidos”. Apesar de já não ser possível levar as suspeitas a tribunal, ainda é possível que Donald Trump e os seus irmãos tenham de pagar multas.

Numa resposta no Twitter, o Presidente dos EUA descreveu a investigação do New York Times como “um artigo de ataque antigo, aborrecido e escrito várias vezes”, e acusou o jornal de nunca ter recuperado do resultado eleitoral de 2016.