APAV defende criação de “crime de ódio” na lei portuguesa

Associação Portuguesa de Apoio à Vítima diz que é preciso combater o discurso de ódio.

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As queixas por discriminação à Comissão para a Igualdade e Discriminação Racial deverão superar as 300 este ano Miguel Manso

A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) defende que o “crime de ódio” passe a estar na lei portuguesa, afirmando que é uma realidade que precisa de ficar “a descoberto” porque acontece e as vítimas nem têm noção.

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A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) defende que o “crime de ódio” passe a estar na lei portuguesa, afirmando que é uma realidade que precisa de ficar “a descoberto” porque acontece e as vítimas nem têm noção.

“É altura de melhorar o quadro legislativo e passar uma mensagem muito clara de não permissão e combate. Para isso deve haver um crime que se chame 'crime de ódio', um crime novo”, disse o presidente da APAV, João Lázaro, em declarações à Lusa à margem de uma conferência sobre o tema.

Da ocorrência de crimes de ódio, em que o agressor é motivado pela etnia, nacionalidade, orientação sexual ou religião do ofendido, “muito pouco se conhece”. “Está pouco a descoberto e é muito silenciado”, afirmou, considerando que actualmente muitas pessoas alvo de violência ou ofensas discriminatórias “não se consideram vítimas nem disso têm noção”.

Embora os números das queixas por discriminação cresçam anualmente em Portugal, João Lázaro considera que não é preocupante e alerta que a tendência “do mundo em que vivemos é o crescimento do crime de ódio e do discurso de ódio”, especialmente quando tem na Internet um terreno em que é difícil perceber que leis são quebradas e controlar a propagação desse tipo de mensagens sem violar liberdades fundamentais de acesso ao online.

Sendo um crime específico, dar-se-ia um sinal de que “a comunidade em que se inserem tem preocupações em relação à violência discriminatória” e poderia levar potenciais vítimas a sentir que “podem chegar-se à frente, denunciar e participar às autoridades”.

Manuela Costa, da unidade de contraterrorismo da Polícia Judiciária, indicou que, entre as razões para não haver denúncias, “as vítimas não se querem sujeitar a um processo que é invasivo”, percebem que há “falta de acção de justiça” e receiam represálias dos agressores. “O sistema tem que ser eficaz e incentivar a vontade de denunciar”, defendeu.

No sistema judiciário, apontou, há casos em que "a magistratura tem que aderir" e não ver as coisas a preto e branco, reconhecendo quando há motivações de ódio por trás dos crimes, que podem ser de vários tipos.

Mais de 300 queixas por discriminação

O alto comissário para as Migrações, Pedro Calado, afirmou que, este ano, as queixas por discriminação à Comissão para a Igualdade e Discriminação Racial deverão superar as 300, o que será de longe “um máximo histórico”.

Contudo, não associa este aumento a um aumento de ofensas, salientando que as denúncias crescem em sintonia com a consciência do problema. Para isso, afirmou, contribuíram também casos que foram divulgados através de redes sociais e a que foi dado eco na comunicação social.

No entanto, só em metade dos casos são as vítimas a denunciar os casos, afirmou, reconhecendo que a falta de consciência de ter sido vítima é um dos factores.

Condenações registadas, só duas, afirmou Pedro Calado: uma num caso ligado ao mundo do futebol e outra por uma recusa de arrendamento de habitação por causa da etnia do potencial inquilino.