May dançou, atacou Corbyn e sobreviveu ao congresso tory sem mudar rumo do seu “Brexit”
Primeira-ministra encerrou a reunião do partido com o seu melhor discurso e anunciou “o fim da austeridade”. Mas não se moveu um centímetro na posição sobre as negociações com Bruxelas e as dúvidas sobre “Chequers” mantêm-se.
Para quem chegava à edição deste ano do congresso do Partido Conservador obrigada a enfrentar diferentes frentes activas de oposição e mais fragilizada do que nunca, Theresa May tem razões para se sentir satisfeita no seu encerramento, esta quarta-feira. Protagonista daquele que foi considerado, de forma praticamente unânime pela comunicação social e analistas britânicos, como o melhor discurso do seu mandato, a primeira-ministra conseguiu ganhar pontos junto dos militantes e, mais do que isso, ganhar tempo para as batalhas que se avizinham.
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Para quem chegava à edição deste ano do congresso do Partido Conservador obrigada a enfrentar diferentes frentes activas de oposição e mais fragilizada do que nunca, Theresa May tem razões para se sentir satisfeita no seu encerramento, esta quarta-feira. Protagonista daquele que foi considerado, de forma praticamente unânime pela comunicação social e analistas britânicos, como o melhor discurso do seu mandato, a primeira-ministra conseguiu ganhar pontos junto dos militantes e, mais do que isso, ganhar tempo para as batalhas que se avizinham.
A sua estratégia para as negociações com Bruxelas com vista ao “Brexit”, porém, não se moveu um centímetro. O que, na prática, não reduz em nada a montanha de obstáculos que terá de enfrentar nas próximas semanas, dentro e fora da esfera tory.
Acossada internamente, censurada pela oposição e humilhada por Bruxelas, fruto da irredutibilidade com que defendeu em Salzburgo, perante os líderes europeus, a sua proposta para a relação entre o Reino Unido e a União Europeia após consumado o divórcio, May subiu ao palco do Symphony Hall de Birmingham dançando ao ritmo da canção Dancing Queen, dos ABBA, numa clara tentativa de desanuviar a tensão que se abateu nos últimos quatro dias sobre aquela cidade inglesa.
A dança inesperada e duas ou três piadas sobre o discurso desastroso que deu no ano passado deram confiança à primeira-ministra, que se lançou com firmeza contra os três grandes opositores do seu “plano Chequers” – a ala eurocéptica conservadora, o trabalhista Jeremy Corbyn e Bruxelas – e oferecer à plateia a sua melhor versão. Ou aquela que nunca se tinha visto.
Tal como na entrevista que deu à BBC no arranque dos trabalhos no domingo, a líder do executivo voltou a pedir o apoio do partido à sua proposta para o “Brexit”, numa altura em que o país enfrenta a “fase mais difícil das negociações”. Assegurando que “não há ninguém mais interessado” do que ela em conseguir “o melhor acordo possível” para o Reino Unido, May alertou para os riscos que a desunião tory trazem para o próprio desfecho da novela “Brexit”.
“Se continuarmos a insistir em caminhos diferentes na persecução das nossas próprias visões sobre o que seria um ‘Brexit’ perfeito, arriscamo-nos a seriamente ficar sem ‘Brexit’”, afirmou a primeira-ministra, numa clara alfinetada a Boris Johnson, o principal rosto da facção conservadora que se opõe a May e que na véspera fora protagonista de novo e redobrado ataque ao “plano Chequers” sobre a relação do Reino Unido com a UE depois do divórcio.
Assumindo, uma vez mais, que “não tem medo se as negociações terminarem sem acordo”, May voltou a pedir “respeito” à UE e a rejeitar liminarmente o que entende serem as únicas duas soluções apresentadas pelos 27: a manutenção do Reino Unido, no seu todo, na união aduaneira, agarrado às regras europeias e sem competência para decidir sobre a liberdade de movimento de pessoas; ou a manutenção da Irlanda do Norte na referida estrutura, separada do resto do país.
Já a proposta do Governo britânico assenta na criação de uma zona de comércio livre com a UE, mas apenas para a transacção de bens industriais e produtos agrícolas. Os líderes europeus argumentam que é impraticável e que põe em risco o mercado único. E esta quarta-feira deram a Londres nova data e local para a continuação do braço-de-ferro: 17 de Outubro, em Bruxelas.
Corbyn na mira
Tendo em conta o reduzido ponto de partida e as expectativas mais catastróficas apontadas pela imprensa britânica antes do congresso, não estranha que May tenha saído de Birmingham com a sensação de dever cumprido. Mesmo não tendo afastado totalmente os fantasmas sobre a sua liderança ou a estratégia do Governo para o “Brexit” – longe disso – a primeira-ministra foi capaz de defender as suas ideias e de convencer ministros e apoiantes a sair em sua defesa. Dois factores que a ajudaram a abafar o ruído externo criado pelos “hard-brexiteers” Johnson, David Davis ou Jacob Rees-Mogg.
Parte do sucesso desta estratégia, junto dos militantes e delegados, foi a atenção dedicada pela líder do Governo, no seu discurso, a Corbyn. Num dos ataques mais duros por si protagonizados contra o líder do Partido Trabalhista, May apresentou-o como a principal ameaça a Downing Street, ao Partido Conservador e ao próprio Labour, pela sua natureza anti-UE, anti-NATO, pró-Rússia e anti-semita.
“O que se abateu sobre o Labour é uma tragédia nacional. O ‘Partido de Jeremy Corbyn’ rejeita hoje os valores comuns que sempre balizaram as nossas divergências políticas. É nosso dever garantir que ele [Corbyn] nunca poderá fazer o mesmo com o país”, afirmou May.
Para além das críticas ao líder do Labour, a primeira-ministra apostou ainda em temas habitualmente queridos para o eleitorado trabalhista. Proclamou com pompa e circunstância o “fim da austeridade”, prometeu investimentos na saúde e nos serviços sociais, anunciou o congelamento do imposto sobre os combustíveis e declarou o fim do tecto orçamental das autoridades municipais para a construção de novas casas.
No final do discurso a audiência gostou do que ouviu e aplaudiu a líder, oferecendo-lhe de bandeja (mais) um balão de oxigénio para enfrentar as próximas semanas. Theresa May sobreviveu ao congresso do Partido Conservador, mesmo sem convencer totalmente críticos ou aliados sobre a exequibilidade da sua estratégia para o “Brexit”. No fundo, sem dissipar as dúvidas sobre o que originou a desconfiança generalizada à sua liderança. Depois de Salzburgo e Birmingham, Bruxelas é o próximo teste à sua resistência.