Sobre a origem das proteínas através da selecção laboratorial
O Nobel que foi agora dado à evolução dirigida e à montagem de proteínas na superfície de fagos é uma celebração da interacção entre o conhecimento fundamental e o desenvolvimento de ferramentas tecnológicas para a ciência, alargando as fronteiras ao conhecimento e pondo os limites apenas na nossa criatividade científica. As técnicas agora premiadas puseram a biologia ao serviço da química, permitindo chegar a processos inovadores com um impacto que pode chegar a áreas médicas, ambientais e industriais.
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O Nobel que foi agora dado à evolução dirigida e à montagem de proteínas na superfície de fagos é uma celebração da interacção entre o conhecimento fundamental e o desenvolvimento de ferramentas tecnológicas para a ciência, alargando as fronteiras ao conhecimento e pondo os limites apenas na nossa criatividade científica. As técnicas agora premiadas puseram a biologia ao serviço da química, permitindo chegar a processos inovadores com um impacto que pode chegar a áreas médicas, ambientais e industriais.
O método de evolução dirigida é um exemplo de engenharia de proteínas concebida e desenvolvida por Frances Arnold no final dos anos 80, e que leva os princípios da evolução tal como foram descritos por Darwin (autor da obra-prima Sobre a Origem das Espécies por Meio da Selecção Natural) para dentro de um tubo de ensaio. A evolução de novas proteínas utilizando esta técnica assenta em dois princípios básicos: a construção de diversidade, gerando muitas variantes da mesma enzima, e a selecção para o mais adequado. A selecção é feita segundo aquilo que procuramos, seja maior eficiência para degradar um substrato, gerar um produto ou promover estabilidade à presença de inibidores. No fundo, procuramos a enzima melhor adaptada a uma reacção desejada. Uma frase que usamos é “you get what you screen for”, ou seja, seleccionamos a enzima com a característica mais adequada para o que queremos em cada momento, de acordo com o método de rastreio que implementamos.
Em vez de estarmos a desenhar ou a conceber racionalmente uma enzima que achamos que seria perfeita, correndo o grande risco de não o ser, com a evolução dirigida promovemos a produção de milhares de variantes de enzimas, por exemplo através de mutações aleatórias dos seus genes. Vamos depois seleccionar aquelas que tenham as características que interessam e repetimos o processo as vezes necessárias até optimizarmos a enzima nas propriedades que precisamos. Os resultados têm sido entusiasmantes e com aplicações desde novas terapias para cancro até ao combate às alterações climáticas.
No meu laboratório usamos a evolução dirigida para optimizar enzimas que viabilizem economicamente o aproveitamento de biomassa vegetal, restos de plantas ou árvores, que de outra forma seriam tratados como resíduos desperdiçados e transformamo-los em biocombustíveis, bioenergia, materiais, bioplásticos, resinas ou outros polímeros. Conseguimos há pouco tempo seleccionar uma enzima que é 100 vezes mais eficiente do que qualquer outro método químico ou biológico conhecido na desconstrução da molécula grande de lenhina nos seus componentes básicos e na sua valorização, ou seja, na produção de outras moléculas com interesse comercial.
Para além disso, temos neste momento três outras enzimas em processos de evolução dirigida e estamos muito entusiasmados com os resultados preliminares. O desenvolvimento destas ferramentas biotecnológicas é essencial para a implementação de processos ambientalmente sustentados, substituição de matérias-primas fósseis por renováveis, redução da quantidade de resíduos descartáveis e assim estabelecer uma sociedade baseada em conhecimento, sustentável, suportando uma economia circular necessária com urgência para o século XXI.